JUDICIALIZAÇÃO DA SAÚDE »
Remédios por força da lei
Gastos com a compra de medicamentos determinados pela Justiça chegaram a R$ 355 milhões
no ano passado. Mais de 70% desse valor se refere à aquisição de 10 drogas para doenças raras
Julia Chaib
Estado de Minas: 17/06/2013
Brasília
– Presidente de uma associação que reúne portadores de uma doença rara
chamada mucopolissacaridose, Regina Próspero ajuda os pacientes a
garantir acesso ao tratamento, baseado em remédios de alto custo que não
estão incluídos na lista do Sistema Único de Saúde (SUS). A solução,
nesses casos, é a Justiça. “Temos aproximadamente 400 processos em
curso”, informa Regina. As ações judiciais são movidas contra
municípios, estados e a União. Contra esta última, representada pelo
Ministério da Saúde, os gastos determinados judicialmente para
fornecimento de medicamentos, equipamentos e insumos – além de depósitos
judiciais e repasses a estados e municípios – atingiram recorde no ano
passado: R$ 355 milhões. Segundo a pasta, 71% desse total, equivalentes a
R$ 255 milhões, foi destinado à aquisição de 10 drogas usadas no
tratamento de doenças raras, que atingem, no máximo, uma pessoa em cada
grupo de 2 mil habitantes. Foram beneficiadas 661 pessoas, entre elas os
doentes com mucopolissacaridose.
O diretor jurídico do Instituto
Oncoguia, Tiago Farina Matos, associa a crescente judicialização da
saúde ao acesso mais amplo da população à Justiça. “Temos a defensoria
pública criada e estruturada em quase todos os estados. Aliado a isso,
as pessoas estão mais conscientes de seus direitos. Quando não podem
arcar com o custo de um advogado, vão à defensoria ou recorrem a
associações, por exemplo.”
Entretanto, o presidente da Associação
Nacional de Defensores Públicos Federais (Anadef), Gabriel Faria,
explica que a vitória de pacientes em causas relacionadas à saúde está
caindo, principalmente quando envolvem produtos e serviços que já estão
incluídos no SUS. O Ministério da Saúde criou uma plataforma no site da
pasta que disponibiliza diversas informações sobre remédios e
equipamentos aos juízes. A intenção é dar o máximo de informações
possível para que o julgamento da causa seja consciente. Muitas das
ações derrotadas na Justiça se referem a medicamentos com similares
disponíveis no SUS. “A questão é que o sistema de saúde tem obrigação
legal de dar cobertura a toda a população, só que, nesse ponto, deve-se
trabalhar para evitar a judicialização”, diz.
De acordo com
Farina, a maioria das ações judiciais não diz respeito a drogas
caríssimas. “90% são remédios pequenos.” Segundo ele, uma forma de
evitar a judicialização é com acordos extrajudiciais. “Quando compra sob
ordem de um juiz, (o gestor público) tem de adquirir o produto sem
licitação, com um custo alto. Mas o ministério não faz conciliação
judicial nem extrajudicial em saúde”, critica. Uma das possibilidades
seria a pasta montar comitês estaduais, com equipes técnicas para
subsidiar tais acordos.
Inclusão Mesmo com o aumento da
quantidade de medicamentos incluídos na lista do SUS – de 550 itens em
2010 para 810 em 2012 –, muitos remédios esbarram nos critérios da pasta
para oferecê-los gratuitamente. Para entrar na relação do SUS, os
produtos passam por uma avaliação da Comissão Nacional de Incorporação
de Tecnologias (Conitec), instituída em 2011, que analisa pontos como
segurança para o paciente, entre outros. “O caso de certas doenças,
principalmente as raras, cujo número de portadores é pequeno, incorre na
não demonstração de custo-efetividade, o que faz com que esses
tratamentos fiquem barrados na burocracia do sistema”, conta Regina
Próspero. A melhor solução passa a ser, então, o recurso ao sistema
judicial.
O consultor jurídico do Ministério da Saúde Jean Keiji
Uema reconhece que os custos com essa conta são altos, mas diz que, se
comparados ao valor gasto para incluir remédios na lista do SUS – que
foi de R$ 9,3 bilhões em 2012 –, são bem menores. “Há muitos
medicamentos que não têm nem pedido de inclusão no SUS e há alguns que,
se analisados, não devem ser incorporados. O importante é garantirmos o
acesso à saúde. Por isso, muitas ações judiciais são inevitáveis”,
admite.
Nenhum comentário:
Postar um comentário