quinta-feira, 13 de junho de 2013

Mama África - Carolina Braga

Mostra Internacional Imagem dos Povos, que começa sábado em BH, tem programação dedicada ao cinema contemporâneo do continente e sua influência ao redor do mundo 


Carolina Braga

Estado de Minas: 13/06/2013 



Quando falamos em cinema americano, inglês, francês ou até mesmo no brasileiro, dá para imaginar o que pode aparecer na telona. Além de ser o que mais conhecemos, há um padrão de narrativa. Agora, o que esperar sobre um filme realizado nas Ilhas Maurício ou em Madagascar, Camarões, Moçambique, Congo, Burkina Faso? Faltam referências e sobra folclore. Pois abandone a ideia da África primitiva e se abra para o cinema do continente.

É esse o convite da Mostra Internacional Imagem dos Povos, que será realizada em Belo Horizonte de15 a 30 deste mês, no Cine Humberto Mauro do Palácio das Artes, e entre 25 e 27 no Memorial Minas Gerais, na Praça da Liberdade. Em sua oitava edição, o evento chama a atenção para a variedade de temas e linguagens que a produção contemporânea audiovisual africana tem alcançado, seja no continente ou nas diásporas ao redor do globo. “É uma viagem que a gente pode fazer na diversidade humana”, comenta o bailarino e coreógrafo Rui Moreira, personagem do documentário Fan do Brasil, uma das atrações da mostra.

De acordo com o cineasta e pesquisador Joel Zito Araújo, a África tem números surpreendentes que são desconhecidos do público brasileiro. “É o continente que mais cresce e o cinema acompanha esse ritmo. Existem ações efetivas de vários governos para que seja elemento de reforço das identidades nacionais e históricas”, explica. Joel Zito, que participará do Imagem dos Povos com o documentário Raça, defende a ideia de que ainda temos uma visão muito colonizada e desatualizada sobre a África hoje e, por consequência, sabemos muito pouco do cinema africano.

A programação foi desenhada para borrar – nem que seja um pouco – essa imagem predefinida. Segundo o cineasta, o primeiro passo para isso é a compreensão da diversidade. “É pensar que a África não é somente negra”, ressalta. Assim, ele lembra que o continente tem boa parcela árabe e islâmica. Dele fazem parte tanto os dramas e comédias do cinema egípcio e da região do Magreb, assim como as criações marroquinas e até mesmo a “hollywoodiana” produção da África do Sul.

“Gosto de destacar um aspecto que está presente em boa parte dos filmes: é uma África também com conflitos urbanos, plugada no século 21”, comenta Adyr Assumpção, idealizador e curador do festival. Diferentemente dos últimos anos, quando a escolha da programação era compartilhada, neste ano, o próprio Adyr percorreu mostras audiovisuais fora e dentro do Brasil. Uma delas foi o Festival Pan-africano de Cinema e Televisão de Uagadugu, em Burkina Faso, o mais antigo e considerado um dos mais importantes da região. Foi onde garimpou trabalhos, no mínimo, curiosos.

Novos horizontes Criado em 2004, inicialmente em Ouro Preto, o Imagem dos Povos sempre procurou destacar a produção cinematográfica distante e ainda desconhecida no Brasil. Depois de abordar obras da Nova Zelândia, Índia, China e Japão, Adyr conta que, desde 2009, a aproximação com a África se acentuou. Isso, segundo ele, se deve também ao momento particular do audiovisual africano.

 É que muitos profissionais que deixaram seus países para ampliar a formação na Europa não só voltaram a produzir na terra natal como também ampliaram as coproduções. Esse movimento contribuiu com o desenvolvimento do chamado cinema da diáspora, ou seja, dos criadores com raízes africanas espalhados pelo mundo. É aí que entram outras safras mundiais e o maior interesse do Imagem dos Povos.

“O cinema africano não está preocupado em fazer filmes sobre o negro ou o branco. Não tem problema de identidade. O cinema diaspórico brasileiro, caribenho e norte-americano tem a temática do racismo de forma muito mais acentuada”, explica Joel Zito. Além da produção brasileira, o Imagem dos Povos também realiza a primeira retrospectiva em Minas Gerais da obra do haitiano Raoul Peck. “É um cineasta importante nessa questão do olhar para a África. É um momento para ficar conhecendo um pouco mais dessa cultura guerreira”, convida Adyr.

Todas as sessões do Imagem dos Povos têm entrada franca. Para ampliar o alcance, repete em 2013 a experiência com canal para a exibição pela internet dos filmes nacionais que fazem parte da programação. No ano passado, as 20 produções que ficaram disponíveis on-line foram assistidas por espectadores de 193 cidades de 29 países, nos cinco continentes.

Outra atividade paralela à mostra é o 8º Seminário Internacional Imagem dos Povos – Encontros Criativos. Entre os temas estão os editais públicos e a produção artístico-cultural negra, com mediação de Rui Moreira e participação do presidente da Fundação Palmares, Hilton Cobra.

Homenagem a Bulbul 

O ator e cineasta Zózimo Bulbul, que morreu em janeiro, será o homenageado desta edição do Imagem dos Povos. Zózimo foi o primeiro ator negro a protagonizar uma novela, Vidas em conflito, na TV Excelsior e esteve à frente de papéis de destaque no cinema brasileiro, como em Cinco vezes favela (1962), Ganga Zumba (1963) e Terra em transe (1967). No evento de abertura será exibido o curta-metragem Alma no olho, e Rui Moreira apresentará coreografia especialmente criada para a ocasião.

O que ver e por quê

Cinema africano

•  As crianças de Troumaron (2012, Ilhas Maurício, de Sharvan Anenden, Harrikrisna Anenden)
O longa gira em torno da luta pela sobrevivência de quatro jovens nas Ilhas Maurício. Apesar do cenário turístico do local, a produção destaca questões urbanas muito particulares.
•  O grito da pomba (2010, Nigéria, de Sani Elhadj Magori)
É road movie nigeriano que aborda um tema universal: a família.


Cinema da diáspora

•  Raça
(2013, Brasil, de Joel Zito Araújo e Megan Mylan)
É documentário feito ao longo de cinco anos e que pretende registrar momento de afirmação da negritude no Brasil.
•  O início dos sonhos
(2010, EUA, de Horne Brothers)
Feito nos Estados Unidos, toca diretamente na questão da formação do sentido de identidade no país.


Programação

•  Sábado
19h – Alma no Olho (Soul in the eye), (1973, Brasil, 11 minutos, de Zózimo Bulbul) e Fan do Brasil (2013, Guadalupe/Brasil, 52 minutos, de Steve James)

•  Domingo
14h – 8º Seminário Internacional Imagem dos Povos – Encontros Criativos
17h – Vamos fazer um brinde? (2011, Brasil, 75 min, de Sabrina Rosa e Cavi Borges)
19h – Nossa estrangeira (2011, Burkina Faso, 82 min, de Sarah Bouyain)
21h – Koundi e o feriado de quinta-feira (2012, Camarões, 86 min, de Ariane Astrid Atodji)

• Segunda
17h – Nessa rua tem um rio (2012, Brasil, 38 min, de Alexandre Pimenta e Beatriz Goulart)
19h – Alma no olho e Fan do Brasil
21h – Mahaleo (2005, Madagascar, 102 min, de César Paes e Raymond Rajaonarivelo)

Cine Humberto Mauro do Palácio das Artes
Avenida Afonso Pena, 1.537, Centro. Entrada franca. Informações: imagemdospovos.blogspot.com

Nenhum comentário:

Postar um comentário