Estado de Minas: 13/06/2013
Amiga portuguesa me
manda um surpreendente mapa vivo da Segunda Guerra Mundial. Vivo porque a
cada impulso do mouse o mapa se modifica, as invasões vão acontecendo
na tela do computador. Como se fosse um jogo e eu fizesse parte da ação,
a um toque do mouse desperto a cor vermelha da Alemanha nazista. E ela
avança, toque a toque, por cima das fronteiras. A Europa vai sendo
tomada pela mesma cor. Não há explicações, apenas um som distante de
explosões, o ranger das lagartas dos tanques, o ronco dos aviões, tudo
muito discreto.
Um toque a mais no mouse e, como um caldo derramado, o vermelho escorre sobre a Rússia. É o começo de 1941, 75% do Exército alemão avança para tomar Moscou.
Quando desligo o mapa e agradeço por e-mail à amiga distante, ainda não sei que tenho um encontro marcado com esse mesmo ano, esse avanço, essa ameaça. E é para depois do jantar. As Bruxas da noite me esperam na escuridão.
Eu as encontro num documentário da RAI, tão jovens todas, tão sorridentes, fotografadas junto a seus aviões. No início de 41, quando o Exército alemão forçava a frente oriental e a Rússia redobrava seu esforço de guerra para conter a invasão, a major da Força Aérea soviética Marina Raskova pediu uma audiência a Stalin. O projeto que lhe ofereceu foi aprovado. E 10 meses depois, três regimentos aéreos exclusivamente femininos entraram em ação.
Nada estava a seu favor. Os colegas homens as receberam com desprezo e deboche, os uniformes eram grandes demais para elas, as botas tiveram que ser preenchidas com papel de jornal, o treinamento havia sido bem mais breve que os três anos regulamentares, e os aviões que lhes foram designados eram velhos, lentos e perigosos. Chamavam-se Policarpov U-2, biplanos de madeira e pano, antes usados para fumigação, que qualquer fósforo incendiava, onde a piloto e a navegadora iam sem proteção, entregues da cintura para cima ao frio e ao vento. Nenhum instrumento, só bússola, relógio e mapa. E nada de para-quedas. Do outro lado, os poderosos e velozes Messerschmidt alemães.
O terceiro regimento só voava à noite. No escuro, desligando o motor por momentos para evitar o ruído, elas se aproximavam do alvo e despejavam suas bombas. Só duas de cada vez, porque o aviãozinho não aguentava carga maior. Aí, era só fugir da artilharia antiaérea, livrar-se dos caças alemães que saíam atrás delas, retornar à base, aterrissar, carregar mais duas bombas e levantar voo novamente. A noite das moças era animada. Como disse no documentário uma delas, agora velhíssima, mas igualmente alerta: “Quando nós terminávamos a nossa noite, os homens estavam apenas começando a se espreguiçar e se preparando para tomar café”.
No fim da guerra, elas tinham feito 23 mil saídas e despejado cerca de 3 mil toneladas de bombas. Eram 40 tripulações duplas.
Fui rever o mapa vivo. A retirada do vermelho nazista, empurrado para fora da Rússia, tinha agora outro sabor. Desta vez, no ronco distante dos aviões, imaginei distinguir o tossir dos Policarpov. E pensei naquelas moças de cabelos curtos, cortados pela norma militar, aquelas quase meninas sorridentes, de capacete de aviação e blusão de couro, tão pouco bruxas, mas assim batizadas pelos inimigos nazistas, que sabiam, na carne, do que elas eram capazes.
Um toque a mais no mouse e, como um caldo derramado, o vermelho escorre sobre a Rússia. É o começo de 1941, 75% do Exército alemão avança para tomar Moscou.
Quando desligo o mapa e agradeço por e-mail à amiga distante, ainda não sei que tenho um encontro marcado com esse mesmo ano, esse avanço, essa ameaça. E é para depois do jantar. As Bruxas da noite me esperam na escuridão.
Eu as encontro num documentário da RAI, tão jovens todas, tão sorridentes, fotografadas junto a seus aviões. No início de 41, quando o Exército alemão forçava a frente oriental e a Rússia redobrava seu esforço de guerra para conter a invasão, a major da Força Aérea soviética Marina Raskova pediu uma audiência a Stalin. O projeto que lhe ofereceu foi aprovado. E 10 meses depois, três regimentos aéreos exclusivamente femininos entraram em ação.
Nada estava a seu favor. Os colegas homens as receberam com desprezo e deboche, os uniformes eram grandes demais para elas, as botas tiveram que ser preenchidas com papel de jornal, o treinamento havia sido bem mais breve que os três anos regulamentares, e os aviões que lhes foram designados eram velhos, lentos e perigosos. Chamavam-se Policarpov U-2, biplanos de madeira e pano, antes usados para fumigação, que qualquer fósforo incendiava, onde a piloto e a navegadora iam sem proteção, entregues da cintura para cima ao frio e ao vento. Nenhum instrumento, só bússola, relógio e mapa. E nada de para-quedas. Do outro lado, os poderosos e velozes Messerschmidt alemães.
O terceiro regimento só voava à noite. No escuro, desligando o motor por momentos para evitar o ruído, elas se aproximavam do alvo e despejavam suas bombas. Só duas de cada vez, porque o aviãozinho não aguentava carga maior. Aí, era só fugir da artilharia antiaérea, livrar-se dos caças alemães que saíam atrás delas, retornar à base, aterrissar, carregar mais duas bombas e levantar voo novamente. A noite das moças era animada. Como disse no documentário uma delas, agora velhíssima, mas igualmente alerta: “Quando nós terminávamos a nossa noite, os homens estavam apenas começando a se espreguiçar e se preparando para tomar café”.
No fim da guerra, elas tinham feito 23 mil saídas e despejado cerca de 3 mil toneladas de bombas. Eram 40 tripulações duplas.
Fui rever o mapa vivo. A retirada do vermelho nazista, empurrado para fora da Rússia, tinha agora outro sabor. Desta vez, no ronco distante dos aviões, imaginei distinguir o tossir dos Policarpov. E pensei naquelas moças de cabelos curtos, cortados pela norma militar, aquelas quase meninas sorridentes, de capacete de aviação e blusão de couro, tão pouco bruxas, mas assim batizadas pelos inimigos nazistas, que sabiam, na carne, do que elas eram capazes.
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