Zero Hora - 26/06/2013
Todos estão opinando sobre as manifestações que vêm ocorrendo no país.
Tenho pouco a acrescentar: concordo que veio em boa hora esse alerta de
que não somos tão acomodados, e ao mesmo tempo lamento que ignorantes
promovam a destruição do patrimônio público e privado, desviando a
atenção do que realmente importa nesses protestos.
Afora chover no molhado, venho sugerir uma reflexão sobre os locais
de agrupamento. A rua sempre foi o lugar ideal para se manifestar: em
grandes avenidas e praças, alcança-se o impacto pretendido. Com toda a
população por testemunha, saímos a pé em direção à casa da presidente,
dos governadores e dos prefeitos para dizer de viva voz que não
toleramos mais a corrupção e o alto custo de vida. O trânsito de carros é
redirecionado e ninguém perde sua liberdade de ir e vir. É legítimo e
eficiente.
Mas interromper rodovias é outra coisa. Compreendo (sem apoiar) que
moradores que vivam às margens de uma estrada a interrompam
momentaneamente para chamar a atenção para o número excessivo de
acidentes e atropelamentos que ali acontecem, exigindo melhor
sinalização. É uma reivindicação relacionada diretamente ao local do
protesto. Porém, no caso das manifestações de massa que clamam por
direitos diversos, interromper as ligações de acesso à cidade é um ato
de vandalismo também. É povo x povo. Não faz sentido.
Cidadãos trabalham e estudam em outras localidades, precisam
trafegar entre os municípios, cumprir seus compromissos. Pessoas viajam
para visitar parentes, realizar cursos, fazer consultas em hospitais:
não é justo que fiquem presos por um longo tempo dentro de um veículo
sem condições de conforto, higiene e alimentação.
Há idosos ali, doentes, crianças, mulheres grávidas. Sem falar no
transporte de carga, que fica impedido de abastecer nossas metrópoles.
Interromper uma estrada é criar constrangimento e promover um prejuízo a
quem, em vez de se aliar a nós, se torna uma vítima. Ela é penalizada
da mesma forma que os donos dos estabelecimentos destruídos por
vândalos.
Quando o povo se manifesta, ele faz em nome da liberdade também. A
liberdade de escolher quais são suas causas, a liberdade de se unir com
quem defende o mesmo que ele e de voltar para casa na hora que quiser,
com segurança. A liberdade de gritar palavras de ordem, cantar o hino,
levantar cartazes, usar as roupas que melhor traduzem sua indignação ou
esperança, enfim, exercer plenamente sua cidadania.
A maioria dos jovens está pensando no seu futuro, mas também
construindo um passado: querem, daqui a 20 anos, se orgulhar de terem
feito parte disso. Aderem ao movimento para, entre outras coisas, dar um
sentido à própria vida. É um objetivo maior e mais nobre do que
simplesmente aporrinhar por aporrinhar.
A rua é uma arquibancada democrática. Mas interromper a liberdade de
deslocamento do outro é uma tirania que diminui o tamanho do gigante
que acordou.
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