Quando alguém escolhe a vida pública,
qualquer que seja o ramo de atividade,
deveria saber que tal escolha carrega
bônus e ônus. Não dá para depender
do voto do eleitor ou do ingresso da plateia e, ao
mesmo tempo, ter resguardada a privacidade.
Grande parte das pessoas que votam num político
quer conhecer não só as suas ideias, mas
também a sua conduta privada. Em menor medida,
o mesmo raciocínio vale para quem compra
um CD de música ou uma entrada de cinema,
teatro ou jogo de futebol, em relação aos artistas
e atletas de sua preferência.
A História é escrita ou narrada sem autorização
dos personagens nela destacados. É evidente
que a calúnia, a injúria, a difamação,
enfim, a mentira que causa dano deve ser punida
com rigor. Para isso existe a Justiça. Ademais,
a mentira é uma violação do contrato
implícito entre o escritor e o leitor, independentemente
de se uma reputação é prejudicada
ou não. Porém, se a reputação é prejudicada
por meio da verdade, é difícil reivindicar
qualquer injustiça nisso. Não dá para censurar
livros ou reportagens jornalísticas, publicando-
se somente aquilo que seja do interesse
das figuras públicas e/ou de suas famílias.
Isso não existe em lugar nenhum do mundo
dito civilizado.
A ideia de cobrar direitos autorais, então, beira
o absurdo. Já imaginaram quanto deveria ser
pago às famílias de um Churchill, de um Hitler,
de um Leonardo Da Vinci ou de um Pelé, caso
essa teoria maluca vingasse? Queiram ou não,
todos aqueles que escolhem a vida pública ou
se destacam de alguma maneira em suas respectivas
atividades passam a fazer parte do rol
de personagens históricos, e como tais serão
tratados, para o bem ou para o mal.
Outro ponto importante nessa polêmica diz
respeito à questão da reputação, algo considerado,
de forma completamente equivocada, como
uma propriedade da personagem destacada.
Na realidade, você não possui a sua reputação.
Ela é o acúmulo do que outras pessoas pensam
e acham de você. Em outras palavras, sua
reputação consiste de projeções realizadas por
outras pessoas. Você não pode controlar isso,
embora possa ter alguma influência. Simplesmente,
não há direito de propriedade em jogo
quando se fala de reputação.
Suponha que João seja um sujeito tímido,
com enorme dificuldade de relacionamento.
Ainda que seja um cara boa praça, pode acabar
sendo visto, injustamente, como arrogante, altivo,
presunçoso, vaidoso, superior, etc. pelas
pessoas com quem se relaciona. Portanto, são
as outras pessoas, principalmente aquelas com
as quais João convive, que decidem quão valiosa
é a sua reputação. Dizer que alguém é dono
da própria imagem é dizer que ele possui o pensamento
e as opiniões alheias, o que é um rematado
absurdo. Quando os marqueteiros falam
em construir uma imagem, estão falando eufemisticamente
de formar opiniões favoráveis —
de um produto, uma empresa, um político, um
artista, etc.
Por outro lado, os indivíduos podem ter má
reputação por diversas razões, a maioria das
quais plenamente justificáveis. Por conseguinte,
disseminar informações e opiniões pode ser
uma forma de evitar danos a terceiros no futuro
(novamente, supondo que não há mentiras envolvidas).
Longe de ser simplesmente algo malicioso,
falar mal de alguém pode até vir a ajudar
outras pessoas. Por exemplo, suponha que um
famoso deputado seja processado e condenado
por danos materiais e morais a um vizinho. Ou
que um certo ator de TV tenha a fama de bater
em mulher. Tais informações, longe de serem
meras fofocas maliciosas, certamente poderão
ajudar pessoas que venham a conviver com os
mesmos lá na frente.
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