Zero Hora 19/01/2014
Nos primeiros dias do ano foi organizada uma manifestação no Rio de
Janeiro a favor do topless, mas, para desapontamento geral, teve adesão
de algumas poucas gatas pingadas e o assunto não evoluiu.
Brasil, país da liberalidade, do Carnaval, das popozudas, das
mulheres-fruta, da globeleza, do fio dental e demais manifestações de
culto ao corpo (sem que nada disso altere a paz familiar), proíbe o
topless na beira da praia. Um contrassenso? É, mas explica-se.
O Brasil é permissivo quando o assunto é sexo. De letras de música a
comerciais de tevê, aqui quase tudo tem apelo erótico e tudo bem,
aceitamos a lascívia como traço de caráter. Seios de fora é uma
representação da nossa identidade, da nossa latinidade, das nossas
raízes – desde que associada, de forma sutil ou não, à malandragem, à
sacanagem, à libido. Por incrível que pareça, é mais chocante ver uma
mulher amamentando seu bebê dentro de um ônibus do que arregaçando a
camiseta e mostrando os peitos em frente às câmeras num estádio de
futebol. Esta será candidata à musa. Ela pode. Mas o gesto maternal
sugere indecência.
A amamentação em lugares públicos não é uma atitude sexual,
portanto, é algo que perturba, que está fora do nosso contexto. Com o
topless se dá o mesmo. Uma mulher com os seios de fora à luz do dia, em
volta dos filhos, tomando mate gelado? É atentado ao pudor.
Topless não é um ato de exibicionismo, e sim uma atitude
naturalista. Na Europa, basta despontar o primeiro raio de sol para a
população tirar a roupa, inclusive nos parques. Em Munique, homens e
mulheres dos oito aos 80 anos se reúnem no Englischer Garten, tiram toda
a roupa – toda – e ficam lendo seu livrinho numa boa, com a pureza de
um recém-nascido. Ninguém sai batendo fotos, salivando com cara de
tarado ou marcando encontros atrás da moita. Desde a loira escultural
até a senhora pelancuda, todos têm sua privacidade respeitada.
À beira mar o topless é ainda mais comum. Muitas mulheres dispensam o
sutiã, não importa o estado de conservação de suas mamas. Fazem isso
porque é mais confortável e também para ganhar um bronzeado uniforme,
sem as marcas do biquíni. Particularmente, acho mais bonito usar as duas
peças, mas não é de estética que se está falando. É do direito que uma
pessoa tem de vestir-se (ou, no caso, despir-se) como bem entender,
desde que num ambiente propício e sem agredir quem está a sua volta.
Aqui, na novela das nove, homens disputam para ver o “bigodinho”
(depilação da virilha) de uma colega de trabalho, e o povo acha a maior
graça, mas topless é perversão. Dançamos na boquinha da garrafa, mas não
toleramos a liberdade de costumes. E como não se muda a mentalidade de
um país por decreto, fazer topless sem estardalhaço ficará para uma
próxima encarnação.
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