segunda-feira, 31 de dezembro de 2012

Cora Coralina



  • O chamado das Pedras
    (Cora Coralina)

    A estrada está deserta.
    Vou caminhando sozinha.
    Ninguém me espera no caminho.
    Ninguém acende a luz.
    A velha candeia de azeite
    de lá muito se apagou.

    Tudo deserto.
    A longa caminhada.
    A longa noite escura.
    Ninguém me estende a mão.
    E as mãos atiram pedras.
    Sozinha...

    Errada a estrada.
    No frio, no escuro, no abandono.
    Tateio em volta e procuro a luz.
    Meus olhos estão fechados.
    Meus olhos estão cegos.
    Vêm do passado.

    Num bramido de dor.
    Num espasmo de agonia
    Ouço um vagido de criança.
    É meu filho que acaba de nascer.

    Sozinha...
    Na estrada deserta,
    Sempre a procurar
    o perdido tempo que ficou pra trás.

    Do perdido tempo.
    Do passado tempo
    escuto a voz das pedras:

    Volta...Volta...Volta...
    E os morros abriam para mim
    Imensos braços vegetais.

    E os sinos das igrejas
    Que ouvia na distância
    Diziam: Vem... Vem... Vem...

    E as rolinhas fogo-pagou
    Das velhas cumeeiras:
    Porque não voltou...
    Porque não voltou...
    E a água do rio que corria
    Chamava...chamava...

    Vestida de cabelos brancos
    Voltei sozinha à velha casa deserta.

    - Cora Coralina, "Meu Livro de Cordel", 8°ed., 1998.

    Foto: do livro "Cora Coralina - Coração do Brasil", pág. 13 - Museu da Língua Portuguesa. São Paulo, 2009. [Acervo do Museu Casa Cora Coralina].
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    Cora Coralina, pseudônimo de Ana Lins dos Guimarães Peixoto Bretas (20 de agosto de 1889 - 10 de abril de 1985). Conheça a história e outros poemas de Cora Coralina no Blog: http://elfikurten.blogspot.com.br/2011/12/cora-coralina-venho-do-seculo-passado-e.html
  • via https://www.facebook.com/photo.php?fbid=412338915469196&set=a.414695111900243.84274.191749140861509&type=1&theater

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