Obras de mestres do passado ganham espaço em mercado de contemporâneos agora caros demais
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Emiliano Di Cavalcanti, "A Carioca" (1957) - Aquarela do artista moderno brasileiro foi vendida em Nova York em novembro passado por R$ 95,7 mil, pouco mais do que a obra de Vik Muniz reproduzida adiante
SILAS MARTÍDE SÃO PAULOEm novembro do ano passado, uma tela do século 17, obra do belga Anton Van Dyck, foi arrematada num leilão em São Paulo por R$ 2,4 milhões. Senhores ali presentes disputaram lance a lance com compradores que telefonavam na hora -em minutos, a peça estava vendida.
Dias antes, em Nova York, a Sotheby's vendeu um quadro de Beatriz Milhazes por R$ 4,3 milhões, o maior valor já pago pela obra de um brasileiro em leilão, quase o dobro do Van Dyck, um dos mestres do barroco flamengo.
Num momento em que obras de artistas contemporâneos atingem preços maiores que os de trabalhos dos grandes mestres, colecionadores têm se voltado para peças mais antigas -um investimento que consideram menos arriscado diante de valores em alta desenfreada.
"Um nome quente hoje na arte contemporânea pode não ser um nome tão quente amanhã", analisa Christopher Apostle, chefe do departamento de velhos mestres da Sotheby's. "Mas sempre haverá interesse por Van Dyck, Ticiano, Rembrandt. Eles têm 300, 400 anos de história."
De olho nessa bagagem, feiras como a Frieze, em Londres, que se consolidou como plataforma de vendas de arte contemporânea, abriu no ano passado um evento paralelo dedicado a arte antiga.
Enquanto isso, a Tefaf, a mais tradicional feira de antiguidades do mundo, que acontece em março em Maastricht, na Holanda, está buscando novos colecionadores em mercados como São Paulo e traçando estratégias para modernizar seus estandes.
"Há uma leva de colecionadores que sintonizaram suas antenas com a arte antiga", diz Ben Janssens, diretor da Tefaf. "Vejo uma mudança de hábitos, pessoas agora estão inclinadas a comprar peças de todos os períodos."
MODA E BOBAGEM
"Hoje todo mundo compra Beatriz Milhazes e Vik Muniz. E, às vezes, você compra porque todo mundo compra", diz o colecionador paulistano Luís Alberto Altílio. "Gosto de uma arte que se expressa num suporte qualificado e que não seja uma bobagem."
Na opinião de Ricardo von Brusky, que vendeu o Van Dyck em sua casa de leilões, existe agora uma espécie de "resgate da arte antiga".
"Quando você não tem cultura, um marchand malandro emplaca o que está na moda", diz Von Brusky. "Gente com berço, bagagem e cultura está voltando a comprar arte antiga e moderna porque são obras consagradas."
Mas, com ou sem berço, colecionadores estão de olho nos preços. "Ao contrário do que muitos pensam, arte antiga e clássica custa menos do que obras contemporâneas", diz Janssens, diretor da Tefaf. "O que se supõe custar milhões não custa milhões, e é isso que está se tornando evidente no mercado agora."
De fato, peças de mestres consagrados do passado têm atingido em leilões valores iguais ou até menores do que trabalhos de artistas vivos.
Na última temporada de vendas em Nova York, uma obra de Di Cavalcanti atingiu preço pouco maior do que uma fotografia de Vik Muniz. Um Van Gogh arrematado há um ano saiu por menos do que uma tela dos anos 1990 do alemão Gerhard Richter.
"Mesmo que sejam mercados diferentes, valores de arte antiga são uma pechincha perto dos preços dos contemporâneos", afirma Apostle, da Sotheby's. "É como caviar e ovos de galinha -os dois são ovos, mas não custam o mesmo por uma questão simples de oferta e demanda."
Agentes fazem pente fino atrás de obras falsas
DE SÃO PAULOUm dia antes de a feira receber seus primeiros convidados, um time de 140 especialistas examina cada obra à venda na Tefaf, em Maastricht, na Holanda, e retiram em silêncio as peças que julgam não ser autênticas ou de procedência duvidosa.Muitos desses especialistas, que integram o chamado comitê de análise da feira, também farejaram cada canto da Frieze, em Londres, que agora tem antiguidades e obras clássicas.
Com a valorização do mercado de peças antigas, o exame cuidadoso de obras se tornou uma preocupação constante para evitar fraudes e falsificações.
"Em geral, removemos de 70 a cem objetos de cada feira", conta Henk Van Os, diretor do comitê da Tefaf. "Galeristas podem até reclamar, mas temos de ter muito cuidado com cada peça. É uma questão de honra."
No caso da Tefaf, há 20 grupos diferentes de especialistas que analisam desde cerâmicas e tapeçarias a pinturas antigas e modernas. São estudiosos ligados a museus, universidades e também a algumas galerias.
"Tentamos criar uma maneira nova de olhar para arte antiga, mas também temos um processo rigoroso de avaliação das peças", diz Victoria Siddall, diretora da Frieze Masters, a ala de arte antiga da Frieze. "Colecionadores que vão à feira sabem que aquilo passou por um crivo, então podem confiar no que compram."
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