Fernando Reinach - O Estado de S.Paulo
No passado, médicos usavam todos os sentidos para o diagnóstico. Pôr urina do paciente sobre a língua e constatar que ela estava doce era um método de diagnosticar diabetes. Problemas hepáticos eram descobertos cheirando o hálito, pois moléculas chamadas corpos cetônicos têm cheiro característico e são produzidas em grande quantidade pelo fígado doente. Com os laboratórios de análises clínicas, esses testes foram abandonados. Hoje o médico ainda usa audição, tato e visão, mas paladar e olfato foram praticamente excluídos da prática médica.
Mas parece que olfato voltará aos hospitais. Não o humano, mas o de cães, cem vezes mais poderoso. Na Holanda, médicos demonstraram que um beagle pode identificar pacientes infectados por Clostridium difficile. Na Europa, 50 em cada 100 mil pacientes entram no hospital com essa bactéria, que causa diarreia contagiosa. Por isso, é preciso identificá-la logo. Mas não é a toa que ela se chama C. difficile: é difícil de identificar. Métodos seguros levam dias para dar resultado. Um extrato das fezes do paciente é purificado e posto em contato com células humanas. Se o extrato tiver a toxina da bactéria, as células morrem. Esse método, associado a testes em que a bactéria é cultivada e identificada, são usados na maioria dos hospitais. Mas leva de 2 a 3 dias e custa caro. Por isso, em média os pacientes só são tratados após 8 a 11 dias. E nesse período acabam contaminando outros pacientes no hospital.
Há anos enfermeiras contam que as fezes desses pacientes têm cheiro peculiar (parecido com o de fezes de cavalo), mas mesmo enfermeiras com muita prática têm dificuldade de saber quem está infectado. Então, médicos holandeses tiveram a ideia de recrutar a ajuda de um cão. O beagle Tiff, de 2 anos, foi treinado por dois meses para detectar o cheiro da bactéria nos mais variados ambientes. Quando o localizava, ele deitava ou sentava próximo à origem do cheiro.
Tiff então foi desafiado no seu primeiro teste clínico. Amostras de fezes de 50 pacientes infectados e de 50 pacientes normais ou com outras formas de diarreia foram submetidas ao "Laboratório de Diagnóstico Tiff". Eles acertou o diagnóstico em 100% dos casos. No passo seguinte, o cheiro das fezes foi colocado em materiais como metais, roupa de cama, luvas cirúrgicas, gaze, etc. Novamente Tiff acertou 100% dos diagnósticos.
Então foi feito o teste final. Tiff recebeu uma roupa amarela, foi examinado por um veterinário, tomou banho e foi passear nas enfermarias de dois grandes hospitais na Holanda. Ele somente passeava entre as camas, sempre com uma coleira e não era permitido que ele tocasse nos móveis ou nas pessoas. Em várias sessões, ele visitou 300 pacientes, dos quais 30 estavam infectados. Nem o treinador nem os médicos sabiam quem estava infectado. Tiff acertou quase todos os casos. Dos 30 pacientes infectados Tiff localizou 25 (sentou na frente das camas de maneira definitiva). Entre os 270 pacientes normais, 265 foram identificados corretamente (desprezados por Tiff).
A taxa de acerto de Tiff é igual ou melhor que os testes de laboratório - que, na Holanda, custam de US$ 250 a US$ 1 mil cada um. Mas o melhor é que Tiff faz o diagnóstico em 1 minuto. A ideia é criar uma empresa que treine cachorros para isso, além de testar outros usos para o faro dos cães, como a detecção de câncer de bexiga na urina de pacientes. Se funcionar, os laboratórios vão logo possuir uma divisão de diagnósticos caninos.
http://www.estadao.com.br/noticias/impresso,diagnostico-bom-para-cachorro-,982535,0.htm
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