Séries ganham fôlego no país depois que a
Lei nº 12.485 começou a vigorar. Produtoras buscam formar mercado
alternativo à televisão dominada pelo monopólio das novelas
Carolina Braga
Estado de Minas: 10/03/2013
Foi-se o tempo em que as novelas reinavam
absolutas na telinha do brasileiro. Embora não sejam tradição no país,
as séries 100% nacionais chegam sorrateiras, prometendo atrair cada vez
mais telespectadores, e 2013 deve ser o ano da virada. Além de oferecer
diversidade, a produção nesse formato cresce aceleradamente. “Há tempos a
gente estava ali, oferecendo, querendo bem e cheio de amor para dar,
mas não havia demanda. Ela veio forçada pela lei”, afirma o diretor
Marcelo Machado.
Um dos fundadores da extinta produtora Olhar
Eletrônico ao lado de Fernando Meirelles, Beto Salatini e Paulo Morelli,
Machado se refere à Lei nº 12.485/2011, pivô da transformação – pelo
menos para as empresas independentes. A nova legislação obriga
operadoras a veicular pelo menos três horas e meia de conteúdo nacional.
A partir de sua vigência, quadruplicou a exibição do produto
brasileiro, calcula a Agência Nacional do Cinema.
Está prevista
para depois de julho a segunda temporada da bem-sucedida Sessão de
terapia, produzida pela Moonshot e dirigida por Selton Mello. A
produtora se dedica também ao sitcom Máximo & Confúcio, para a TV
Cultura, e a Divina D+, sobre mulheres em processo de superação. Este
ano, até a MTV – canal essencialmente musical – estreia na dramaturgia
com Projeto secreto, série de ficção sob o comando de Felipe Hirsch,
aclamado diretor de teatro.
Dia 20, estreia no canal NatGeo A
verdade de cada um, com episódios documentais produzidos pela O2 Filmes e
dirigidos por Marcelo Machado. A empresa do cineasta Fernando Meirelles
também prepara Beleza S/A, série de ficção que se passa nas
dependências de uma clínica de estética, e Contos do Edgar, microssérie
de cinco episódios baseada em textos do escritor norte-americano Edgar
Allan Poe. Na Conspiração, há nada menos de 28 projetos em andamento.
“Teledramaturgia
é a vocação do mercado audiovisual brasileiro. As séries, portanto, são
extensão natural dessa aptidão, que vai além das telenovelas. O
Multishow sempre investiu no formato, mas nos últimos quatro anos isso
se intensificou. O canal conta com um celeiro de bons atores e o mercado
audiovisual está consolidado. Não podemos nos esquecer de que o formato
é consumido por nosso público-alvo, o jovem”, afirma Christian Machado,
gerente de produção artística do Multishow.
Para o diretor Pedro
Morelli, a TV brasileira experimenta um momento histórico: “É uma
oportunidade para quem está entrando no mercado, pois chegou a hora de
concretizar projetos”. A ideia de Contos do Edgar partiu de Morelli, que
assina a direção e a adaptação dos textos. “Ela surgiu da necessidade
de termos algo para atender à lei. Desenvolvemos e apresentamos o
projeto depois dessa demanda”, conta.
Recém-formado em produção
audiovisual pela Universidade de São Paulo (USP), Morelli, de 26 anos,
pertence à geração que começa a trabalhar em um momento especial. O
experiente Roberto D’Avila, diretor da Moonshot, acompanha há tempos
esse filão. “O mercado brasileiro de séries nunca existiu. Nosso produto
majoritário é a novela”, lembra ele. Bem antes da Lei 12.485, a
Moonshot já fazia suas apostas. Em 2008, em parceria com o canal Fox,
produziu 9MM: São Paulo.
Sessão de terapia é um dos destaques
destes novos tempos. Veiculada pelo GNT, a atração aumentou em 109% a
audiência do canal em sua faixa de horário. “O GNT foi muito feliz,
porque o hábito das pessoas está mudando muito. A queda de audiência das
novelas é prova disso”, comenta Roberto D’Avila.
“A TV
brasileira mais importou que produziu. Influenciados pelo mercado
externo, os canais daqui começam a se interessar pelas séries”, acredita
Zico Goes, diretor de programação da MTV Brasil. A decisão da emissora
de inaugurar sua teledramaturgia com Projeto secreto promete inovar
tanto na linguagem quanto no conteúdo. “Será bem diferente”, garante
Zico.
Linguagem Pedro Morelli diz que série de
TV é produto híbrido, trazendo características da televisão e do cinema.
No caso de Contos do Edgar, ele procurou se aproximar do estilo
cinematográfico para ressaltar o clima de suspense que o texto pede. O
formato representa campo aberto para a experimentação. Percebe-se a
busca de uma identidade brasileira no modo de fazê-lo.
“Como
produtoras independentes voltadas para a TV não são tradição no país,
elas geralmente vêm do cinema ou da publicidade. Os produtos televisivos
acabam carregando cacoetes de uma coisa ou de outra. Do ponto de vista
da linguagem, não acredito em revolução. O produto tem um sentido
comercial muito claro”, analisa Luiz Noronha, representante da
Conspiração.
“Os americanos e os ingleses têm know-how. Não
precisamos imitá-los, mas entender quais são os códigos de confecção do
produto e trazê-los para cá”, diz Roberto D’Avila. “A diversidade no
mercado é grande, já percebemos as marcas dos autores. Multiplicidade é
uma característica. O formato tem mais gêneros que a telenovela, conclui
Christian Machado, do Multishow.
VEM AÍ ...
CONTOS DO EDGAR
Produzida
pela O2 Filmes com direção geral de Pedro Morelli, a série se inspira
em contos de Edgar Allan Poe. Estreia em abril, no canal Fox
PROJETO SECRETO
Dirigida por Felipe Hirsch, é a primeira aposta da MTV na dramaturgia
BELEZA S/A
Produzida
pela O2 Filmes, é considerada uma espécie de versão brasileira da
americana Nip/Tuck. Estreia no GNT, no segundo semestre
DIVINAS D
Criação da Moonshot, mostra três mulheres em busca de superação
SESSÃO DE TERAPIA
Produzida pela Moonshot, a segunda temporada da série dirigida por Selton Mello vai ao ar no segundo semestre, no GNT
Enquanto isso...
...Em Minas
Em
ritmo mais lento, as produtoras mineiras começam a sentir o aumento da
demanda. Na Camisa Listrada, a série de quatro episódios sobre viagens
do paisagista Roberto Burle Marx está sendo concluída e deve ser exibida
pela TV Brasil. “Trabalhamos com carteira de cinco produtos para
diferentes emissoras”, conta Júlia Nogueira, coordenadora de TV e
documentários da produtora.
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