terça-feira, 21 de maio de 2013

Aprendendo violão com neurociência - Suzana Herculano-Houzel

folha de são paulo

NEURO
SUZANA HERCULANO-HOUZEL suzanahh@gmail.com
Aprendendo violão com neurociência
Não dá para praticar técnica e velocidade ao mesmo tempo: os dedos hesitam; mas o desafio é parte da graça
Não que eu precisasse de mais uma atividade para encher meus dias. Mas, quando a oportunidade surgiu, eu a agarrei: estou aprendendo a tocar violão clássico, um velho sonho meu --e aproveitando para usar a meu favor todos meus conhecimentos sobre a neurociência do aprendizado.
Primeiro, para não desanimar antes de começar, achando que, aos 40 anos, já sou velha demais para a empreitada. Muito pelo contrário: tenho uma vantagem enorme sobre meus filhos, outros alunos do mesmo professor, com seus cérebros novinhos.
Com a minha bagagem de quinze anos de estudo formal de música, ler partituras, ainda mais com uma pauta só, é trivial. E os anos de prática no piano me deram uma boa coordenação motora e, mais importante ainda, ensinaram meu cérebro a fazer coisas diferentes com as duas mãos sem grandes problemas.
Ainda assim, o repertório de movimentos aprendidos com o piano não incluía puxar cordas e dedilhá-las com o polegar, nem fazer "hammer-ons" e "pull-offs" com os dedos da mão esquerda. Como chegar lá?
Começamos, meu professor e eu, avaliando o que eu já sei fazer ao violão e onde eu quero chegar. A partir daí, recebo toda semana exercícios novos, progressivamente mais difíceis. Uns são simples de ler e exigem apenas prática, prática e prática até o cérebro aprender o que fazer com os dedos; outros exigem quebrar a cabeça para descobrir onde no braço do violão dará para tocar todas aquelas notas ao mesmo tempo.
Ter método é fundamental. Não dá para querer aprender técnica e velocidade ao mesmo tempo: os dedos hesitam, esbarram, tropeçam, atropelam-se nos arpejos. Há que se começar devagar para aprender o dedilhado e acelerar aos poucos, metodicamente.
Mas o desafio é parte da graça e me mantém motivada. Num arroubo de otimismo ainda maior que o meu, o professor me propôs na terceira aula aprender a tocar "Astúrias", de Albeniz --simples e lindíssima, mas cheia de notas repetidas a toda velocidade, muito além das minhas capacidades.
Atrevida que sou, resolvi tentar --e estou não só me divertindo como gratamente pasma com o que já consigo fazer. Com isso, minha motivação está nas alturas. Se sobram 15 minutos antes de ir para o trabalho, tiro meu violão do estojo já de manhã e passo o dia antecipando poder tocar um pouquinho mais de "Astúrias" no fim do dia...

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