Aos 71 anos, cantor, pianista e
compositor reclama do preconceito da própria classe com os ditos
artistas populares e confessa que seu DNA cigano se manifestou desde
menino
Ana Clara Brant
Estado de Minas: 06/05/2013
Não é qualquer pessoa que recebe uma
homenagem de Luiz Gonzaga e ganha de presente uma música do Rei do
Baião. “Nem com os Beatles isso ocorreu. Sou mais importante do que
eles”, brinca o cantor, compositor e pianista Benito di Paula, de 71
anos. Em 1977, Gonzagão compôs a música Chapéu de couro e gratidão, em
que entoava: “Como é bonito, Benito”. Aliás, este não é o nome de
verdade do artista nascido em Nova Friburgo, Região Serrana do Rio, que
foi batizado como Uday Velloso. De família cigana por parte de pai, ele
conta que ninguém mais o chama assim há anos. “Se chamarem, nem atendo. É
um nome indiano e diferente. Significa ‘chefe da tribo’”, revela.
O
nome Benito foi sugerido por um português, proprietário de um hotel e
de uma boate em sua cidade, que considerava Uday inapropriado e pouco
sonoro para a televisão. “Fizeram uma enquete e ficou Benito. E, como
era italiano, sugeri o di Paula. Virei Benito mesmo, não tem jeito”,
recorda.
Há quatro décadas na estrada, o cantor considera que
começou um pouco tarde e foi muito influenciado pelo pai, que, quando
não estava trabalhando como ferroviário, gostava de se aventurar na
música, seja tocando adordeom, violão de sete cordas ou cavaquinho.
“Todo mundo lá em casa sempre gostou desse negócio de cantar e tocar.
Tenho, inclusive, um irmão, o Ney, que se apresenta comigo. E meu filho,
Rodrigo Velloso, está indo pelo mesmo caminho, lançou dois CDS. É algo
que está no sangue”, acredita.
O DNA cigano se manifestou desde
menino, pois, apesar de ter residência fixa em São Paulo há anos, ele
gosta mesmo é de viajar. E não poderia ter escolhido outra profissão.
“Cada dia estou num lugar diferente. Fiz um show outro dia em Recife
para 80 mil pessoas, depois fui para o Ceará. Agora, vou para o interior
paulista. Meu negócio é rodar mesmo”, afirma. E, embora não esteja
sempre aparecendo na imprensa, especialmente na televisão, que ele
considera ruim, diz não ligar para esse descaso da mídia. O cantor conta
que chegou a ter um programa na TV, Benito di Paula e seus convidados –
Brasil Som 75, na Tupi, mas não suportou. “Era muito jabá. Meu negócio é
show, público, ginásio, é viajar. Fiquei muitos anos sem gravar e
voltei a fazer trabalho ao vivo há três anos, porque meus filhos
insistiram. Ninguém liga para a cultura neste país”, brada.
Legião de fãs
Com
seu inseparável piano e sempre de terno, Benito di Paula também lamenta
o preconceito que sofreu ao longo dos anos por alguns setores, apesar
de assegurar que não liga e que isso nunca o atrapalhou a continuar o
seu processo criativo. Faz questão de exaltar seu trabalho e diz que, se
tem tanto tempo de carreira e uma legião de fãs, inclusive no exterior,
é porque tem talento. “Ninguém pode discriminar ninguém. Mas tem uma
canalhada que não está nem aí. E até alguns artistas são assim. Você já
viu algum colega elogiar o outro? Estou sempre falando bem de Gonzagão,
Tom Jobim, Chico Buarque. Faço questão mesmo. Tem uma turma aí que fala
mal de mim, antes mesmo de me conhecer. Um bando de covardes. Isso é
sacanagem”, desabafa. Ele defende que, assim como qualquer outro, é um
artista popular e merece respeito e reconhecimento. “Se você analisar,
todo artista que tem público é popular. Tem artista mais popular do que
os Rolling Stones ou do que os Beatles? Não importa se é classe A, B ou
Z, ou se é Chico Buarque, Noel Rosa ou Roberto Carlos. Ninguém é menos
artista do que o outro só porque canta para a elite. Isso é uma grande
bobagem”, destaca.
Benito – que nos anos 1970 chegou a disputar a
liderança das vendas de disco com Roberto Carlos – é autor de sucessos
como Mulher brasileira, Retalhos de cetim e Charlie Brown e foi
classificado por muita gente como representante do samba joia (samba
tradicional com piano e arranjos românticos e jazzísticos). Mas ele
mesmo refuta esse rótulo e assegura que seu estilo é o latino-americano.
“Meu negócio é cubano, chá-chá-chá, bolero. Tenho sim influência do
samba de Ataulfo Alves, mas acho que fui muito associado a isso porque
montei várias rodas de samba em São Paulo”, justifica.
O cantor e
compositor, que é autodidata, afirma que tem muito orgulho de tudo o
que construiu e ainda mais vindo de uma família humilde. Ele se sente
realizado por saber que tanta gente importante, inclusive estrangeiros,
como Stevie Wonder, Sarah Vaughan, Ravi Shankar e o seu ídolo, o
pianista Oscar Peterson, o admira. “Graças a Deus, sou um homem que
conhece bem a vida. Tenho gratidão enorme pelo meu público. Pessoas
espalhadas pelo mundo. Mas isso é fruto de muita ralação, dedicação. Tem
gente que não dá colher de chá para mim, mas continuo aí e vou
continuar”, avisa.
Perfil
. Uday Velloso (Benito di Paula)
. Nascido em Nova Friburgo (RJ), em 28/11/41
. Maiores sucessos: Mulher brasileira e Charlie Brown
. Estimativa de vendagem em 40 anos de carreira: 25 milhões
. Disco mais recente: Benito di Paula ao vivo (2009)
Cante com Benito di Paula
. Mulher brasileira
Agora chegou a vez, vou cantar
Mulher brasileira em primeiro lugar
Agora chegou a vez, vou cantar
Mulher brasileira em primeiro lugar
Norte a sul do meu Brasil
Caminha sambando quem não viu
Mulher de verdade, sim, senhor
Mulher brasileira é feita de amor
. Charlie Brown
Eh! Meu amigo Charlie
Eh! Meu amigo
Charlie Brown, Charlie Brown...
Se você quiser
Vou lhe mostrar
A nossa São Paulo
Terra da garoa
Se você quiser
Vou lhe mostrar
Bahia de Caetano
Nossa gente boa
Se você quiser
Vou lhe mostrar
A lebre mais bonita
Do Imperial
Se você quiser
Vou lhe mostrar
Meu Rio de Janeiro
E nosso carnaval
Charlie!
Se você quiser
Vou lhe mostrar
Vinicius de Moraes
E o som de Jorge Ben
Se você quiser
Vou lhe mostrar
Torcida do Flamengo
Coisa igual não tem
Se você quiser
Vou lhe mostrar
Luiz Gonzaga
Rei do meu baião
Se você quiser
Vou lhe mostrar
Brasil de ponta a ponta
Do meu coração
Oh Oh Charlie!
Eh! Meu amigo Charlie
Eh! Meu amigo
Charlie Brown, Charlie Brown...
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