Estado de Minas - 28/05/2013
Olhe pra mim de novo
Questões
genéticas e de gênero, estigmas envolvendo a transexualidade, tabus e
conflitos familiares e doenças tratadas de forma preconceituosa. Tudo
isso está no documentário Olhe pra mim de novo, primeiro longa dirigido a
quatro mãos por Claudia Priscilla e Kiko Goifman (o casal vive junto há
14 anos). Com abordagem que mescla humor e informalidade, a trama é
conduzida sertão nordestino adentro por um dos personagens, o transexual
masculino Sillvyo Luccio, que nasceu mulher e aguarda cirurgia para se
transformar em homem. O filme entra em cartaz quinta, no Belas Artes, e
tem, na abertura, exibição do curta O vestido de Laerte, de Claudia
Prisicilla e Pedro Marques.
Olhe pra mim de novo é, como diz o
nome, um convite para enxergar (com calma e delicadeza) a vida de
pessoas que não se enquadram na “normalidade”, gente que vive à margem,
vítima de preconceito. Enquanto se expõe com verdade (ele não poupa
declarações como “quando tiro a roupa, a máscara cai”), Sillvyo Luccio
percorre o interior do Nordeste contando sua história e recolhendo
depoimentos de pessoas que, como ele, têm que se reinventar.
A
diretora Claudia Priscilla diz que o personagem se tornou central quando
já durante o processo de pesquisa. “Ele é filho de evangélicos num
lugar machista, agrega questões importantes resolvidas na marra, pondo a
cara pra bater, se expondo.” Ela admite que houve “momentos punk”
durante as filmagens (e é perceptível em cena), caso do
encontro/confronto de Sillvyo com a filha. “Ela é o que ele deveria ter
sido, fruto da educação dada pela mãe dele, que recebeu a neta como
presente”, afirma a diretora.
Claudia Priscilla atribui muito da
facilidade com que temas de extrema crueza são tratados tanto à
dobradinha com o marido quanto ao bom humor de Sillvyo. “O lado tabu é
relevante na obra de Kiko; do meu lado entra a questão da sexualidade.
Normalmente, assuntos sérios são tratados de um jeito mais formal.
Procuramos a leveza. Sillvyo é personagem cheio de camadas, que mantém
sempre o humor num meio em que há piadas extremamente grosseiras”,
analisa.
Kiko Goifman acha que o fato de ele e Claudia terem
trabalhado juntos em “eterno diálogo” contribuiu para maior leveza. “Na
dúvida de que alguma coisa pudesse ficar muito carregada, tiramos”,
conta. Para ele, “Sillvyo simplesmente roubou o filme, graças à oratória
e ao carisma dele”. O diretor admite que este é o seu filme mais
antievangélico. “Eles são um dos maiores problemas do Brasil. Tudo tem
que passar pela bancada evangélica, é um atraso de vida absurdo”,
afirma.
Belo aperitivo
A
questão de gênero está presente também em O vestido de Laerte, de
Claudia Priscilla e Pedro Marques. Melhor curta do Festival de Brasília
do ano passado, mostra o cartunista em momento intimista, em casa. Ele
confessa que seu desejo de se vestir de mulher surgiu na infância.
Preferia as roupas das meninas de asas nas coroações ao menino de
terninho.
No lançamento em São Paulo, Kiko Goifman, que está em cena
(também de vestido), conta que houve a manifestação Saiaço no cinema
contra a homofobia.
Olhe pra mim de novo
Documentário
de Claudia Priscilla e Kiko Goifman, em cartaz no Belas Artes a partir
de quinta-feira, às 19h30. Na abertura, exibição do curta O vestido de
Laerte, de Claudia Priscilla e Pedro Marques. Rua Gonçalves Dias, 1.581,
Lourdes, (31) 3252-7232.
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