segunda-feira, 13 de maio de 2013

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folha de são paulo

Era do Carbono
Humanidade cruza a barreira de 400 ppm de CO2, o que pode levar a mais de 2°C de aquecimento global; chegou a hora de tratar da adaptação
Em alguns séculos, é plausível que o de número 21 se torne conhecido como o primeiro da Era do Carbono. E o marco de passagem poderá ser fixado em 10 de maio de 2013, quando a concentração de dióxido de carbono (CO₂) ultrapassou 400 partes por milhão (ppm).
Isso não ocorria há 3 milhões de anos. Jamais um ser humano -além dos cerca de 7 bilhões vivos hoje- havia respirado numa atmosfera com tal quantidade do principal gás do efeito estufa.
Nenhum deles, por certo, terá notado a diferença. O CO2 não tem cheiro nem cor e é expelido normalmente dos pulmões a cada expiração. O limite de 400 ppm é apenas simbólico -mas não arbitrário.
Nos últimos anos, as negociações internacionais sobre a mudança do clima, iniciadas há mais de duas décadas, se concentraram -e fracassaram- em torno desse valor. Sua meta era diminuir a emissão de CO2, cuja fonte mais comum é a queima de combustíveis fósseis como derivados de petróleo, para tentar evitar que se adicionem 2°C à temperatura média da atmosfera neste século (no anterior, o acréscimo foi de 0,6°C).
A estimativa de que 400 ppm de CO2 resultarão em 2°C a mais resulta de equações ainda hoje em debate. Não se exclui que o aquecimento seja menor, ou mais lento, porque se conhece mal o papel de alguns fatores naturais, como o comportamento dos oceanos.
Não se discute mais, contudo, se há de fato aquecimento. Em 2012, a temperatura ficou 0,45°C acima da média de 14°C registrada no período 1961-1990. Foi o nono ano mais quente registrado desde 1850 e o 27º consecutivo acima da média.
O gelo sobre a Groenlândia e o oceano Ártico bateu recordes de diminuição no verão de 2012 no hemisfério Norte. Não está, porém, na elevação do nível do mar que o degelo da primeira pode causar a maior de nossas preocupações.
Mais temidos são os efeitos regionais sobre o clima, como invernos mais rigorosos na Europa, secas mais devastadoras no Nordeste do Brasil e na Austrália e furacões mais intensos no Caribe -como se viu em 2012. Cresce a convicção de que se preparar para o estresse climático pode ser mais eficaz que tentar deter o aquecimento.
A diminuição das emissões de CO2 só poderia ser obtida de duas maneiras, ambas improváveis: redução drástica do crescimento populacional ou revolução no sistema energético, com rápido abandono dos combustíveis fósseis.
Não há clima para isso. Os combustíveis fósseis ganham espaço, em lugar de perder, com a exploração rentável do gás de xisto (EUA), do óleo de areias betuminosas (Canadá) e do pré-sal (Brasil).
Com o mundo rico em crise e o emergente entrevendo aí a oportunidade de acelerar o desenvolvimento, ninguém tem incentivos para prescindir das alternativas energéticas mais baratas -e sujas.
Na Era do Carbono, a humanidade terá de exceder-se em outra especialidade sua que não a de alterar o ambiente em escala planetária: adaptar-se a ele, a todo custo.

    EDITORIAIS
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    A confecção do sangue
    O trágico desmoronamento da fábrica Rana Plaza, na periferia da capital de Bangladesh, Daka, em 24 de abril, escancarou as péssimas condições de trabalho no segundo maior polo da indústria têxtil mundial, atrás somente da China.
    O prédio só tinha autorização para cinco andares, mas ganhou outros três. Mais de 3.000 pessoas trabalhavam no local quando o edifício ruiu, das quais ao menos mil morreram -mais de duas semanas depois, o número de corpos resgatados continua subindo.
    A notícia ganhou repercussão global pelo peso de Bangladesh na cadeia mundial de confecções. Muito do que era produzido em Rana Plaza portava a etiqueta de marcas internacionais famosas. Algumas das peças são vendidas no exterior a preço acima do valor do salário mínimo local, R$ 75.
    Acidentes na indústria têxtil para exportação são frequentes em Bangladesh, que detém o 146º lugar, entre 186 nações, no ranking de desenvolvimento humano da ONU. Em 2012, por exemplo, um incêndio na fábrica Tazreen Fashions deixou pelo menos 112 mortos.
    Legislação trabalhista e ambiental frouxa, ausência de sindicatos e numerosa força de trabalho têm atraído cada vez mais fábricas com uso intensivo de mão de obra a Bangladesh, Índia e outros países asiáticos pobres. Muitas são transferidas da China, cujo salário mínimo progride paulatinamente.
    O Brasil, onde trabalhadores bolivianos já foram flagrados em situação semelhante, também é cliente de Bangladesh. No ano passado, as importações desse país foram de US$ 186 milhões, um aumento de 19% em relação a 2011 -quase tudo em produtos têxteis.
    Sob críticas de organizações não governamentais e governos estrangeiros, algumas empresas anunciaram o fim de sua produção em Bangladesh. Temendo perder milhões de empregos, Daka tem exortado companhias multinacionais a continuar no país e promete aprimorar a fiscalização.
    O ideal seria que as empresas estrangeiras e seus consumidores pressionassem fornecedores de Bangladesh a melhorar as condições de trabalho e os salários. Tais avanços, contudo, encareceriam a produção, solapando o principal atrativo do país asiático.

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