sexta-feira, 14 de junho de 2013

Linha Vermelha - Eduardo Almeida Reis

O banditismo corre solto no país inteiro e não é por culpa do brasileiro nem da frouxidão de nossas leis: deve ser culpa é da espécie humana, que não vale nada 


Eduardo Almeida Reis

Estado de Minas: 14/06/2013 

A polícia do Rio ocupou mais duas favelas visando instalar UPPs, unidades de polícia pacificadora, de olho na Copa e nas Olimpíadas. As favelas ficam em torno do estádio do Vasco e ao lado da Linha Vermelha, via de acesso à cidade para quem usa o aeroporto do Galeão ou chega de Minas e das serras fluminenses. Numa próxima etapa, é intenção das autoridades “pacificar” o Complexo da Maré, conjunto de favelas vizinhas da Linha Vermelha.

Sempre que alguém fala das favelas cariocas, paulistanas, belo-horizontinas, soteropolitanas, manauaras e outras, faz questão de afirmar que os bandidos que as dominam são pouquíssimos e que 99,7% delas todas são compostas de pessoas ordeiras, honestas e trabalhadoras.

Se é assim, sugiro que o país inteiro seja transformado numa favela, considerando que o número de pessoas ordeiras, honestas e trabalhadoras nos bairros considerados “nobres”, é muitíssimo menor que os tais 99,7%. O banditismo corre solto no país inteiro e não é por culpa do brasileiro nem da frouxidão de nossas leis: deve ser culpa é da espécie humana, que não vale nada.

Espécie como um todo, o que não impede a existência de gente da melhor supimpitude. Por exemplo: os leitores do grande jornal dos mineiros. Nasci e morei no Rio quando a “nobre” Zona Sul só tinha duas grandes favelas: Praia do Pinto e Catacumba. A hoje imensa Rocinha era, pasme o leitor, parte do circuito das corridas de Fórmula 1. Surgiu por lá um dos primeiros motéis, o Trampolim do Diabo, alusão ao trecho do circuito automobilístico, estabelecimento que dispensava a apresentação de carteira de identidade e certidão de casamento. Pois é: no Centro da cidade havia hotéis modestos que exigiam certidão de casamento.

Não me canso de contar cena que vivenciei diversas vezes: em imensos cavalos da Hípica, passávamos por dentro da Praia do Pinto e a reação dos favelados era de admiração pelo tamanho e aspecto dos cavalos. Vindos do interior, não conheciam cavalos imensos e a tevê não existia nem no Rio. Assim como não havia o ódio que se vê hoje. E não foi há milênios, mas ainda outro dia.

Esse fato desmente, em parte, minha afirmação de que a espécie humana é bela porcaria, mas aí entra o depoimento do professor Napoleon Chagnon, o mais famoso antropólogo vivo, que estuda os ianomâmis desde 1964 e prova que a espécie humana é mesmo de lascar: os ilustres silvícolas, ainda na Idade da Pedra, se drogavam e se matavam com um entusiasmo de fazer inveja aos piores traficantes das favelas “pacificadas”.


Tá maus!
Caderno Prosa, O Globo, 18/5/13, primeira página, anúncio da NAU Editora, PUC Rio: “Autobiografias: verdades ou ficções? Em Devires autobiográficos, Elizabeth Muylaert Duque-Estrada (doutora em Letras, PUC Rio) discute a formação do ‘eu’ a partir da escrita autobiográfica. Para o professor de teoria da literatura da Uerj Gustavo Bernardo, ‘esse livro já nasce clássico, fazendo-se obrigatório em qualquer estante de quem deseje pensar o sujeito moderno, a subjetividade contemporânea e, enfim, a si mesmo’”.

Em matéria de idioma português, recorro a Sócrates (469–399 a.C.) para dizer que “só sei que nada sei”. Escrevo de ouvido, mas desejo pensar o sujeito e a sujeita modernos. Acho impossível que um professor de teoria da literatura tenha escrito o texto que lhe foi atribuído no anúncio do livro de Elizabeth.

Que, por falar em português, zapeando o televisor acabo de ouvir o pândego pastor Malafaia criticando os “esfameados”. Como não nasci ontem nem trasantontem, fui ao verbo esfaimar e descobri que vem do português antigo esfamear (derivado de fame forma antiga de fome), pela forma metatética *esfaemar em que -e- > -i- > esfaimar.

Donde se conclui que é um perigo criticar certos pastores. De repente, existe “esfemeado” para aqueles famintos de mulheres, como o piedoso pastor Marcos Pereira, proprietário da Adud, Assembleia de Deus dos Últimos Dias, que passou alguns dos últimos dias na cadeia depois de estuprar uma porção de crentes.


O mundo é uma bola

14 de junho de 1897: o exército de Napoleão Bonaparte derrota o Exército russo na Batalha de Friedlândia, atual Pravdinsk. Em 1846, fundação do estado norte-americano da Califórnia. Em 1900, o Havaí se torna parte dos Estados Unidos. Em 1940, durante a Segunda Guerra Mundial, o Exército alemão invade Paris. Fosse hoje, os alemães encontrariam por lá um monte de jornalistas mineiros.

Em 1965, Paulo VI cria a Diocese de Itabira, terra de gente da melhor supimpitude. Em 1966, o Vaticano anuncia a abolição do Index Librorum Prohibitorum, o Índice de Livros Proibidos, no que obrou muito mal. Há livros, e não são poucos, tão chatos, que devem ser proibidos. Em 1982, termina a Guerra das Malvinas com a rendição dos argentinos em Port Stanley.

Em 1801 nasceu o paleontólogo dinamarquês Peter Wilhelm Lund, o nosso doutor Lund, que morreria em 1880. Em 1832 nasceu o engenheiro alemão Nikolaus Otto, inventor dos motores de ciclo Otto. Em 1977, nasceu a linda Camila Pitanga. Hoje é o Dia Mundial do Doador de Sangue.


Ruminanças

“Como os tempos mudaram! Há 20 anos, ser bicha, só muito escondido. E machão nem precisava disfarçar.” (Millôr Fernandes, 1923-2012)

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