Atriz Maria Ribeiro, integrante do 'Saia Justa', encara a 'patrulha' ao falar o que pensa
A atriz Maria Ribeiro, 37, já avisou à analista que a atende há 17 anos, duas vezes por semana. Se um dia ela lhe der alta, não vai aceitar. "Amor, não viveria sem análise. Acho que deveria ter no SUS [Sistema Único de Saúde], é muito importante", diz. "Tem gente que fala: 'Mas isso é uma muleta'. Sim, amor. Chocolate também é. Preciso de muletas pra viver."
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Os anos no divã a fazem ver com clareza que há um preço a pagar quando diz o que pensa. Ainda mais na televisão, na frente de milhares de pessoas, como faz desde março no "Saia Justa", do canal pago GNT. "Estou bancando desagradar", diz à repórter Lígia Mesquita.
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No camarim da produtora onde grava a atração, em SP, carrega uma sacola reciclável com três jornais, três revistas e um caderno cheio de anotações. Enquanto folheia uma das publicações, salta à vista o dedo envolto em um bandeide. "Quebrei a unha escalando uma pedra com meu filho. Coloquei Super Bonder, mas não adiantou", diz, antes de entrar no estúdio com as colegas Astrid Fontenelle, Barbara Gancia e Mônica Martelli.
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O tema do "Saia" daquele dia era intolerância. Maria revela que julga muito pela aparência e que já teve preconceito ao ver a empregada de shortinho. E diz achar "uma pena que na nossa dramaturgia não haja casais de velhos, só de jovens", como o de idosos do filme "Amor", do diretor Michael Haneke.
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Mas ela tem noção de que é arriscado bancar algumas opiniões em tempos de patrulha nas redes sociais. "Tem muito patrulhamento. Fico dividida entre falar 'caramba, não tô nem aí, acho isso uma caretice' e querendo ser querida", afirma. "Ator ama ser querido. Às vezes fico com uma rebordosa do que falei, mas não dá pra ficar com o freio de mão puxado."
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A atriz acha "irritante" o fato de muitos colegas não opinarem sobre nada. "As pessoas que eu admiro falam o que pensam. E eu não sou tão importante assim, não me levem tão a sério. Senão você começa a acreditar que sua opinião importa mais do que outra." Para ela, muitos se calam por causa de interesses comerciais. "As pessoas pensam: 'Não vou falar porque não vou agradar'. Cara, sou atriz, não um produto."
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Seu trabalho como atriz pode ser visto atualmente na série "Copa Hotel", também do GNT, que já tem segunda temporada confirmada. E se prepara para começar a ensaiar a peça "Os Irmãos Karamázov", ao lado do marido, o ator Caio Blat.
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Maria ainda arranja tempo para dois projetos cinematográficos. A atriz de "Tropa de Elite" finaliza agora a edição de seu segundo documentário, sobre a banda Los Hermanos --o primeiro foi "Domingos" (2011), em que fala do diretor, ator e dramaturgo Domingos de Oliveira.
A atriz Maria Ribeiro finaliza filme sobre Los Hermanos
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A atriz Maria Ribeiro integra o programa "Saia Justa" (GNT) desde março
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Ela também está escrevendo um roteiro de ficção: a história de uma garota filha de exilados brasileiros na França que busca suas origens. "Quero ter mais domínio de todas as etapas de trabalho, do processo criativo todo. Quero ser o Domingos. Mais alto ainda, o Woody Allen, um cara que atua em suas próprias coisas."
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Mas não descarta voltar a fazer folhetins. "Me dá um pouco de irritaçãozinha quando um ator fala: 'Agora não quero mais fazer novela'. Eu ralei tanto pra chegar aonde cheguei. Eu quero que me chamem pra novela, que tirem foto comigo na rua", diz. Ela foi do elenco da Record até o fim de 2012.
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Sem contrato com nenhuma emissora de canal aberto, diz que dá para viver assim. "Não dá pra viajar de [classe] executiva, nem ter bolsa Louis Vuitton. Mas vivo muito bem." De uma família de classe média alta do Rio, conta que já gastou R$ 3.000 num mês em roupas nacionais. "Não tenho essa parada [fetiche] com marca gringa." Hoje, afirma se divertir comprando na Zara.
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Quando a gravação do "Saia" termina, ela vai para a mesa com comidinhas. "Minha barriga está roncando." Pega um pedaço de torta de ricota e toma suco de pêssego. Confere o celular. "Estou viciada nessa merda, em ficar conectada."
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Interrompe a conversa porque precisa ir para o aeroporto. O filho caçula, Bento, 3, do casamento com Blat, está com uma virose. Ela também é mãe de João, 10, do relacionamento com o ator Paulo Betti, 23 anos mais velho. "Paulo achava um mico ser casado com uma mulher muito mais nova. E eu achava cafona uma mulher de 20 com um cara de 40, mas me apaixonei perdidamente. E aí?"
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Maria não gostaria que os herdeiros seguissem a mesma carreira abraçada pelos pais. "Preferia que eles fossem médicos, ou escritores", diz. "Acho que hoje virou algo 'mega yeah' ser artista. É perigoso você acreditar [que tem tanta importância], ficar mal ou bem por estar ou não fazendo sucesso. Mas o sucesso é você."
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A conversa da atriz com a coluna é retomada duas semanas depois, em um domingo à noite. Dessa vez, no restaurante Spot, em SP. Ela está no local confraternizando com as colegas do "Saia Justa". Toma uma taça de vinho tinto e pede uma terrine de queijo de cabra e cogumelos.
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Tira da mochila o laptop para mostrar um trecho promocional do filme "Los Hermanos - Esse É Só o Começo do Fim da Nossa Vida" (título provisório). Ela pretende apresentar o longa no Festival do Rio, em setembro.
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Assim que o vídeo começa a rodar e sobe o som dos primeiros acordes da música "O Vencedor", cantarola um trecho: "Olha lá, quem vem do lado oposto/ vem sem gosto de viver/ Olha lá, que os bravos são/ Escravos são e salvos de sofrer".
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Na tela, os músicos estão em ação em um dos shows da turnê de aniversário de 15 anos da banda, que ficou anos sem tocar. A atriz foi a dez apresentações em sete cidades. Só ela e mais um câmera captaram todas as imagens. Dos R$ 60 mil que custou a produção, bancou metade. A outra parte teve como investidor um amigo.
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"Fiquei três anos atrás deles pedindo para fazer entrevistas, mostrar cenas de shows. Quando eles anunciaram a turnê de volta, tentei de novo, falei com o [Marcelo] Camelo, e eles toparam", conta. "No fundo, falar desses caras, dos Hermanos, é falar sobre mim, da passagem do tempo. Mostrar até que ponto é possível continuar fazendo o que você acredita à medida que vai se profissionalizando e o tempo passa."
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Aos 37, acha que o tempo tem sido um bom aliado. "Fui totalmente infeliz jovem, era muito angustiada. Agora já sei quem eu sou, que tem coisas que não sou capaz de fazer. Sei que não vou à Índia, não vou à praia. Me cobro muito menos", afirma.
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Moradora do Itanhangá, na zona oeste do Rio, ela diz que é "anticarioca". "Odeio praia, odeio calor, odeio o jeito descompromissado dos cariocas", diz. Mas, quando vai à praia, não é "aquela mulher seguríssima com o corpo".
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Há três anos, ela declarou em uma entrevista à revista "TPM" que queria ser gostosa. Mas seu projeto não foi adiante.
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"Não dou tanta importância pra malhação, senão eu fazia", afirma. "Morro de inveja de quem sai pra comer e pede só uma saladinha. Agora, tô querendo voltar a ser inteligente."
Mônica Bergamo, jornalista, assina coluna diária publicada na página 2 da versão impressa de "Ilustrada". Traz informações sobre diversas áreas, entre elas, política, moda e coluna social. Está na Folha desde abril de 1999.
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