Ana Clara Brant
Estado de Minas: 05/07/2013
Paraty
– É a cachorra Baleia que tem dado as boas-vindas ao público e aos
convidados na 11ª Festa Internacional Literária de Paraty (Flip), que
desde quarta-feira vem celebrando os livros, as palavras, os escritores e
afins. Um desenho da inesquecível personagem de Vidas secas, clássico
de Graciliano Ramos, o homenageado deste ano, estampa a Tenda dos
autores, ponto das principais atrações do evento na cidade fluminense. É
ali que se tem debatido não só literatura, mas artes como música e
cinema, e manifestações que vão além do discurso literário, como
arquitetura, pintura e história.
Os protestos que pipocaram
Brasil afora nas últimas semanas também têm feito parte das discussões. E
o fato de a obra de Graciliano estar associada à crítica social acabou
por intensificar a presença da política no evento, como lembrou o
escritor amazonense Milton Hatoum, na conferência de abertura da Flip,
na noite de quarta-feira. O curador do evento, o jornalista Miguel
Conde, também destacou o fato de essa edição acontecer num momento
politicamente especial, em que várias manifestações ocorrem pelo país. A
onda de protestos inspirou uma programação extra, que será composta por
três debates. “Desde que a Flip foi criada, em 2003, ela combina
celebração e reflexão. Se esse momento político traz pelo menos alguns
motivos de alegria, ele também exige um esforço redobrado de
pensamento”, disse.
Alguns participantes, como o ex-ministro
Gilberto Gil – que chegou a citar as manifestações e deu até uma
alfinetada na Copa do Mundo durante o show de abertura –, o crítico e
historiador britânico T. J. Clark, que analisa há décadas a relação
entre arte moderna e política, e Tamim al-Bargouti, poeta e cientista
político egípcio, também mostram o viés político da edição. Está
prevista para amanhã manifestação durante o evento, a Occupy Paraty, que
segundo os organizadores não tem nada contra a Flip, mas quer mostrar
sua inquietação por um Brasil mais justo.
POESIA
Uma das atividades mais esperadas, e que está com os ingressos
esgotados, é a que traz Cleonice Berardinelli, tida como a mais
importante estudiosa de Fernando Pessoa no Brasil, e a cantora Maria
Bethânia, que tem integrado versos de Pessoa em seus espetáculos e
discos há mais de quatro décadas.
Mais uma baixa na
programação da Flip 2013. Depois do escritor francês Michel Houellebecq,
que pela segunda vez cancelou sua vinda ao evento, o escritor norueguês
Karl Ove Knausgård, que participaria da mesa Ficção e confissão, também
não virá, alegando motivos pessoais. No seu lugar entrou o mexicano
Juan Pablo Villalobos.
Literatura ganha novas pesquisas
Como
vem ocorrendo há algumas edições, o Instituto Itaú Cultural promoveu o
encontro Movimentos Atuais da Literatura Brasileira, em que apresentou
pesquisas inéditas na área dos estudos literários. A doutoranda em
literatura pela Universidade de Brasília (UnB) Laetícia Jensen pesquisou
os autores mais citados da produção literária no país. De um total de
477 autores citados em trabalhos acadêmicos, 78,4% são homens e 21,6%
são mulheres. Entre os homens, o primeiro é Machado de Assis, seguido de
Guimarães Rosa e Graciliano Ramos. Já entre os escritores vivos, a
lista é encabeçada por Milton Hatoum, Rubem Fonseca e Manoel de Barros.
Outro
trabalho apresentado foi o de João Cezar de Castro Rocha, professor de
literatura comparada da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj),
que analisou o cenário de estudos da literatura brasileira no exterior.
Entre os destaques está o novo perfil do brasilianista, que, hoje, é
composto por brasileiros que moram fora. “Esse é um dado curioso e, além
disso, pesquisamos os autores mais estudados. Quem está no exterior
incorpora de uma maneira muito mais expressiva os representantes da
nossa literatura contemporânea”, observou.
O assunto de
Felipe Lindoso, jornalista e antropólogo, foi o crescimento do número de
eventos literários, principalmente festas e feiras de livros, indústria
editorial e profissionalização de autores. Em fase final de conclusão,
ele já assinala que o circuito de feiras do livro da Fundação Biblioteca
Nacional registra, até o momento, 261 feiras, encontros literários ou
similares, em praticamente todos os estados, sendo que o Rio Grande do
Sul se destaca nesse panorama, com 130 municípios (26% do total do
estado) com feiras ou encontros.
Outro estudo apresentado, de
Fábio Malini, professor de jornalismo da Universidade Federal do
Espírito Santo, propõe um rastreamento inédito dos perfis, sites e temas
literários mais influentes na rede. “O impacto das redes sociais, no
consumo, distribuição e troca de trabalhos literários ainda não foi
mensurado. Essas metamorfoses trazem novos públicos, espaços de
circulação da literatura e mediadores que transformam a obra literária
de diferentes escritores em discursos hipermediatizados que são
espalhados pela internet, fazendo de alguns deles celebridades da web”,
frisou.
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