quinta-feira, 11 de julho de 2013

Tendências/Debates

folha de são paulo
aRNALDO NISKIER
TENDÊNCIAS/DEBATES
Paixão pela leitura
A vida e a obra de Guimarães Rosa foram ambas muito ricas. Daí o acerto da lembrança nas bem-sucedidas maratonas escolares
Um fato em educação não admite sofisma: os alunos que, desafiando as dificuldades, escrevem melhor são os que mais leem.
Não se conhece uma pesquisa nacional confiável sobre essa verdade, mas se considerarmos os resultados das maratonas escolares, promovidas por secretarias de Educação, isso pode ser revelado, com uma indisfarçável ponta de otimismo. Quanto mais, melhor. É o começo da paixão pela leitura.
No Rio de Janeiro, a Secretaria municipal de Educação realiza pela quinta vez consecutiva a sua maratona escolar. Depois de Euclides da Cunha, Rachel de Queiroz, Erico Verissimo e Ariano Suassuna, chegou a vez de trabalhar a vida e a obra de Guimarães Rosa.
A secretária Claudia Costin, na Academia Brasileira de Letras (parceira do empreendimento), recordou que, ao dirigir o Círculo de Leitores em São Paulo, trouxe jovens alunos de favelas de São Bernardo do Campo para a capital, para que pudessem melhor se inteirar da obra do autor de "Grande Sertão: Veredas".
Concluiu que os resultados, em termos de motivação para a leitura, foram verdadeiramente excepcionais. Confia na repetição desse êxito, agora em outra capital.
Essa preocupação oficial, em termos culturais, integra o programa Uma Cidade de Leitores, voltado para alunos de oitavo e nono anos do ensino fundamental e da educação de jovens e adultos (EJA).
Os estudantes ouvem palestras de acadêmicos sobre Guimarães Rosa, podendo com eles tirar dúvidas porventura existentes. Depois, farão redações sobre qualquer obra do escritor de Cordisburgo (MG), nascido em 1908 e que viveu uma dramática experiência com a Academia Brasileira de Letras.
Não queria se candidatar. Temia pela emoção que isso poderia representar. Vencido pela insistência de amigos, entre os quais se incluía Pedro Bloch, cedeu e aceitou o pleito. Venceu, mas adiou a posse por quatro anos, fato inédito, até que em 1967 resolveu assumir a sua cadeira. Fez um bonito discurso, muito aplaudido. Morreu quatro dias depois, confirmando a sua premonição.
Os contos e romances de Rosa, como era conhecido, ambientaram-se quase todos no sertão brasileiro, que ele conhecia pessoalmente de diversas visitas, empunhando o seu caderninho de notas. Registrava expressões próprias, que se tornaram o hit das suas obras. Elas ultrapassaram o regionalismo tradicional, para se tornar universais.
Daí a existência de inúmeras traduções para diversos idiomas, tarefa que aparentemente parecia impossível de ser executada. As suas veredas ganharam o mundo.
Guimarães Rosa foi também médico e um diplomata aplicado. Em companhia de sua mulher, Aracy, na Segunda Guerra Mundial, ajudou a salvar a vida de inúmeros judeus perseguidos pelo nazismo. Era cônsul-adjunto em Hamburgo. Teve uma vida e uma obra muito ricas, daí o acerto da lembrança nas bem-sucedidas maratonas escolares.
    EDUARDO DE CARVALHO ANDRADE
    TENDÊNCIAS/DEBATES
    Oportunidade desperdiçada?
    Manter efetivamente o centro da meta em 4,5% e reduzir o intervalo já sinalizaria uma menor leniência com a inflação
    O governo decidiu manter, para 2015, a meta de inflação de 4,5% com um intervalo de 2 pp (pontos percentuais) para cima ou para baixo, que vigora desde 2006. Mas ele poderia ter aproveitado essa oportunidade para realizar ajustes graduais de forma a recuperar sua credibilidade e ancorar as expectativas futuras de inflação.
    O governo luta para evitar que a inflação ultrapasse o limite superior de 6,5% do regime de meta de inflação. A oposição utiliza o surto inflacionário para enfraquecer politicamente a presidenta. O fato é que a credibilidade do governo para enfrentar a subida dos preços está abalada e ele deveria implementar mudanças no atual regime de metas para tentar recuperá-la.
    A primeira mudança seria reduzir o intervalo da meta de inflação, de 2 pp para 1 pp. Dessa forma, mantido o centro da meta de 4,5%, a inflação em 2015 deveria ficar entre 3,5% e 5,5%.
    No passado, o argumento para defender a utilização de intervalos tão elásticos estava no fato de o Brasil ser um país em desenvolvimento e, portanto, estar sujeito a choques externos fora do seu controle. Nesse sentido, seria importante permitir maior flexibilidade.
    Esse argumento hoje é pouco convincente. Todos os outros cincos países da América Latina que utilizam o regime de metas de inflação utilizam um intervalo de somente 1 pp para cima ou para baixo. Isso inclui países com um grau de abertura comercial maior que o Brasil, como o Chile e o México. Nenhum país desenvolvido que utiliza o regime de metas de inflação tem um intervalo superior a 1 pp.
    Outra justificativa para a mudança é que o Brasil já opera com um intervalo menor. Na prática, o centro da meta não é 4,5% e o governo tenta impedir que a inflação ultrapasse o limite máximo de 6,5%. O objetivo parece ser uma inflação em torno de 5,5% com uma banda de 1 pp para cima ou para baixo.
    Manter o centro da meta de 4,5% e reduzir o intervalo já seria sinalizar uma menor leniência e contribuiria para diminuir a expectativa de inflação para 2015, facilitando o trabalho do governo.
    A segunda mudança seria inovar e antecipar as metas para todos os anos do próximo governo, mantendo os 4,5% em 2015 e terminando com 3% em 2018. Ou seja, com uma redução de 0,5 pp em cada ano, com o intervalo de 1 pp para cima ou para baixo. É uma estratégia gradual, que consolida o regime de metas e o coloca mais próximo ao utilizado pelos demais países que o adotam.
    Assim, o Brasil passaria a ter o mesmo regime atualmente usado por seus vizinhos Chile, México e Colômbia que, a propósito, reduziu a sua meta mesmo depois da crise de 2008. Além disso, se aproximaria dos países desenvolvidos, que utilizam um centro da meta de 2%.
    Como valem para depois de 2014, as mudanças afetariam o espaço de manobra da política econômica do futuro presidente. As combinações possíveis de políticas monetária e fiscal são diferentes com uma meta de inflação menor.
    A presidenta Dilma poderia adotar uma posição de estadista e convidar os principais partidos de oposição a se comprometerem com essas mudanças, aos moldes do que Fernando Henrique Cardoso fez quando assinou o acordo com o FMI em 2002. Ao propor essas medidas e contar com o aval da oposição, a atual presidenta tiraria a pecha de ser leniente com a inflação.
    Como os ajustes propostos são graduais, eles não exigiriam políticas monetárias extremamente ortodoxas. Levar a inflação para 4,5% em 2015 não é uma tarefa muito demandante e não foge do tom do atual discurso do Banco Central. O mais importante, no entanto, é que o ganho de credibilidade com essas mudanças tornaria mais fácil e menos penoso qualquer ajuste para reduzir a inflação.
    Não é de todo impossível que, como resultado desse ganho de credibilidade, a taxa de juros necessária para trazer a inflação gradualmente para 3% em 2018 seja menor do que aquela necessária para mantê-la ao redor de 4,5% sem o proposto choque de credibilidade.
    Caso o governo não queira, cabe à oposição assumir a liderança e propor as mudanças.

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