Na dependência da matéria exibida, tiro o som e fecho os olhos
Eduardo Almeida Reis
Estado de Minas: 01/08/2013
Fico imaginando
como deve ser a vida de um fazendeiro em 2013 morando na roça e ligado
ao mundo “em directo”, como se diz em Portugal. Conheci o Pantanal sem
telefones e parabólicas, com a só ligação do rádio comercial para
comunicação, em horários fixos, com a cidade mais próxima, distante hora
e meia de voo em teco-teco. Também existia o radioamador, que dependia
de prefixo na Labre, Liga de Amadores Brasileiros de Rádio Emissão.
Mais
tarde, conheci as roças em que os jornais de hoje chegavam na manhã
seguinte trazidos pelo caminhão do leite. A televisão, mesmo na
velocidade da luz, chegou devagarinho em preto e branco, ligada na
bateria do automóvel, antenas distantes centenas de metros com um
negócio chamado booster, sinal chuviscado que era uma bosta. Ainda na
década de 70, a glória: energia elétrica, tevê em cores e telefone DDD.
Não
havia celular na roça de 1990, hoje servida por diversas operadoras,
ruins umas, toleráveis outras – e televisor LED, ótimo sinal, em directo
com o planeta, preços do leite acima de um real, quase cinquenta
centavos de dólar americano.
Teriam melhorado? Tenho as minhas
dúvidas. No princípio dos anos 70, produzindo leite tipo-B, deduzidos
carreto e Funrural, recebi doze centavos de dólar por litro. Doze, pela
matemática que nos ensinavam na escola, é a quarta parte de que se
recebe hoje, mas o dólar de 2013 não chega aos pés daquele de 1970. O
cálculo deve ser difícil, mas sou capaz de apostar que os centavos de
hoje são parecidos com os doze daquele tempo, se não forem piores para o
mesmíssimo leite tipo-B. Ainda assim, meus amigos que mexem com leite
estão animados, porque produzir leite nunca foi negócio, é vício, que
vicia tão depressa quanto a coca e a heroína, tendo a virtude de não
matar.
Telespectador
Escrevo às 21h37
minutos de uma sexta-feira, depois de desligar o televisor da sala. Ando
preocupado com as minhas reações enquanto telespectador e peço ao
leitor que não critique o “enquanto”, que já vi nos textos de muita
gente boa, inclusivamente no padre Vieira.
Faz tempo que tiro o
som quando aparecem presidentes petistas falando. Evoluí, recentemente,
para tirar o som quando aparecem comentaristas decentes relatando o que
disseram os petistas em Brasília ou na reunião do Mercosul.
Na
dependência da matéria exibida, tiro o som e fecho os olhos. Não deixa
de ser original, posto que preocupante, ficar diante de um televisor LG
LED de 47 polegadas sem som e de olhos fechados. Explico: falta-me
estrutura emocional para ver, dezenas de vezes, foto da menina de 14
anos que teria sido estuprada por quatro funcionários de um parque de
diversões. Estuprada e morta, funcionários que teriam voltado no dia
seguinte para transar com o cadáver, se bem que o sêmen encontrado nas
roupas e partes pudendas da adolescente não coincida com o material
colhido dos quatro acusados, que já foram soltos.
Duas, três,
trinta vezes exibiram os vídeos em que o funkeiro MC Daleste foi abatido
a tiros de pistola ou revólver, considerando que os ferimentos não
parecem de tiros de fuzil. Parei nas trinta vezes e passei a tirar o som
fechando os olhos, depois de ouvir um apresentador dizer que o tiro
coincidiu com o flash de um fotógrafo, aventando a hipótese de o
fotógrafo clicar de propósito no exato momento do tiro. Nem Cartier
Bresson, Capa e Jean Manzon, em seus melhores dias, seriam capazes de
feito semelhante. E o negócio vai por aí.
Sinto funda saudade do
tempo em que, sozinho na roça fluminense com as meninas estudando na
cidade, pela quinta ou sexta dose de Something Special, for someone
especial, discuti com o Cid Moreira e com o meu amigo Sérgio Chapelin,
durante o Jornal Nacional, sempre que diziam: “Dentro de um minuto você
vai ver”. Da cadeira de balanço com vista para o gramado iluminado, no
clima admirável do Vale do Paraíba, uísque e gelo no copo, respondi:
“Vou ver se quiser. Vocês não mandam em mim”.
O mundo é uma bola
1º
de agosto de 1291: a Suíça declara sua independência da Aliança Eterna e
forma uma confederação composta pelos cantões de Uri, Schwyz e
Unterwalden. Em 1714, sobe ao trono Jorge I da Grã-Bretanha. Ele era
também o Erzbannerträger e príncipe-eleitor do Sacro Império Romano
Germano e não falava inglês, comunicando-se em seu alemão nativo, o que
demonstra que o Brasil não inventou esse negócio de governante máximo
não se expressar no idioma nacional. Nos últimos anos do reinado de
Jorge I, o poder de fato esteve nas mãos de seu primeiro-ministro Robert
Walpole.
Em 1808, com o desembarque do duque de Wellington em
Portugal, começa a intervenção britânica na Guerra Peninsular. Em 1834,
abolição da escravatura no Império Britânico.
Hoje é o Dia Nacional do Selo e o Dia do Poeta Cordelista.
Ruminanças
“Se soubéssemos como nosso corpo é feito, não ousaríamos fazer um movimento” (Flaubert, 1821-1880).
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