Vem acontecendo no planeta gay algo que ocorria no mundo hétero durante o boom da bolsa de 1970/71
Eduardo Almeida Reis
Estado de Minas: 10/08/2013
O mundo inteiro acompanhou a declaração
de Daniela Mercury sobre a jornalista Malu Verçosa, sua esposa: “É o meu
amor, a minha inspiração, a minha vida”. Portanto, começa a fazer
sentido o entusiasmo que famosa lésbica americana, de nome italiano,
sempre demonstrou pela baiana, mesmo quando casada à antiga com um
cavalheiro do sexo masculino. Declaração que foi vivamente festejada
pelos “famosos”, com ênfase para os ex-BBBs, que no Brasil de hoje a
condição de BBB e ex-BBB dá um prestígio que não têm, na França, os
membros de L’Academie.
Vem acontecendo no planeta gay algo que
ocorria no mundo hétero durante o boom da Bolsa de 1970/71. Naquele
tempo houve separação de casal muito famoso, riquíssimos ela e ele,
família dela respeitadíssima, família dele conhecida como grande
ganhadora de dinheiro.
Antes de assentada a poeira da separação
bilionária, a desquitada passou a namorar jovem conquistador apelidado
Coelho. Desquitada, sim: o divórcio no Brasil data de janeiro de 1980.
Coelho era sócio de uma corretora de valores e operava, com os outros
três sócios e 16 funcionários, imensa mesa de open. Os 20 pendurados nos
telefones aos berros, fazendo negócios de milhões, pois ainda não havia
monitores de computadores.
Até o governo operava no black –
mercado negro, câmbio paralelo, mercado paralelo –, o que fez surgir o
comentário sobre as estranhezas do Brasil, comento modificado com o
passar dos anos. Dizia-se, então, que neste país assaz tropical “puta
goza, gigolô tem ciúmes e governo opera no black”.
Deu-se que o
Coelho começou a contar que namorava a senhora recém-separada, que
telefonou, furiosa, para a corretora, às onze da matina, hora em que a
mesa de open fumegava. O namorador tapou o bocal do seu telefone e
gritou: “Pessoal, linha 135”. Os dezenove operadores entraram na linha
135 a tempo de ouvir a descompostura que ela passava no rapaz, que se
defendia: “Mas, Fulana, transar é tudo igual; o bom é contar”.
Nesse
mesmo dia, almocei no Rio com um dos operadores, bom amigo, que me
contou do telefonema. Hoje vejo que o planeta gay adotou a divisa do
Coelho: não basta namorar, o bom é contar, como fez a cantora baiana.
Ainda bem que Ivete, minha musa, gosta muito do marido.
Historieta
É
voz corrente que ele não aceita desaforo e é certo que não tem pátria,
vergonha, caráter. Por ele, que não tem cara, quase todas as pessoas, em
todos os países, fazem os piores papéis: brigam, enganam, furtam,
roubam, matam, corrompem e são corrompidas. Daí a admiração que sempre
tive pelo irmão do doutor Alberto, que me contou o caso.
Família
de classe média alta em Ipanema, no Rio dos anos 50. Quando completou 18
anos, o irmão do doutor Alberto arranjou logo três empreguinhos,
trabalhou feito um mouro durante seis meses, juntou uns cobres, que hoje
talvez correspondessem a R$ 10 mil, reuniu a família, despediu-se
filial e fraternalmente de cada um e anunciou: “Vou pescar”.
Gastou
as economias na compra do material de pesca e se mandou para Angra,
então muito próxima do fim do mundo. Construiu um rancho modestíssimo,
pendurou rede e mosquiteiro, viveu ali até morrer muitos e muitos anos
mais tarde.
Como era inteligente e divertido, vivia sendo
convidado para jantar, passear de barco e pescar com os milionários que
tomaram de assalto aquele trecho do litoral fluminense. Aceitava os
convites e os drinques, jantava, passeava de barco, pescava e voltava
para dormir em seu rancho. Viveu décadas da venda dos peixes que
fisgava: dava para comprar sal, óleo, aguardente e cigarros.
Ali
por volta de 1970, com a morte de seus pais, herdou dois bons
apartamentos em Ipanema. Avisado pelo irmão, declarou: “Não quero, não
preciso de dinheiro e não vou ao Rio. Pode trazer o tabelião, que assino
abrindo mão dos apartamentos para vocês”.
Assim se fez;
tabelião, livro, testemunhas no rancho angrense, desistência da herança
com firma reconhecida. Mesmo sem precisar dos apartamentos, que recebeu
junto com os outros irmãos, o doutor Alberto sempre chorava ao contar o
caso do irmão. E tinha por ele, o pescador de Angra que não ligava para
dinheiro, uma admiração que nunca teve pelos outros irmãos, empresários
bem-sucedidos, profissionais liberais famosos no Rio.
O mundo é uma bola
10
de agosto de 1500: após dobrar o Cabo da Boa Esperança, Diogo Dias,
descrito por Pero Vaz de Caminha como “homem gracioso e de saber”,
descobre uma ilha a que deu o nome de São Lourenço, mais tarde chamada
Madagáscar. Em 1519 Fernão de Magalhães parte de Sevilha para a primeira
viagem de circum-navegação. Morreria flechado nas Filipinas, coitado.
Em 1792, começa em Paris a Jornada de 10 de Agosto, que culminaria na
Revolução Francesa. Sempre ouvi dizer que a revolução começou em 1789.
Parece que a Jornada de 10 de Agosto resultou na Primeira República
Francesa em setembro de 1792. Não tenho tempo de esmiuçar o assunto e o
leitor, felizmente, se lixa para a Revolução Francesa.
Ruminanças
“Os republicanos não são todos ladrões, mas todos os ladrões são republicanos” (Gustave Flaubert, 1821-1880).
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