Luciane Evans
Estado de Minas: 26/11/2012
Não é nenhum exagero afirmar que a biografia de quem sofreu um golpe dentro do peito será narrada sempre com um “antes” e um “depois” do infarto. Quem já passou por isso tem a sensação que o coração nunca mais vai ser o mesmo, pois mais parece um lutador baqueado. Mas a ciência não quer que nessa luta a toalha seja jogada. E por isso está na busca pela “chave” capaz de reparar um coração machucado. É por meio de pesquisas com células-tronco que pesquisadores brasileiros têm experimentado terapias celulares que poderão recuperar mais rápido esse órgão vital, deixando-o mais forte e com mais vigor. Antenada no assunto, a Universidade Federal de Uberlândia (UFU), no Triângulo Mineiro, está com dois estudos em andamento e promove, na quarta e quinta-feira, o I Fórum de Células-Tronco e Terapia Celular do Triângulo Mineiro, que vai reunir estudantes e docentes do Brasil inteiro para discutir os avanços, descobertas e entraves do tema na área da cardiologia.Na busca por um coração mais forte, a universidade mineira é a única do estado a participar de um esforço nacional de diversas unidades de saúde do país unidas pelo desenvolvimento da terapia celular. Chamada “Estudo Multicêntrico Randomizado de Terapia Celular em Cardiopatias (Emrtcc)”, a experiência teve o protocolo preconizado pelo Ministério da Saúde em 2005. O centro coordenador do projeto é o Instituto Nacional de Cardiologia de Laranjeiras, no Rio de Janeiro, e conta ainda com o apoio de 34 hospitais e institutos. O objetivo principal do grupo de pesquisas é avaliar a segurança e eficácia do implante autólogo (do próprio paciente) de células-tronco de medula óssea em 1,2 mil brasileiros com as seguintes doenças: infarto agudo do miocárdio, cardiopatia isquêmica crônica, cardiomiopatia dilatada e cardiopatia chagásica.
Em Uberlândia, o trabalho dos pesquisadores tem foco no primeiro caso. Desde de maio, a universidade avalia o potencial reparador das células-tronco da medula óssea em pessoas que sofreram infarto agudo do miocárdio. Segundo conta a enfermeira e mestranda do curso de pós-graduação em ciências da saúde da UFU Poliana Rodrigues Alves, até o momento três pacientes estão em teste. “Trata-se de uma pesquisa clínica e a previsão é de que em janeiro todo o estudo no país esteja pronto.” Quando uma pessoa infarta, faltam suprimentos sanguíneos de oxigênio e nutrientes para as células do coração, como explica a enfermeira. “Como é um músculo em alto funcionamento, ele requer muita oxigenação”, diz.
Nesse estudo da UFU, o próprio paciente é o doador das células-tronco, no chamado transplante autólogo. O procedimento, segundo explica Poliana, é feito até o sétimo dia depois do infarto. “Até o terceiro dia, são feitos os exames laboratoriais para conhecer qual vaso sanguíneo foi culpado pelo infarto. Caso haja mais de dois vasos entupidos, o que necessitaria de uma ponte de safena para desobstruí-los, o paciente não pode participar da pesquisa”, afirma Poliana, explicando que nesses casos, como serão colocados novos vasos, não há como haver a reparação celular (objeto de pesquisa da análise). Já angioplastia, que é feita para desobstruir a artéria, é permitida. “Além disso, o paciente tem que ter de 30 a 80 anos e não apresentar nenhuma comorbidade, como disfunção renal ou câncer, nem estar em outro estudo clínico ”, destaca.
Até agora, três pessoas se submeteram à pesquisa na UFU. Depois dos exames laboratoriais feitos em até três dias depois do infarto, esses pacientes passaram por uma punção na medula óssea, na qual foram retirados 100ml de sangue. “O material foi levado para a equipe de processamento de células. Nesse processo, são separadas as células sanguíneas das células monocleares (com um único núcleo) e com potencial para célula-tronco”, diz. As células são diluídas e são separado o plasma das hemácias do paciente. “Tudo tem que ser da pessoa, para que não haja rejeição”, avisa Poliana.
Para o tratamento do problema, o infartado se submeteu ao cateterismo cardíaco, no qual se introduziu um cateter pela coronária até o local onde está a obstrução, para que o fluxo do sangue se restabelecesse. “Foi feito, então, um novo cateterismo e injetados 10ml das células-tronco dentro do vaso que causou o infarto. Em 30 minutos, o paciente foi examinado, ficou 24 horas em observação e depois recebeu alta. De tempos em tempos, ele volta para avaliarmos se a força do coração aumentou”, conta Poliana.
EXPECTATIVA Com a técnica, a expectativa é de que haja uma melhora de 5% a 10% na vitalidade do órgão e de uma forma mais rápida. O estudo é duplo-cego: os médicos não sabem qual paciente recebeu placebo e qual recebeu a célula-tronco. “A esperança é de que a recuperação naqueles que receberam a injeção da própria célula-tronco seja mais rápida. Por enquanto, o que podemos dizer é que os que estão sendo testados passam bem e não tiveram, até agora, nenhuma decorrência.”
Enquanto Minas está nesse caminho, dentro do mesmo estudo outros estados também se desdobram para encontrar respostas na busca de um coração mais forte. Na Bahia, por exemplo, tem sido feito o experimento em pessoas que já sofreram o mal de Chagas. A expectativa é de que com os resultados haja uma nova alternativa para o Sistema Único de Saúde (SUS) como método terapêutico de rotina.
Quem pode participar do estudo
• Pacientes entre 30 a 80 anos
• Sem comorbidades
• Com até duas artérias entupidas.
DAQUI PARA O FUTURO » Células-tronco para animais infartados
Publicação: 26/11/2012 04:00
Animados com a participação no estudo nacional, os pesquisadores da Federal de Uberlândia reúnem na quarta e quinta-feira graduados, pós-graduados e docentes no I Fórum de Células-Tronco e Terapia Celular do Triângulo Mineiro, para o qual já se esgotaram as inscrições. Além da pesquisa em âmbito nacional, o setor de cardiologia da universidade está com outro investimento na área. Ainda em nível experimental e em parceria com outros estados, a análise foca o desenvolvimento de células-tronco no coração de animais previamente infartados. “Há três anos estamos fazendo esse trabalho, que consiste em retirar células-tronco de animais, como os camundongos, e multiplicá-las em laboratório, cultivando-as”, explica o coordenador médico do Centro de Pesquisa Clínica e Experimental da UFU, Elmiro Santos, alertando que quanto mais velho somos, menos células-tronco temos.
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