segunda-feira, 10 de dezembro de 2012

Cuidar dos médicos [Editorial]


EDITORIAIS - Folha de são paulo
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Cuidar dos médicos
É preocupante o resultado do exame de proficiência aplicado pelo conselho paulista de médicos aos alunos que se formam neste ano nas faculdades de medicina do Estado de São Paulo.
Nada menos que 54,5% dos futuros profissionais formados no Estado mais rico do país não acertaram nem 60% das 120 questões. São alunos que não dominam o conteúdo básico necessário para cuidar da saúde da população e, por isso, foram reprovados pelo Cremesp (Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo).
A constatação da inépcia de mais da metade dos formandos já seria razão suficiente para inquietação quanto à qualidade dos cursos de medicina. A situação, porém, é ainda mais perturbadora: a reprovação no teste não impede o exercício da profissão.
Longe de serem um caso à parte, os resultados deste ano apenas repetem um padrão assustador. Desde 2005, quando o exame foi aplicado pela primeira vez, o desempenho dos alunos tem sido pífio. Em 2008, por exemplo, o índice de reprovação chegou a 61%.
Apesar do histórico negativo, o médico Bráulio Luna Filho, coordenador do exame do Cremesp, contava com cerca de 70% de aprovação. Segundo ele, países como Canadá e Estados Unidos têm, em média, taxa de 95% de aprovação.
Talvez o coordenador do Cremesp imaginasse que o resultado de 2012 seria melhor porque, pela primeira vez, fazer a prova foi pré-requisito para o registro profissional. Antes, faculdades de prestígio, como USP e Unicamp, boicotavam a avaliação. Enquanto 418 alunos fizeram o teste em 2011, agora foram quase 2.500.
Ainda que sejam pertinentes algumas críticas ao exame -em vez de se restringir a questões teóricas, deveria medir também a aptidão prática-, sua aplicação a todos os formandos permite um diagnóstico mais preciso sobre os cursos de medicina no Estado.
A formação dos médicos, não há como fugir à conclusão, é precária. Permitir que tais profissionais ingressem no mercado de trabalho é uma temeridade. Na medicina, o desconhecimento técnico pode ter consequências funestas.
O que está em jogo não é o interesse de proprietários de faculdades, mas a segurança e a saúde dos pacientes. Passou da hora de o Congresso aprovar um exame de habilitação para a medicina. Não faz sentido permitir que a população fique nas mãos de médicos que não têm o conhecimento mínimo necessário.

    O equilíbrio das penas
    Pelo caráter histórico do julgamento, fixar critérios objetivos é mais importante do que a exaltação punitiva no processo do mensalão
    A nação "já não aguenta mais" o julgamento do mensalão, disse o presidente do Supremo Tribunal Federal, Joaquim Barbosa, na última quinta-feira. Frustrou-se, contudo, seu desejo de encerrar ainda na semana passada um trâmite decisório que se estende há mais de quatro meses, consumindo meia centena de sessões do tribunal.
    É que se revelaram especialmente complexos, em sua minúcia exasperante, os debates a respeito das penas a serem aplicadas. No interesse de evitar um número de recursos judiciais ainda maior do que o naturalmente previsível, cabe de fato zelar para que a pressa não leve à incoerência e à falta de razoabilidade no resultado final.
    Foi do revisor Ricardo Lewandowski a iniciativa de propor um critério objetivo para o cálculo das penas pecuniárias impostas aos réus. A discussão é pertinente, embora tenham sido visíveis, no plenário, as resistências a reconsiderar decisões já tomadas pela maioria dos magistrados.
    Para Lewandowski, seria adequado adotar, na aplicação das multas, os mesmos critérios para aumento e diminuição assumidos quando se estipularam as penas privativas de liberdade.
    Quando se elevou, por exemplo, em um ano acima do mínimo previsto o tempo de reclusão imposto a determinado réu, em delito cuja pena pode variar de dois a 12 anos, também a multa deveria ser majorada na mesma proporção.
    Seria uma maneira de evitar que o puro arbítrio punitivo prevalecesse nas decisões dos magistrados -tanto neste julgamento como nos posteriores, aos quais certamente servirá de modelo.
    A consideração da maior ou menor capacidade financeira do condenado, que evidentemente deve ser analisada pelo juiz, não estaria afastada com o critério sugerido. A multa varia, efetivamente, conforme for maior ou menor a quantidade de salários mínimos utilizada como unidade básica para o cálculo -e, no momento de fixá-la, o magistrado estaria levando em conta qual o patrimônio do réu.
    A pena de multa, vale lembrar, não exclui a obrigação de que se devolvam aos cofres públicos recursos apropriados ilegalmente.
    O assunto voltará a ser debatido pelo STF. Dadas a importância histórica do julgamento e a expectativa geral de que abra uma fase de maior rigor na investigação e na punição de crimes cometidos por detentores do poder político, é natural que se queira impor aos condenados um tratamento exemplar.
    Resta fundamental, entretanto, que o senso de proporção prevaleça sobre o açodamento punitivo. A fixação de critérios e normas objetivos importa mais, para os julgamentos futuros, do que a exaltação draconiana de um momento especial.

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