Marcela Ulhoa
Estado de Minas: 09/01/2013
Brasília – Nem sempre as decisões tomadas no dia a dia vêm acompanhadas da sensação de que a escolha foi acertada. O que comer na lanchonete? Mesmo sendo fã de pão de queijo, o eleito do dia pode ser um sanduíche. Assim que chega o quitute mineiro do amigo, entretanto, a dúvida volta: será que a outra opção seria melhor? Por outro lado, existem aqueles que, na maior parte do tempo, conseguem alcançar a sintonia em suas escolhas e permanecem certos de que sim, sua decisão foi a mais adequada.
Em um artigo publicado na revista Nature Neuroscience, pesquisadores do Wellcome Trust, no Reino Unido, revelaram como o cérebro acessa a confiança na tomada de decisão. Segundo o cientista Benedetto De Martino, autor principal do estudo, a explicação de por que algumas pessoas têm uma melhor visão sobre as escolhas está na interação entre duas áreas do cérebro: o córtex pré-frontal ventromedial e o córtex pré-frontal rostrolateral. “A grande mensagem do estudo é que algumas pessoas são capazes de reportar sua confiança com precisão, ou seja, elas têm uma metacognição que aparece quando essas regiões se relacionam”, diz De Martino.
Metacognição significa além da cognição. Seria algo como avaliar de forma consciente as próprias ações. “Existem dois níves de escolhas. Você pode saber o que quer, mas não por que deseja essa coisa. Ou pode ter a habilidade de entender a escolha e, se necessário, revisá-la. Isso evita, por exemplo, que um erro seja repetido no futuro”, pondera o pesquisador. De Martino reforça, entretanto, que não existem pessoas totalmente seguras ou inseguras, mas que todos podem ser mais ou menos confiantes dependendo da situação.
Outros estudos focaram os mecanismos por trás da tomada de decisão, mas não mostraram como a confiança subjetiva e a avaliação das escolhas interagem no cérebro. “O maior acréscimo do estudo é mostrar que regiões semelhantes estão relacionadas tanto com a escolha quanto com a certeza dela”, avalia André Cravo, neurocientista da Universidade Federal do ABC, que não participou da pesquisa.
Interação Para chegar aos resultados, os pesquisadores realizaram um experimento no qual voluntários tinham de escolher o que comeriam depois dos testes. Durante todas as fases de escolha, seus cérebros foram escaneados por ressonância magnética funcional (veja abaixo). “Colocar pessoas com fome para escolher o que comer é uma forma de tornar a relação de tomada de decisão mais relevante e real. A necessidade de alimentação é algo primário”, explica o pesquisador.
No momento em que os voluntários tinham de escolher entre dois lanches, a parte do cérebro mais ativada por eles foi o córtex pré-frontal ventromedial, relacionado ao medo e à tomada de decisão. Depois de cada escolha, os voluntários disseram o quão confiantes estavam sobre sua decisão. Nessa fase, a mesma região era ativada nos que relataram confiança. Já os voluntários que titubearam mostraram pouca atividade na área e uma ausência da conexão entre ela e o córtex pré-frontal rostrolateral. Dessa forma, os autores concluíram que a capacidade de reflexão sobre as decisões depende dessa interação.
De acordo com Baruch Fischhoff, professor de sociologia da decisão da Universidade Carnegie Mellon, nas pesquisas sobre confiança geralmente os participantes são perguntados sobre algo que conhecem. O novo estudo, entretanto, pergunta sobre a confiança em valores. “A incerteza sobre os valores é uma importante, e frequentemente negligenciada, questão. Muitas vezes, as pessoas se esforçam para aprender sobre o mundo quando o real problema está em saber o que elas realmente querem”, conclui.
Fischhoff compara o método usado no experimento britânico com o adotado por sua equipe e lança uma crítica. “A metodologia é popular entre os pesquisadores que interpretam as respostas como medidas absolutas, mas é menos popular entre aqueles que querem saber se os entrevistados realmente entendem a tarefa.” De acordo com ele, a ideia de que as pessoas sabem o que querem em cada escolha é muito mais comum para a teoria econômica. Fischhoff complementa, contudo, que as descobertas de evidências neurais para suportar tais constatações são um avanço.
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