quinta-feira, 31 de janeiro de 2013

Editoriais FolhaSP

FOLHA DE SÃO PAULO

Alívio passageiro
Aumento de combustíveis traz folga momentânea à Petrobras, cujo desempenho continuará prejudicado pela interferência do Planalto
Há quase sete anos, em abril de 2006, num prenúncio da euforia com as descobertas do pré-sal, o então presidente da Petrobras, José Sergio Gabrielli, enterrou R$ 37 milhões numa campanha publicitária laudatória da autossuficiência alcançada pelo país.
De lá para cá, o entusiasmo evaporou, assim como os resultados da Petrobras. A instrumentalização da maior empresa do país como arma de propaganda governista deu no que não poderia deixar de dar: deterioração acelerada do desempenho da companhia.
Não só a autossuficiência não livrou o Brasil do deficit na balança comercial de combustíveis como o país vem importando quantidades crescentes deles -sobretudo gasolina, que é vendida no mercado interno por preços inferiores aos do mercado internacional, defasagem que causa prejuízos bilionários à petroleira.
Não é com o aumento da gasolina e do diesel para distribuidores (6,6% e 5,4%, respectivamente) anunciado anteontem, contudo, que a Petrobras se verá livre da sangria. O reajuste ficou longe de zerar a defasagem. As estimativas variam, mas ela ainda estaria, após a alta, na faixa de 7% a 15% de diferença entre os preços domésticos e os internacionais.
O prejuízo mensal da Petrobras com esses combustíveis, calculado em cerca de R$ 2 bilhões, cairia para algo mais próximo de R$ 1 bilhão. Ainda assim, um subsídio considerável para seu consumo, bancado por uma empresa que deveria lutar por resultados melhores para apresentar aos acionistas.
Na segunda-feira devem ser divulgados os novos números do desempenho da Petrobras, e as expectativas são pessimistas -espera-se o anúncio de queda na produção de petróleo em 2012, por exemplo. O próprio reajuste dos combustíveis, acredita-se, teria sido um expediente para contrabalançar as más notícias iminentes.
Outro fator que explica o momento escolhido para o aumento é a inflação. O governo federal -que representa o acionista controlador da Petrobras, a União- vinha represando o preço dos combustíveis para evitar a alta dos índices. A folga obtida com a redução das tarifas de energia elétrica, anunciada há uma semana pela presidente Dilma Rousseff, permitiu acomodar a majoração que traz algum alívio para a petroleira.
Há indicações de que Graça Foster, presidente da estatal, defendia alta maior para a gasolina, da ordem de 7,5%. Teve de contentar-se com 6,6% (que devem resultar em cerca de 4,6% para o consumidor).
Não será a primeira nem a última vez em que a Petrobras submete o interesse dos acionistas particulares aos interesses do Planalto.


EDITORIAIS
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Impasse no Egito
A declaração alarmista do chefe das Forças Armadas egípcias, general Abdel Fattah al Sisi, de que o Estado corre o risco de colapso é um sintoma da incapacidade do governo do presidente Mohamed Mursi para controlar sozinho as forças que lhe fazem oposição.
Mais que uma ameaça de retorno dos militares ao poder, que reverteria a Primavera Árabe no seu país-símbolo, a fala do general, também ministro da Defesa, constitui um lembrete sobre a importância do poderio militar para controlar as manifestações violentas no Cairo e em cidades como Port Said, Suez e Ismailia.
A contrapartida, deduz-se, seria um maior envolvimento das Forças Armadas nas decisões do governo.
Em sete meses no poder, o presidente -oriundo da organização religiosa Irmandade Muçulmana- mostrou-se incapaz de conter a oposição que lhe é movida por setores mais secularistas.
Dois anos após o início dos protestos que derrubaram o marechal Hosni Mubarak, o presidente egípcio é acusado de recorrer a métodos similares aos do ex-ditador, como concentrar poderes na Presidência e empregar violência para reprimir manifestações populares.
Mais de 50 pessoas já morreram e mais de mil ficaram feridas desde a sexta-feira nos protestos. Multidões, frustradas com a ausência de reformas profundas, saíram às ruas em desafio ao estado de emergência e ao toque de recolher impostos no domingo.
A instabilidade contamina a economia. Os principais hotéis do Cairo sofrem com os distúrbios e a insegurança; turistas estrangeiros se mostram receosos em retornar ao país, o que prejudica um dos principais motores da economia local.
O desemprego está perto de 12%, e a estimativa do Fundo Monetário Internacional é que o PIB do Egito tenha crescido 2% no ano passado. Um resultado similar ao de 2011, mas muito distante dos obtidos nos últimos anos do regime de Mubarak, quando a economia chegava a crescer mais de 7% ao ano.
O governo tenta há vários meses obter um empréstimo de US$ 4,8 bilhões do FMI, para sanear suas contas e atrair investidores, mas a incapacidade de promover as reformas exigidas pelo Fundo torna o aval cada vez mais distante.
A melhor saída para Mursi pôr fim à convulsão política seria negociar com oposicionistas. Caso contrário, o primeiro governo democrático do país arrisca ser engolfado por uma espiral de violência e preparar o terreno, aí sim, para alguma aventura dos militares, que se apresentariam como a única força capaz de manter o Egito unido.

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