sábado, 16 de fevereiro de 2013

Eduardo Almeida Reis - Cancelamentos‏

A moça treinada para chatear o assinante diz que o meu plano é tão atrativo que pode e deve ser transferido para alguém 

Eduardo Almeida Reis
Estado de Minas: 16/02/2013 

Depois de meia hora daquele martírio clique um, clique dois, clique sete, sempre com ofertas de planos maravilhosos, consigo falar com a operadora da NET, que me dá o número imenso do protocolo e informa que “para minha segurança” a ligação está sendo gravada.

Digo que estou de mudança e quero cancelar a assinatura da NET, quero deixar de “ser um NET”, dou meu nome, CPF, número da carteira de identidade, data de nascimento no século e no milênio passados, estado civil, endereço para remessa da última fatura, agendo dia e hora para entrega do modem e do controle remoto, mas a moça treinada para chatear o assinante diz que o meu plano é tão atrativo, que pode e deve ser transferido para alguém: só a pau! 

Paciente como bom philosopho, digo que só devo ter em BH um inimigo figadal, por sinal ladrão e corno. Um amigo me disse: “Trabalhou para nossa empresa e foi demitido porque é ladrão”, ao que outro amigo ajuntou: “É corno. Comi a mulher dele”.

Mas a telemarqueteira, treinada como ela só, insiste: quer, porque quer, saber do meu novo endereço. Inspirado, explico: “Senhorita, vou estar fugindo com a mulher de um político muito conhecido e se contar à NET o meu novo endereço ele vai estar mandando me matar”.

O truque funcionou tão bem, que adotei o gerundismo nos outros cancelamentos sempre com sucesso, salvo no caso da Cemig. É impossível usar o “fale com a Cemig”. Teimoso, tentei 11 vezes num só dia e a gravação informava que, naquele momento, a Cemig só estava atendendo aos chamados para postes caídos, falta de energia e outros que tais: “Ligue mais tarde”.

Sai dessa, caro e preclaro leitor. Saí. O estado-maior da Cemig almoça no ótimo Couve-Flor, pertinho do prédio da empresa. Escrevi minha solicitação de cancelamento num papelucho e botei tocaia na passagem dos comensais, tendo o cuidado de anotar no mesmo papelucho: “Em caso de dúvida, falar com o presidente Djalma ou com o vice Arlindo, que são meus amigos”.

Quando passou um grupo de quatro funcionários com jeito de chefões, entreguei o papelucho, todos concordaram com a impossibilidade de recorrer ao “fale com a Cemig” e o menos jovem prometeu tomar as providências. Pelo visto, jogou fora minha solicitação, porque continuei a receber contas da Cemig de um apartamento que havia desocupado um mês antes e só então – miracolo! – consegui que uma operadora do “fale com a Cemig” falasse comigo para acertar as contas numa fatura calculada sobre a média de consumo de 10 meses. O país é pouco sério, mas a Cemig está dispensada de exagerar. 

Espetáculo
Dia 24 de dezembro de 2012, dez da manhã, cidade mineira de 25 mil habitantes, que deve ter bons 30 mil eleitores, neste fenômeno muito nacional de cidades que têm mais eleitores do que habitantes.

Não adianta, que não vou dizer o nome: tenho por lá bons amigos. No dia e hora citados assisti a um dos espetáculos mais constrangedores de que tive notícia. A cidade tem um calçadão, rua central em que não passam automóveis. Nas ruas em que circulam veículos automotores não passa ninguém, tamanho o engarrafamento. No calçadão havia, contratado pela prefeitura, um caminhão transbordante de brinquedos baratos, alto-falante aos berros, senha e fila imensa, gigantesca, incomensurável de brasileiros não muito bonitos, senhoras monstruosamente gordas, crianças, meninos de colo. Em pecuária se diz: de mamando a caducando. 

Sabe o leitor fazendo o quê? Pois, se não sabia fique sabendo: recebendo os presentes natalinos distribuídos pela prefeitura. Fiquei numa tristeza que o leitor nem pode imaginar. E perguntei, parafraseando nosso Francelino Pereira: que país é este?

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