Sérgio Rodrigo Reis
Estado de Minas: 16/03/2013
Na década de 1970,
quando o poeta e crítico Ferreira Gullar começou a assinar sua coluna
semanal em importantes revistas do país, depois de voltar do exílio, ele
comprou uma briga histórica – que se estende até hoje. Naquela época,
surgiam ícones brasileiros da arte contemporânea, atualmente tão
propalada. De imediato, Gullar questionou a novidade, atribuindo
“ausência de linguagem” e excesso de discurso àqueles autores.
“Este é o problema da arte contemporânea: tudo é expressão. Não basta ser expressão para ser arte. Se alguém pisar no meu pé, isso gera uma expressão. Nem por isso é arte”, afirmava o crítico maranhense.
Ferreira Gullar acaba de retomar essa polêmica com o livro Arte contemporânea brasileira. O volume traz 80 textos publicados na imprensa, considerados por ele importantes para compreender suas reflexões sobre artes plásticas. A maioria dos artigos aborda o legado de artistas cujas trajetórias estão profundamente ligadas a expressões mais tradicionais, como a pintura, o desenho e a escultura, em detrimento de nomes que optaram por propostas mais conceituais. Grupo esse que, ao longo de décadas, tem recebido duras críticas de Gullar.
“A arte contemporânea foi num crescendo que tomou conta de tudo. Conheço pintoras talentosas da geração por volta dos 50 anos que, simplesmente, não têm vez em nome dessa expressão contemporânea que consideram até hoje novidade. Sinceramente, você acha que ao colocar dois urubus dentro de uma gaiola está se fazendo arte? Pode ser até uma manifestação de rebeldia, mas arte não é”, afirma ele.
Mesmo com ácidas críticas à expressão contemporânea, Ferreira Gullar ressalta o que considera bom. O livro traz alguns (poucos) textos sobre nomes expressivos do movimento, como Waltércio Caldas e Cildo Meireles. Esse último, aliás, mereceu elogios por causa da instalação Desvio para o vermelho – abrigada no Instituto Inhotim, em Brumadinho, a 60 quilômetros de Belo Horizonte. “Elogiei o trabalho porque achei, apesar da linguagem diferente, que ali existia uma linguagem”, justifica Gullar.
De acordo com o crítico, para algo ser considerado obra de arte, tem de haver, antes de tudo, o domínio de uma linguagem. O problema, argumenta ele, é que a produção contemporânea derivou para um caminho fácil. “É uma arte para a mídia, para o espectador. Certa vez, fui a uma exposição do Tunga e vi um novelo gigantesco de bronze ocupando todo o espaço da galeria. Achei que ninguém compraria. Ao perguntar ao dono de lá sobre aquilo, ele me disse que o que estava sendo comercializado eram desenhos. Aí entendi. O artista faz algo para chamar a atenção e vende desenhos”, ironiza.
A não permanência das propostas o incomoda, assim como a relação pessimista dos criadores com quase tudo. “A maioria dos trabalhos é carregada de negatividade. Essa turma não cria algo belo, otimista. É sempre cocô na lata, urubu na gaiola, coisas que o Marcel Duchamp fez em 1937, quando resolveu protestar contra a arte”, afirma.
Observações assim têm lhe rendido pesados insultos nas redes sociais e, de maneira mais polida, críticas de intelectuais ligados à arte contemporânea. Gullar não se incomoda. “Quem gosta desse tipo de expressão é idiota e de arte não entende nada. Sei que me esculhambam na internet, mas não estou nem aí”, avisa.
Apaixonado pela pintura, pela escultura e por formas mais tradicionais, Gullar diz não ter a menor pretensão de visitar Inhotim, a meca nacional das linguagens contemporâneas. “Não estou dizendo que tudo lá é ruim. Mas a maioria são coisas sem permanência”, conclui.
ARTE CONTEMPORÂNEA BRASILEIRA
• De Ferreira Gullar
• Editora Lazuli
• 205 páginas, R$ 46,90
“Este é o problema da arte contemporânea: tudo é expressão. Não basta ser expressão para ser arte. Se alguém pisar no meu pé, isso gera uma expressão. Nem por isso é arte”, afirmava o crítico maranhense.
Ferreira Gullar acaba de retomar essa polêmica com o livro Arte contemporânea brasileira. O volume traz 80 textos publicados na imprensa, considerados por ele importantes para compreender suas reflexões sobre artes plásticas. A maioria dos artigos aborda o legado de artistas cujas trajetórias estão profundamente ligadas a expressões mais tradicionais, como a pintura, o desenho e a escultura, em detrimento de nomes que optaram por propostas mais conceituais. Grupo esse que, ao longo de décadas, tem recebido duras críticas de Gullar.
“A arte contemporânea foi num crescendo que tomou conta de tudo. Conheço pintoras talentosas da geração por volta dos 50 anos que, simplesmente, não têm vez em nome dessa expressão contemporânea que consideram até hoje novidade. Sinceramente, você acha que ao colocar dois urubus dentro de uma gaiola está se fazendo arte? Pode ser até uma manifestação de rebeldia, mas arte não é”, afirma ele.
Mesmo com ácidas críticas à expressão contemporânea, Ferreira Gullar ressalta o que considera bom. O livro traz alguns (poucos) textos sobre nomes expressivos do movimento, como Waltércio Caldas e Cildo Meireles. Esse último, aliás, mereceu elogios por causa da instalação Desvio para o vermelho – abrigada no Instituto Inhotim, em Brumadinho, a 60 quilômetros de Belo Horizonte. “Elogiei o trabalho porque achei, apesar da linguagem diferente, que ali existia uma linguagem”, justifica Gullar.
De acordo com o crítico, para algo ser considerado obra de arte, tem de haver, antes de tudo, o domínio de uma linguagem. O problema, argumenta ele, é que a produção contemporânea derivou para um caminho fácil. “É uma arte para a mídia, para o espectador. Certa vez, fui a uma exposição do Tunga e vi um novelo gigantesco de bronze ocupando todo o espaço da galeria. Achei que ninguém compraria. Ao perguntar ao dono de lá sobre aquilo, ele me disse que o que estava sendo comercializado eram desenhos. Aí entendi. O artista faz algo para chamar a atenção e vende desenhos”, ironiza.
A não permanência das propostas o incomoda, assim como a relação pessimista dos criadores com quase tudo. “A maioria dos trabalhos é carregada de negatividade. Essa turma não cria algo belo, otimista. É sempre cocô na lata, urubu na gaiola, coisas que o Marcel Duchamp fez em 1937, quando resolveu protestar contra a arte”, afirma.
Observações assim têm lhe rendido pesados insultos nas redes sociais e, de maneira mais polida, críticas de intelectuais ligados à arte contemporânea. Gullar não se incomoda. “Quem gosta desse tipo de expressão é idiota e de arte não entende nada. Sei que me esculhambam na internet, mas não estou nem aí”, avisa.
Apaixonado pela pintura, pela escultura e por formas mais tradicionais, Gullar diz não ter a menor pretensão de visitar Inhotim, a meca nacional das linguagens contemporâneas. “Não estou dizendo que tudo lá é ruim. Mas a maioria são coisas sem permanência”, conclui.
ARTE CONTEMPORÂNEA BRASILEIRA
• De Ferreira Gullar
• Editora Lazuli
• 205 páginas, R$ 46,90
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