Poeta lança na Casa das Rosas obra com traduções de 20 poemas do argentino e entrevista com ele de 1984
"Traduzi-lo é exercício de concisão, precisão e perfeição, um desafio de milímetros", diz o autor brasileiro
O poeta concreto telefonou para o apartamento do grande escritor argentino, então com 84 anos, e conseguiu agendar uma visita para aquela mesma manhã.
As conversas de Campos com Borges (houve uma segunda visita no dia seguinte) serão lembradas hoje, na Casa das Rosas, em São Paulo, com outros dois encontros.
Augusto de Campos, 82, será o convidado do evento anual Encontro Prática da Escrita, onde debaterá com o poeta e artista gráfico Omar Khouri, que também visitou Borges no mesmo 1984.
Em seguida, Campos lançará o livro "Quase Borges" (ed. Terracota), no qual reúne 20 traduções de poemas do argentino e um relato das conversas com ele no apartamento da Calle Maipu.
Teve sorte de ter encontrado o escritor em casa. Em uma biografia de Borges, "Esplendor e Derrota" (ed. Record), a escritora María Esther Vázquez diz que 1984 foi, na vida dele, "o ano das grandes viagens".
Com a saúde fragilizada, cego havia décadas, o maior escritor da Argentina esteve naquele ano em Veneza, Tóquio, na Ilha de Creta e mesmo em São Paulo, onde fez palestra no pátio da Folha.
Na conversa com Campos, em Buenos Aires, passaram também parte do tempo bem longe, na Irlanda, país de onde vinha a bengala de madeira escura na qual se apoiava Borges. Ele sintetizou: " É um pequeno país, pobre, com uns poucos milhões de habitantes, e deu Swift, Sterne, Wilde, Shaw e Joyce".
A este último, James Joyce, é dedicado um dos poemas presente no livro. "Em apenas um dia estão os dias/Do tempo, desde aquele inconcebível/Dia inicial do tempo, em que o terrível/Deus prefixou os dias e agonias", começa, na tradução de Campos.
"Preferi os poemas da fase madura de Borges, os de forma fixa, a que ele se apegou depois de cego, pela mais fácil memorização", diz Campos à Folha, sobre o critério de seleção dos textos.
Tradutor de inúmeras "pedreiras" literárias, como os trovadores provençais do século 12, o simbolista francês Stéphane Mallarmé e o próprio Joyce, Campos diz que as dificuldades de verter Borges são de outra natureza.
"Borges metrifica com perfeição e traduzi-lo é um desafio de milímetros", diz ele. Em entrevista por e-mail, Campos diz: "Os 'concretos' foram muito criticados por terem decretado 'o fim do ciclo histórico do verso', mas ninguém mais faz mais versos de alguma significação e as técnicas do verso se degradaram muito. Talvez seja útil mostrar como se fazem versos à luz dos que o sabiam fazer."
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