segunda-feira, 22 de abril de 2013

Dureza - Eduardo Almeida Reis

Tirantes os casos de distúrbios glandulares, que não chegam a 5% dos gordos, só existe um remédio para a obesidade: juízo 


Eduardo Almeida Reis

Estado de Minas: 22/04/2013 

Fui dormir pensando na dureza que é ficar acordado até tarde esperando um programa de tevê, que, às vezes, é interessante, assisti-lo durante exatos 22 minutos e concluir, como concluí, que não entendi absolutamente nada. É duro, duríssimo – é dureza, qualidade do que é difícil de suportar, confirmando a extensão de minha ignorância. A entrevistada, bonita, modelo 45, é neurocientista da UFRJ, com doutorado e pós-doutoramento nas melhores universidades americanas e europeias. Entre os entrevistadores havia o biólogo Fernando Reinach, autor de livro extraordinário, A longa marcha dos grilos canibais, profissional da pena que nos serve textos de fácil digestão a partir dos assuntos que retira das revistas científicas. Contudo, Reinach fez à bela neurocientista uma pergunta sobre cérebro e mente, ou mente e cérebro, negócio tão complicado que me fez desligar o televisor. Fui parar em cama (Vieira abona “em cama”) pensando na dureza que é ser ignorante. E amanheci curioso de outras durezas, que encontro na Escala de Mohs, criada em 1812 pelo geólogo e mineralogista alemão Friedrich Mohs.

Para a ciência, dureza é propriedade característica de um material sólido, que expressa sua resistência a deformações permanentes e está relacionada com a força de ligação dos átomos. Na Escala de Mohs, temos a dureza crescente a partir do talco até chegar ao diamante. É a resistência que um determinado material oferece ao risco, ou seja, à retirada de partículas de sua superfície. Se o diamante risca o vidro é mais duro que o vidro. Assim, ficamos sabendo que o diamante tem dureza absoluta 1, 5 mil vezes superior à do talco. E a neurociência é um 1 trilhão e 500 bilhões de vezes mais dura que o meu entendimento de philosopho. Na escala de 1 a 9, a dureza aumenta de modo mais ou menos uniforme, mas de 9 para 10 há diferença muito acentuada, pois o diamante é muito mais duro que o coríndon, que o pacientíssimo leitor conhece como rubi e safira.

Pela ordem crescente, a Escala de Mohs tem: talco, gesso, calcita, fluorita, apatita, feldspato, quartzo, topázio, coríndon e diamante. Claro que o leitor conhece a fórmula química do talco, que só aprendi agora e fiquei tão feliz que não resisto à tentação de transcrever: Mg3Si4O10(OH)2. Esse Mg3 me parece a rodovia MG-3, que não sei onde fica, porque o Google tem 3.650.000 entradas para rodovias de Minas Gerais e, obviamente, não tenho tempo de procurar a MG-3 nem sei se existe, mas o DER-MG deve saber, como também nela já deve ter instalado uns 200 radares.

Sei que o talco pode ser facilmente arranhado com a unha, porque vi na Escala de Mohs, onde também aprendi que o diamante é o mineral mais duro que existe, pode arranhar todos os outros minerais e é arranhado somente por outro diamante. Para encerrar este belíssimo suelto, que tal a fórmula do quartzo capaz de arranhar o vidro? Diz aqui a Wikipédia que a ametista é uma variedade violeta ou púrpura do quartzo. Sua fórmula é SiO2. Falou?

Coragem relativa

Sibutramina, sabemos todos, tem a massa molar 279.85g mol e a fórmula química C17H26C1N. Indicada no tratamento da obesidade, deve continuar a ser vendida no Brasil, ao contrário do que ocorre nos EUA e em muitos países europeus. A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) reavaliou o fármaco e concluiu que não aumenta o risco de infarto entre os obesos cardiopatas ou diabéticos, apesar do estudo de Scout com 10.744 pacientes em vários países, quando concluiu que a pílula eleva, sim, o risco de infarto ou derrame. Endocrinologistas festejaram a decisão relativamente corajosa da Anvisa, dizendo que têm escassez de remédios contra a obesidade. Os doutores que se dedicam à endocrinologia deveriam ter aprendido no meu livro A dieta inteligente que, tirantes os casos de distúrbios glandulares, que não chegam a 5% dos gordos, só existe um remédio para a obesidade: juízo.

Sem juízo, sem a vontade real de emagrecer, nem cirurgia bariátrica resolve. Há milhares de casos de as pessoas voltarem a engordar depois da cirurgia, não raras vezes bebendo creme de leite em canudinhos. E a coragem da Anvisa é relativa porque, corajosa de fato, será a agência no dia em que resolver proibir a venda de um fármaco de massa molar 474.55g mol e fórmula química C22H30N604S, que nenhum dos meus amigos, dos mais jovens aos coetâneos, jamais tomou, embora todos comprem a montões e a mancheias – o citrato de sildenafila, que atende pelo nome de Viagra.

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