Fundada há 30 anos por Milton Nascimento e
Wagner Tiso, a Música de Minas Escola Livre criou modelo de ensino no
Brasil e ajudou a formar artistas de vários estilos
Ailton Magioli
Estado de Minas: 22/04/2013
Três
décadas depois da experiência pioneira em Belo Horizonte, onde criou e
manteve por cerca de cinco anos a Música de Minas Escola Livre, em
parceria com Milton Nascimento, Cláudio Rocha e Márcio Ferreira, Wagner
Tiso diz que faria tudo de novo. “Agora com mais experiência”, avaliza o
arranjador, compositor e instrumentista, ainda que admita ser
praticamente impossível, hoje, levar adiante projeto do gênero sem
patrocínio ou ajuda de governos, como fez naquele período.
Estrategicamente
instalada em imóvel da Rua Rio de Janeiro, em Lourdes, em frente ao
extinto Bar Tip Top, além de espaço para o ensino e prática da música, a
escola serviu de ponte para jovens se projetarem na cena musical
belo-horizontina. Na época, Wagner mantinha, com outros sócios, a casa
noturna Cabaré Mineiro, onde os alunos da instituição eram as principais
atrações do Projeto Trampolim, das noites de terça-feira, quando
artistas nacionais e internacionais que se apresentavam na casa iam à
escola para ministrar oficinas.
“Comecei a estudar saxofone com o
José Eymard na inauguração da escola, em 1983”, recorda Cleber Alves,
que dois anos depois já era professor da Escola Música de Minas,
paralelamente às aulas de teoria e solfejo que fazia na Escola de Música
da UFMG. Segundo o saxofonista, com a chegada de Evaldo Robson,
saxofonista de Brasília, à escola de Wagner Tiso, com quem passou a
fazer aulas de sax, acabou recebendo convite para também ministrar aulas
no local.
“Saí da escola só com o fechamento dela”, relata,
ainda orgulhoso da experiência. Filho de família humilde de Sete Lagoas,
onde se iniciou musicalmente no violão, Cleber Alves lembra que só
depois de adquirir um sax soprano de um vizinho passou a se interessar
pelo instrumento, com o qual se profissionalizaria depois de ganhar uma
bolsa de estudos integral de Wagner Tiso na Música de Minas Escola
Livre.
Atual professor de sax e improvisação da Escola de Música
da UFMG, onde também dirige grupo em prática de conjunto e uma big band,
Cleber Alves ainda dá aulas de prática de conjunto e sax na Bituca
Universidade de Música Popular, de Barbacena, onde hoje se encontra boa
parte dos ex-mestres e ex-alunos da Música de Minas Escola Livre.
BITUCA Além
de Gilvan de Oliveira, que foi coordenador da escola mantida por Wagner
Tiso e Milton Nascimento em Belo Horizonte, são professores da
universidade criada pelo grupo Ponto de Partida, de Barbacena, Babaya e
Mauro Rodrigues, este também responsável por levar a cadeira de música
popular brasileira para a UFMG. Além de sistematizar uma metodologia do
ensino da música na capital, um dos maiores legados da Música de Minas,
de acordo com Gilvan, foi a liberdade para a prática do ensino, já que a
maioria dos professores eram músicos profissionais em atividade,
naquele período.
“Fora o fato de a escola ter coincidido com a
criação do Cabaré Mineiro, que, de 1984 a 1992, se tornou palco para
apresentações dos músicos”, acrescenta Gilvan. Ao grupo de professores
da escola de Wagner Tiso se juntaram, ainda, Juarez Moreira, Yuri
Popoff, Paulo “Uakti” Santos, José Namen, Milton Ramos e Bento Menezes,
entre outros. Já como alunos, passaram por lá músicos como Samuel
“Skank” Rosa, Maurício Tizumba e Flávio Henrique, entre outros. No
local, Wagner Tiso recorda que chegou a receber o então governador
mineiro Tancredo Neves, que, pouco depois, participaria da campanha
Diretas Já! e seria eleito presidente da República, em 1985, pelo
colégio eleitoral.
DEPOIMENTO
. Flávio Henrique
. músico que começou a estudar na Música de Minas aos 18 anos
“Era
uma época muito inicial de minha carreira, quando fui estudar violão
com Gilvan de Oliveira na Música de Minas Escola Livre. A oportunidade
para conhecer de perto músicos que a gente via tocando com Milton
Nascimento, Beto Guedes e outros artistas era imperdível. Não havia nada
igual em Belo Horizonte até então. As escolas de música que existiam
por aqui tinham um perfil mais tradicional, enquanto a Música de Minas
significava um avanço.”
TRÊS PERGUNTAS PARA...
. Babaya
. Professora de canto
Qual é o principal legado da Música de Minas Escola Livre?
A
Música de Minas Escola Livre foi um marco no meio musical de Belo
Horizonte. Lembrando que se inaugurou também a casa de shows Cabaré
Mineiro, que seria como uma continuação musical da escola, quase na
mesma época. Foram momentos de muita música, em que vimos o surgimento
de grandes artistas. A Música de Minas centralizava o lado pedagógico, o
conhecimento e a inspiração musical. Ali nasceram os mestres que até
hoje são responsáveis pela formação de várias gerações de excelentes
músicos que atuam no mercado musical, inclusive em outros países.
Acredita que a Universidade Bituca, de Barbacena, tenha algo em comum com aquela escola?
Completamente!
As duas escolas se basearam num sonho que se tornou realidade. As duas
oferecem oportunidades para que o aluno aprenda vendo o “mestre” fazer
música. Cria-se, então, uma relação de mestre e aprendiz. É uma
pedagogia livre, criativa e inspiradora.
Qual era a importância do canto na Música de Minas?
Primeiro
os alunos de canto se inspiravam no próprio dono da escola: Milton
Nascimento. Depois, o convívio com os professores, todos músicos
atuantes no cenário musical da cidade. Isso despertava grande interesse
nos futuros cantores, pela possibilidade de que seus talentos fossem
reconhecidos.
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