segunda-feira, 22 de abril de 2013

Para controlar a pressão, alamandina - Paula Takahashi‏

Cientistas da UFMG testam parte de uma proteína produzida pelo organismo e garantem: ela tem mecanismo claro de ação para hipertensão e patologias cardiovasculares 


Paula Takahashi

Estado de Minas: 22/04/2013 

Pesquisa do Laboratório de Hipertensão do Instituto de Ciências Biológicas da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) deve ter grande contribuição para o tratamento da pressão alta, doença crônica que atinge 22,7% da população brasileira adulta no Brasil, segundo dados do Ministério da Saúde. Em todo o mundo, a hipertensão é responsável pela morte anual de 9,4 milhões de pessoas e ainda está relacionada a 45% dos ataques de coração e 51% dos derrames cerebrais, alerta a Organização Mundial da Saúde (OMS).

Hoje, o tratamento de pacientes hipertensos ocorre por meio da administração de medicamentos que têm como base moléculas produzidas em laboratório. Por isso, na maior parte dos casos, esses remédios podem acarretar uma série de efeitos colaterais. A intenção é que essas moléculas deem lugar a fragmentos de proteínas, os chamados peptídeos, que atuam na dilatação dos vasos sanguíneos e têm característica endógena. Isso quer dizer que esses peptídeos já são produzidos naturalmente pelo próprio corpo humano, o que reduziria a incompatibilidade e, consequentemente, os efeitos colaterais.


“Poderia ser usada uma formulação farmacêutica que possibilite a administração via oral desses peptídeos, já que um dos mecanismos da doença, é reduzir a concentração dessas proteínas no organismo”, explica o professor Robson Augusto Souza dos Santos, pesquisador do Laboratório de Hipertensão do Instituto de Ciências Biológicas da UFMG e coordenador do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia em Nanobiofarmacêutica (INCT Nanobiofar).


No corpo, os peptídeos agem por meio de ligações com os receptores – que também são proteínas – localizados nas membranas das células. No momento em que ocorre essa ligação, são desencadeadas reações no organismo que variam de acordo com a função do peptídeo que participa do processo. Estudada há mais de 20 anos, a angiotensina (1-7), entre as primeiras já descobertas, demonstrou seus efeitos no controle da hipertensão por meio da dilatação da parede das artérias.
Agora, um novo peptídeo promete trazer ainda mais esperança para o tratamento da doença crônica. Com característica semelhante à angiotensina (1-7), a alamandina também auxilia no controle da hipertensão arterial. “Esta última é uma modificação da angiotensina (1-7) e tem um mecanismo claro de ação no controle de pressão e patologias cardiovasculares. É anti-hipertensiva (reduz a pressão de animais hipertensos) e produz efeitos antifibróticos no coração, inibindo a formação de tecido conjuntivo no músculo do coração”, explica Santos.


A possibilidade de utilizá-las juntas, com o mesmo fim, ainda será analisada. “As duas teriam que ter efeitos maiores juntas do que isoladamente. Isso ainda não foi testado”, pondera o professor da UFMG. Ainda que tenham fortes semelhanças, a alamandina atua de forma distinta. “Ela age ao facilitar a produção de óxido nítrico (NO), um gás vasodilatador. Pode ajudar também no tratamento de diabetes. Nesse caso, o óxido nítrico auxilia o transporte de glicose (açúcar), facilitando o tratamento da doença”, explica o pesquisador.

NAS FARMÁCIAS A angiotensina (1-7) já está sendo usada para formular um medicamento destinado ao tratamento de mulheres hipertensas durante o período de gestação como forma de evitar a eclâmpsia – alteração severa da pressão arterial em gestantes. Por colocar em risco o desenvolvimento do feto, as drogas tradicionais não eram aconselhadas para as grávidas, que, por conta disso, nunca contaram com remédios específicos.


Estudo clínico realizado entre 2009 e 2011 reuniu 14 gestantes com pré-eclâmpsia grave que foram submetidas à formulação de medicamente com base na angiotensina (1-7). O resultado foi uma melhora na função dos vasos sanguíneos com a vantagem de não comprometer sua própria saúde ou a do feto. O próximo passo é ampliar as amostragens – o que deve ocorrer até o próximo mês – para que, em dois a cinco anos, o medicamento chegue ao mercado.


No caso da alamandina, os testes clínicos ainda serão iniciados. A grande vantagem é que, por se tratar de um peptídeo endógeno e não fazer mal à saúde, não será necessário passar pela fase de toxicologia. “No meio do ano vamos começar os testes clínicos com humanos, que podem durar entre dois e três anos, até que se conclua se vale ou não a pena introduzi-lo como medicamento”, explica Santos. As perspectivas otimistas levam a crer que o tratamento poderá estar disponível no mercado em dois anos. “Mas o prazo mais realista é de três a quatro anos, o que, para a indústria farmacêutica, é um prazo curto”, observa o pesquisador.



Simpósio internacional

A descoberta do peptídeo alamandina será apresentada pela equipe do INCT Nanobiofar durante o 9º International Symposium on Vasoactive Peptides, que será realizado em Belo Horizonte entre os dias 2 e 5 de maio. O evento vai reunir pesquisadores do mundo todo na abordagem de tópicos de saúde relacionados a doenças cardíacas e metabólicas. O simpósio é organizado pelo INCT Nanobiofar, em parceria com o Laboratório de Hipertensão do Departamento de Fisiologia e Biofísica e do Programa de Pós-Graduação em Fisiologia e Farmacologia do Instituto de Ciências Biológicas (ICB). 



palavra de
especialista


Luiz Bortolotto
membro do conselho da Sociedade Brasileira de Hipertensão (SBH)



Campo novo 

“Essa linha de pesquisa que está sendo desenvolvida abre um campo novo no tratamento do paciente com hipertensão. E ainda pode reduzir os riscos de reação, já que, mesmo que o medicamento também seja baseado em uma substância sintética, esta faz as vezes de um peptídeo orgânico que em determinadas situações pode estar faltando. Acredito que o medicamento vai chegar ao paciente e vai abranger um novo grupo de beneficiados, que seriam as mulheres gestantes, hoje no foco da discussão.” 

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