quarta-feira, 3 de abril de 2013

Editoriais FolhaSP

folha de são paulo

Trabalho valorizado
A promulgação pelo Congresso da emenda constitucional que equipara empregados domésticos a qualquer trabalhador põe termo a uma discriminação que pesava sobre a consciência ética do país.
Surgirão dificuldades para alguns empregadores, é certo. Mas elas empalidecem diante da importância de dignificar uma relação de trabalho culturalmente marcada como de segunda classe.
A essa numerosa categoria profissional -calculada em 7 milhões a 8 milhões de pessoas- se negavam até aqui direitos reconhecidos para todos os outros empregados. Pela nova regra, vigoram de imediato a jornada de oito horas diárias, o máximo de 44 horas semanais e o pagamento de horas extras para o que exceder tais limites.
Vários outros benefícios agora concedidos dependem, no entanto, de regulamentação. Entre outros, depósito em contas do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS), seguro-desemprego, indenização em caso de demissão não justificada e adicional noturno.
Não é pequeno o grau de desinformação e apreensão originadas pela medida. Famílias não são empresas e não contam com equipes de escriturários para dar conta da miríade de providências burocráticas e formulários exigidos dos patrões empresariais.
Simplificação, portanto, deve ser o objetivo central dos regulamentos que o Ministério do Trabalho e Emprego e o Congresso -este por meio da recém-criada Comissão Mista de Consolidação das Leis- já se apressam em prometer para as próximas semanas. Parece promissora a ideia de descomplicar ao máximo o recolhimento do FGTS, por exemplo acoplando-o ao do INSS, que já é feito pelos patrões domésticos.
Se de fato os empregadores ficarem livres dessa sobrecarga escritural, sobrará para eles ainda a despesa adicional implicada pelas medidas, como o FGTS (8% sobre o salário). Não chega a ser um valor desprezível, mas tampouco parece suficiente para desencadear a onda de demissões prognosticada pelos mais alarmistas.
Assim, soam prematuras as propostas já aventadas de desoneração para os empregadores. Na prática, isso equivaleria a penalizar todos os contribuintes com subsídios para uma minoria manter empregados domésticos -mão de obra que já vem num processo inexorável de encarecimento, fruto da expansão do emprego, dos salários e da renda média no país.

    EDITORIAIS
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    Recaída franciscana
    A deletéria antecipação da corrida eleitoral de 2014 leva a presidente Dilma Rousseff a reciclar o jogo fisiológico e o loteamento de ministérios
    Embora contenha um fundo de verdade, a declaração da presidente Dilma Rousseff de que "nenhuma força política sozinha é capaz de dirigir um país com esta complexidade" não justifica o pragmatismo desenfreado do PT em busca de alianças eleitorais para perpetuar seu projeto de poder.
    Se o mensalão é um exemplo acabado do abandono de princípios éticos em troca de apoio político, a proliferação e o loteamento de ministérios atestam, por seu turno, o triunfo da fisiologia sobre a responsabilidade administrativa e a boa gestão do Estado.
    Depois de compelida, no primeiro ano de mandato, a promover o que se convencionou chamar de "faxina" ministerial para conter o gangsterismo de aliados, Dilma volta ao credo do "é dando que se recebe" -cínica apropriação politiqueira da oração franciscana.
    Os movimentos da presidente pautam-se pela antecipação deletéria do jogo eleitoral de 2014, com as virtuais candidaturas de Aécio Neves (PSDB), Marina Silva (Rede Sustentabilidade) e Eduardo Campos (PSB) na praça.
    As escaramuças já haviam propiciado, há duas semanas, a reabilitação do pedetista Carlos Lupi, que deixou o Ministério do Trabalho sob acusações de corrupção. Agora, a mandatária reforça a posição do PR e cria um espantoso 39º cargo de primeiro escalão para contemplar o PSD, do ex-prefeito paulistano Gilberto Kassab.
    É verdade que a escolha do ex-governador da Bahia César Borges (PR) para a pasta dos Transportes -de onde foi varrido, em 2011, seu correligionário Alfredo Nascimento- se cercou de precauções. Com efeito, a presidente contrariou propostas e optou por um nome com menos chance de expor o governo, conforme se noticiou, nas páginas policiais.
    Com perfil técnico e experiência política, Borges não era o preferido por Anthony Garotinho, líder do PR na Câmara, mas teria sido chancelado pelo senador Nascimento. Por esse caminho, a presidente procura evitar o surgimento de novos escândalos e deixa para outro momento a opção de "fazer o diabo" -como disse.
    Quanto ao descalabro de mais um ministério, a Secretaria da Micro e Pequena Empresa, o provável indicado deverá ser o vice-governador paulista, Guilherme Afif Domingos (PSD). A proximidade do candidato com o governo tucano de São Paulo -oponente histórico do PT- já não causa surpresa. Como de hábito, vai para a conta do chamado presidencialismo de coalizão, justificativa padronizada para toda aliança oportunista.
    A explicação, embora tenha alguma pertinência, é na realidade bastante conveniente para acobertar a ausência de espinha dorsal nos partidos e representantes políticos, que se entregam sem escrúpulos ao vale-tudo eleitoral.

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