Imitações de filmes inundam o mercado
Diretor da maior produtora de clones de blockbusters afirma que nenhum de seus 120 projetos deu prejuízo
a) Um panda que luta kung fu e fala precisa defender um reino de uma criatura do mal.
b) Robôs alienígenas gigantes, que se transformam em veículos, usam a Terra como campo de batalha.
c) Jovem cultiva um pé de feijão que alcança as nuvens e liberta uma antiga raça de inimigos dos humanos.
Não parece difícil afirmar que os textos referem-se aos conhecidíssimos "Kung Fu Panda" (2008), "Transformers" (2007) e "Jack, O Caçador de Gigantes" --este último em cartaz no Brasil.
Mas os resumos também se encaixam perfeitamente em "As Aventuras de Jinbao", "Transmorphers" e "Jack, O Matador de Gigantes", três representantes de uma enxurrada de cópias baratas que não apenas estão incomodando os grandes estúdios norte-americanos como invadindo importantes festivais.
No Festival de Berlim, em fevereiro passado, o European Film Market, segunda mais importante feira de vendas do continente depois de Cannes, estampava banners, cartazes e outros materiais promocionais dos "mockbusters", um trocadilho com os termos blockbuster (arrasa-quarteirão, em inglês) e "mock" (do verbo "zombar").
Além de "Jinbao", produção chinesa com Jackie Chan na voz do panda, havia "Hansel & Gretel & The 420 Witch", uma versão maconheira do recente "João e Maria: Os Caçadores de Bruxas" e novos "Crepúsculos" intitulados "The Vampire Sisters".
O estande da The Asylum, maior produtora de "mockbusters" do mundo, promovia ainda clones de "The Walking Dead" ("Rise of the Zombies"), "Jurassic Park" ("Age of Dinosaurs") ou até do novo de M. Night Shyamalan, "Depois da Terra" ("AE "" Apocalypse Earth").
"Nós não somos inteligentes o suficiente para criar histórias originais e somos guiados pelos nossos compradores e parceiros. Se eles dizem que vai ter um filme de O Hobbit' e querem algo parecido, nós precisamos produzir", conta o bem-humorado David Michael Latt, cofundador da Asylum.
A empresa foi criada por ele com os executivos David Rimawi, Sherri Strain, demitidos da Village Roadshow, empresa comprada pela Warner--um dos estúdios mais copiados pela empresa.
"Não é vingança. Não guardamos mágoas. Nós amamos a Warner e nos damos bem com todos os estúdios", brinca Latt, que diz ficar triste quando um blockbuster do estúdio fracassa, como "Jack, O Caçador de Gigantes".
"É ruim quando isso acontece. Nós dependemos do interesse do público pelo assunto. Se eles vão mal, nós não vamos tão bem. Mas o nosso Jack' não deu prejuízo e ainda é melhor que o irmão rico", alfineta ele.
LUCRO GARANTIDO
Gozações à parte, o diretor garante que nenhum dos 120 longas da produtora perdeu dinheiro. Eles dividem o orçamento em três níveis, o mínimo sendo US$ 250 mil (R$ 500 mil) e o máximo US$ 2 milhões (R$ 4 milhões).
Cada produto é pago por parceiros internacionais de países onde o DVD ainda é forte. No Brasil, a Alpha era responsável pela Asylum, mas agora não há nenhuma distribuidora por aqui.
Nem sempre foi assim. A companhia foi criada para produzir filmes B de terror. Mas quando a versão de "Guerra dos Mundos", dirigida pelo próprio Latt, saiu com o épico de Steven Spielberg, tudo mudou.
A empresa vendeu, em 2005, 100 mil cópias apenas para a extinta rede Blockbuster, oito vezes mais que os títulos regulares da Asylum. "Somos apaixonados por filmes, mas estamos aqui para ganhar dinheiro e isso é o que nos move", diz o empresário.
Apesar de ser protegida pela justiça americana, que não considera plágio quando apenas os temas coincidem, a Asylum de vez em quando precisa mudar seus títulos. "Age of The Hobbits", por exemplo, que deixa bem claro o alvo da homenagem, foi levado à Justiça e virou "Clash of the Empires".
"Não foi culpa do estúdio, mas do dono na marca [Saul Zaentz, que possui os direitos da obra de J.R.R. Tolkien]. Não acreditamos ter infringido qualquer direito autoral e vamos provar isso", conta o executivo, lembrando que os "hobbits" de seu mockbuster referem-se aos Homo floresiensis, raça de pequenos humanos que teria vivido em uma ilha da Indonésia.
"Essa vitória mostra a importância de protegermos o trabalho original de nossa indústria criativa contra companhias como a Asylum, cujo modelo cínico de trabalho é designado para lucrar em cima do trabalho de outros", afirmou a Warner por meio de uma nota oficial.
Ironicamente, nenhum estúdio se pronuncia quando filmes similares "sérios" são produzidos. Caso do recente "Invasão à Casa Branca", com Gerard Butler e Morgan Freeman, e do inédito "Ataque à Casa Branca", da Sony, com Jamie Foxx, dirigido por Roland Emmerich ("2012").
"O quê? Hollywood se copia?", diverte-se Latt. "Estou chocado! Chamem os nossos advogados!"
Sucesso da Asylum inspira novas produtoras
DE SÃO PAULOO sucesso da Asylum tem inspirado novas produtoras. Na Índia, a Shemaroo Entertainment lançou o desenho "Kiara, The Brave" ("Kiara, A Valente"), sobre uma princesa guerreira ruiva, antes de a Pixar fazer "Valente" (2012).Até o Brasil tem a sua Asylum. A paulista VideoBrinquedo, que hoje aposta em produtos licenciados, como shows de teatro e brinquedos, vendeu, entre 2006 e 2007, 2 milhões de DVDs de "Os Carrinhos", que remete a "Carros", da Pixar.
Há cinco anos, a VideoBrinquedo vendeu os direitos de desenhos como "O Ursinho da Pesada" (inspirado em "Kung Fu Panda") para mais de 80 países. Hoje, ainda produz "Carrinhos", que está no oitavo capítulo.
A pirataria, ironicamente, fez com que a empresa diminuísse a produção --"Carrinhos de Páscoa" vendeu 200 mil unidades. "Uma vez, vi um camelô vendendo Carrinhos' por R$ 10 e eu falei que o oficial custava R$ 9,90", diz um ex-funcionário que não quis se identificar. "O ambulante me respondeu: É assim que me dou bem'."
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