quarta-feira, 10 de abril de 2013

Maestro de ruídos (Lenine)-Carolina Braga‏

Recuperado da dengue, Lenine apresenta amanhã em BH o show Chão. Músico celebra 30 anos de seu primeiro disco, Baque solto, e prepara a próxima trilha do espetáculo do Grupo Corpo 


Carolina Braga

Estado de Minas: 10/04/2013 

Aos 30 anos de carreira, Lenine não se cansa de afirmar: “Tive a sorte de descobrir cedo que tinha um público muito antenado com tudo que fazia e aquilo dava verdade ao meu discurso”. Entra ano sai ano, novos discos e DVDs surgem e turnês nacionais e internacionais são programadas. A indústria fonográfica já vive outra lógica, mas o pernambucano radicado no Rio de Janeiro ainda se mantém ligado ao que se deu conta lá no início.

“É por isso que dou atenção às redes sociais. São tantas mil pessoas que me acompanham. Temos uma relação de fato, porque é esse realmente o grupo de pessoas que dão verdade ao meu discurso”, reafirma. Se é assim, logicamente foi também pelo Facebook e Twitter que os mais de 355 mil seguidores foram informados esta semana que o compositor precisou interromper a turnê de Chão por culpa do Aedes aegypti. “Vocês realmente são demais, valeu pelo carinho e todas as mensagens!”, registrou pelo Face.

Dengue diagnosticada, e depois do devido repouso Lenine subirá ao palco do Sesc Palladium amanhã, para celebrar com o público de Belo Horizonte as três décadas de estrada. Ele garante que não é muito afeito a efemérides, mas são tantas datas exatas este ano que foi difícil resistir. Além dos 30 anos de Baque Solto, o primeiro LP, são 20 desde que ele e Marcos Suzano lançaram o excelente Olho de peixe.

“A música sempre foi uma ferramenta de aproximação e aprofundamento. Então, quando vi que tinha alguns números bacanas, fiquei primeiro orgulhoso de arrebanhar tanta gente nesse processo e me perguntei: por que não comemorar com essas pessoas?”. Assim será feito ao longo do ano. A segunda passagem de Chão em Belo Horizonte faz parte do pacote festivo que circulará o Brasil e exterior. Fora dele, nos próximos dias 20 e 21, apenas o público carioca presenciará o reencontro com Suzano no palco da novíssima casa Miranda. A ideia é que todas as comemorações, de alguma maneira, sejam transmitidas pela internet, pelo site oficial www.lenine.com.br.

Para Lenine, os encontros com parceiros e público podem carregar o curioso nome de “comemória”. “Uma comemoração com memória. Tem essa coisa de reencontrar as pessoas. São as escolhas que o levam para um caminho. Reafirmar é uma coisa bacana”, diz. Apesar de não negar o momento de balanço na carreira, Lenine acredita que a sensação de tempo só fica clara se você ficar contando. Não foi caso.

“Cada projeto que fiz na minha vida foi uma entrega tão profunda que quando ele se concretiza existe um exorcismo. Foi assim que se deu”, completa. São 12 discos, dois DVDs, 14 participações em álbuns de figuras como Guinga, Maria Bethânia, Moska, Marcos Suzano, Pedro Luís e a Parede e Kid Abelha. Sem contar as inúmeras vezes que foi gravado por outros artistas. É difícil mensurar o quanto há de memória nisso tudo.

Procura Lenine se define essencialmente como um compositor, o que, segundo ele, tem a ver com uma procura eterna. “Você não pode se confinar a algumas ferramentas. Mudo a cada projeto. Antes de começar um disco, quero saber o que existe de novo. Tenho esse tipo de desprendimento a qualquer regra anterior”. Se, para ele, cada disco é um exorcismo, diz ter entendido muito rapidamente que cada projeto é a fotografia de um momento. O show é o momento de deleite. Chão, o mais recente, resume muita coisa do que Lenine pensa sobre arte e sobre estar em um palco. O CD se diferencia de tudo o que ele fez até agora: bateria e percussão foram substituídas por canto de canário, pisotear de pedras, assovio de uma chaleira e até batida de coração. As letras carregam a mesma densidade.

“Ao longo da minha vida, fiz um banco de ruídos para ter certeza de que aquela ruidagem só eu vou ter. No caso de Chão, levamos isso ao extremo”, comenta. Organicidade é palavra-chave para definir o momento musical de Lenine. Descoberto isso, ele vem potencializando o exercício nos palcos do Brasil. “Nos demos conta de que poderíamos fazer um show surround, que era um sonho antigo. Realmente, é uma experiência sensorial. Daí o prazer que tenho”, completa sobre a versão ao vivo do disco.

Diferentemente das apresentações musicais tradicionais no teatro, Chão, com direção de arte de Paulo Pederneiras, tem as caixas acústicas também espalhadas pela plateia. O objetivo é garantir uma tridimensionalidade sonora. “Ainda tem um ano de Chão pela frente e é sempre muito impactante para quem assiste”, garante.


Corpo e alma da música

Seis anos depois de Breu (2007), Lenine foi novamente escolhido para compor a trilha sonora do novo espetáculo do Grupo Corpo. Já está tudo pronto, mas, guardado a sete chaves. “Uma das coisas mais bacanas dessa parceria é a relação de confiança que se estabelece. Toda a coreografia do Rodrigo, toda a cenografia, a luz, só acontecem depois da trilha pronta. Isso é muito generoso”, elogia. Sendo assim, Lenine se esquiva de dar qualquer detalhe sobre a música, a ser revelada apenas em agosto. Ele só garante que, desta vez, sofreu bem menos.

“A experiência com Breu foi modificadora, mas não sabia muito para onde ir. Era a primeira vez que trabalhava com o corpo de outras pessoas. Era um universo novo, não tinha referências. Desta vez, foi infinitamente mais fácil e mais divertido. Podia ousar, entender a raia de frequência da expressão, que tipo de estímulo e subsídios para a expressão poderia dar com a minha música”, explica. A nova montagem do Corpo tem estreia marcada para 7 de agosto, em São Paulo. A coreografia fará dobradinha com Parabelo, criação de 1998, com trilha de Tom Zé e Zé Miguel Wisnik.

Chão
Grande Teatro do Sesc Palladium, Rua Rio  de Janeiro, 1.046, Centro, (31) 3279-1500. Amanhã, 21h. Plateias 1 e 2, R$ 70 (inteira) e R$ 35 (meia); plateia 3, R$ 50 (inteira) e R$ 25 (meia). Ingressos na bilheteria do teatro, Av. Augusto de Lima, 420, Centro, ou pelo site www.ingresso.com.

Para celebrar o baque

Mariana Peixoto

Edu A. convocou os amigos para lembrar álbum de Lenine e Lula Queiroga
O que se passou naquele 1983, o cantor e compositor carioca Edu A. só ouviu de relato. Foi o suficiente para que ele desse sua própria contribuição. Há 30 anos era lançado Baque solto, o primeiro álbum de Lenine e Lula Queiroga. Não foi um sucesso estrondoso, como Olho de peixe, lançado 10 anos mais tarde. Mas foi o primeiro grande produto a reunir uma geração de músicos nordestinos que anos antes havia se radicado na capital fluminense. Junto a Lenine e Lula Queiroga, nomes menos conhecidos como os paraibanos Pedro Osmar (compositor), Alex Madureira (guitarrista) e Romero Cavalcanti (ilustrador) estiveram presentes. Pois para o álbum-homenagem Dias de Blumer, que ele assina como Filhos de Platão e amigos, Edu A. conseguiu reunir 80% dos artistas que participaram de Baque solto. 

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