quinta-feira, 30 de maio de 2013

A liberdade homoafetiva - FABIANA DAL’MAS ROCHA PAES


O GLOBO - 30/05/2013

Na França, protestos contra o casamento
homoafetivo acabaram em
prisões. Ali também, na cidade de
Cannes, o filme vencedor do prêmio
Palma de Ouro foi o “La vie d’Adèle”, sobre um
casal de lésbicas. No Brasil, inédita resolução do
Conselho Nacional de Justiça determinou que
os cartórios de todo o País registrem os casamentos
entre pessoas do mesmo sexo, as chamadas
relações homoafetivas. O partido PSC
ingressou com pedido para o reconhecimento
da inconstitucionalidade da resolução nº 175/
13 que tratou a questão. Em maio de 2012, o Supremo
Tribunal Federal já havia reconhecido a
união estável entre pessoas do mesmo sexo. Em
que pese a existência da decisão do Supremo
Tribunal Federal, muitos cartórios se negavam a
celebrar o casamento, o que fazia com que os
pretendentes tivessem que viajar de um Estado
ao outro na busca deste direito.

O movimento pela legalização de casamentos
homoafetivos não é novo. Na América Latina já
legalizaram os casamentos homoafetivos Argentina,
Uruguai e México (em dois estados).
África do Sul, Bélgica, Canadá, Dinamarca, Espanha,
França, Holanda, Islândia, Noruega, Nova
Zelândia, Portugal, Suécia, assim como seis
estados dos EUA já aprovaram nos seus parlamentos
o casamento homoafetivo. Portanto,
podemos afirmar que a decisão do Conselho
Nacional de Justiça brasileiro acompanha a tendência
mundial, não apenas dos costumes, mas
da evolução da jurisprudência e da legislação,
em garantir os direitos fundamentais aos homens
ou mulheres que desejam se casar e constituir
família.

A Constituição diz que o casamento é aquele
entre o homem e a mulher (artigo 226), mas em
nenhum momento veda o casamento entre pessoas
do mesmo sexo, e mais do que isso, garante
a igualdade entre todos os brasileiros, sendo vedada
a discriminação (artigo 5º). A interpretação
da lei não pode ser feita de forma literal,
mas sim deve levar em conta todo o sistema jurídico,
inclusive os tratados internacionais que
foram ratificados pelo Brasil — e todos vedam a
discriminação em razão do sexo.

O relacionamento homoafetivo existe e sempre
existiu desde as primeiras civilizações, mas
o direito nem sempre acompanha a realidade. O
Estado brasileiro é laico, portanto não admite
interferências religiosas na formulação de leis.
A palavra casamento não pode ser monopólio
dos casais heterossexuais, como pretendem algumas
correntes religiosas. As verdadeiras democracias
protegem toda a população, até os
grupos mais vulneráveis, e minorias como homossexuais,
indígenas, pessoas com necessidades
especiais, idosos, pessoas de distintas origens
e etnias.

Estamos caminhando para a modernidade e
esta decisão deve ser celebrada pela sociedade
brasileira. Há um largo caminho a ser percorrido.
O próximo passo é a aprovação do Estatuto
da Diversidade Sexual pelo Congresso Nacional
para dispor acerca da vedação à homofobia, a
possibilidade de casais homossexuais adotarem
crianças e adolescentes, dentre outros direitos
que devem ser expressamente garantidos. Ainda
subsistem a intolerância, o preconceito, a violência
e a homofobia. Ultrapassados estes obstáculos,
poderemos assumir a vanguarda do sistema
internacional de direitos humanos. 

Fabiana Dal’mas Rocha Paes é promotora de Justiça
e coordenadora do Núcleo de Direitos Sociais da
região de Sorocaba (SP)

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