quinta-feira, 30 de maio de 2013

Falta psicodelia a montagem atual de "Bonifácio Bilhões"

FOLHA DE SÃO PAULO
CRÍTICA - COMÉDIA
Falta psicodelia a montagem atual de "Bonifácio Bilhões"
MARCIO AQUILESDE SÃO PAULO"Bonifácio Bilhões" é uma comédia de costumes tipicamente brasileira. Escrita e encenada por João Bethencourt em 1975, combina a representação de tipologias sociais e o tom de protesto político.
A montagem em cartaz dirigida por Ernesto Piccolo mantém-se fiel à caracterização setentista em relação aos aspectos visuais.
Os matizes de psicodelismo explorados com beleza no cenário e figurino, no entanto, não se extrapolam para a iluminação --praticamente invariável-- e para a trilha sonora, que abre com "Whole Lotta Love", do Led Zeppelin, e depois desaparece da peça.
Essa platitude cênica atrela em demasia a eficácia do espetáculo à interpretação do elenco.
Na trama, Walter (José de Abreu), um economista de verve pretensamente socialista, ganha um prêmio de quase 4 bilhões de cruzeiros, mas, ao contrário do prometido na fila da lotérica, não divide a bolada com Bonifácio (Thiago Chagas, substituindo o ator Tadeu Mello).
Os dois antagonistas alcançam boas tiradas cômicas. Por meio de sua dicção vigorosa, José de Abreu executa com retidão a maledicência do personagem. Thiago Chagas concentra seus esforços na pantomima e nas expressões faciais clownescas.
Brilham individualmente, entretanto falta convergência na interação entre ambos.
O embate dialético presente na dramaturgia em muitos momentos não se converte em disputa dialógica no palco. As improvisações isoladas, por sua vez, são sagazes e cheias de graça.
A carência de direção, porém, fica patente na performance de Iara Jamra para Alzira, mulher de Walter. Salta aos olhos a falta de sensibilidade histriônica no registro construído para sua personagem.
Gestualidade infantilizada e vocalização caricaturesca não são condição sine qua non para a comédia, e o potencial dramático da atriz vê-se reduzido a um simulacro de seus papéis televisivos consagrados.
Com uma sequência de peripécias e desenlaces na segunda metade, a montagem ganha dinâmica e a comicidade inerente do texto fica mais saliente.
Os três atores evoluem bastante na parte final, quando transcendem as performances individuais em prol de respostas miméticas mais entrosadas.

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