Sombra no Egito
Golpe militar depõe primeiro presidente democraticamente eleito no país e provoca grave revés nas conquistas da Primavera Árabe
A insistência de Mohamed Mursi em uma agenda sectária e o fracasso na economia contribuíram para o golpe de Estado promovido pelas Forças Armadas, que não souberam respeitar as regras do jogo democrático e prestaram enorme desserviço ao que parecia ser o ideário da Primavera Árabe.
A Constituição do Egito foi suspensa e o país será liderado provisoriamente pelo chefe da Suprema Corte Constitucional.
Nos últimos dias, centenas de milhares de manifestantes haviam voltado à praça Tahrir, no Cairo, símbolo da Primavera Árabe. Desta vez, exigiam a renúncia de Mursi. Confrontos resultaram na morte de pelo menos 16 pessoas.
Os desgastes foram sobretudo políticos. Confiante na força da Irmandade Muçulmana, agremiação majoritária nas eleições do ano passado, Mursi tentou se impor sobre as demais forças do país. Nos atos mais controversos, se atribuiu superpoderes e referendou a toque de caixa uma Constituição elaborada por religiosos de seu grupo.
Essas ações desataram a ira das forças políticas seculares. Mursi foi acusado de desvirtuar o movimento que, há mais de dois anos, tirou do poder o ditador Hosni Mubarak. As antes execradas Forças Armadas agora se juntaram à oposição e trabalharam contra o presidente.
Muito da insatisfação recente se deve à economia paralisada pela instabilidade institucional do país. Só o turismo, principal fonte de divisas do Egito e responsável por 10% dos empregos, caiu cerca de 30%. Temores de insegurança afastaram os turistas, que eram 14 milhões em 2010 e foram 10,5 milhões no ano passado.
O índice de desemprego já está acima de 13%, e a inflação anual, que havia chegado a 4% em dezembro, voltou ao patamar de 8% de maio do ano passado, ainda antes das eleições. Com reservas internacionais em baixa, Mursi dependia cada vez mais de empréstimos da Arábia Saudita e do Qatar.
Mesmo com Mursi deposto, é temerário supor que a Irmandade esteja politicamente morta. A organização tem capilaridade suficiente para convocar manifestações de monta. Não se descarta cenário mais sangrento nos próximos dias.
Ainda que os militares cumpram a promessa de entregar o poder a um civil, parece óbvio que o presidente será tutelado. Uma democracia de fachada já seria grave. Tanto pior pelo precedente antidemocrático que as Forças Armadas egípcias abriram no maior país árabe.
Ilusões perdidas
Não era simples coincidência. Em 2009, quando Eike Batista estreou no posto de pessoa mais rica do país, a imagem do Cristo Redentor apareceu como um foguete decolando na capa da revista "The Economist". No ano seguinte, o Brasil cresceria vigorosos 7,5%.Era o auge da crença em um cenário auspicioso, impulsionado pela simbiose entre a demanda chinesa por commodities e a abundância de matérias-primas do Brasil.
As descobertas de reservas de petróleo no pré-sal elevavam o otimismo, e as políticas de inclusão contribuíam para o dinamismo da economia. Com a ascensão de milhões à classe média, formava-se um mercado robusto e ávido por bens de consumo duráveis.
Empreendedor arrojado e visionário, Eike Batista surfou como ninguém a onda favorável ao país. Seu discurso fazia sentido: o Brasil crescia, mas todos os setores de infraestrutura tinham deficiências; logo, investimentos seriam necessários.
O empresário e seus planos ambiciosos foram recebidos de braços abertos por investidores e bancos, incluindo o BNDES. Eike formou um império --com empresas nas áreas de petróleo e gás, mineração, construção naval, energia e logística-- sustentado mais por promessas do que por resultados.
Não era apenas do empreendedor o tom triunfalista. Enquanto ele prometia se tornar o homem mais rico do planeta, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, apostava que a economia brasileira se tornaria a quinta maior do mundo antes de 2015 --estava na sexta colocação em 2011.
Deu-se algo bem diferente: o Brasil caiu uma posição no ranking, e o empresário despencou do sétimo para o centésimo lugar na lista publicada pela "Forbes" em 2013 --isso antes mesmo de as ações da petroleira OGX terem derretido nesta semana, com queda acumulada de 93,6% em 12 meses.
Sonhos de grandeza e erros de gestão explicam, em larga medida, as expectativas frustradas.
A forte expansão do PIB em 2010 foi fruto de estímulos que turbinaram a demanda doméstica. Mas a teimosia em manter uma política fiscal expansionista e o improviso na administração da economia minaram a credibilidade do governo.
Também o dono do grupo X inspira menos confiança, já que suas metas se revelaram irrealistas. Acredita-se que seus negócios sobreviverão em versão reduzida, mas os tropeços devem lhe custar o controle do império.
O "x" de Eike Batista, outrora ícone da multiplicação da riqueza, agora simboliza melhor as incógnitas que pairam sobre o grupo --e sobre a economia brasileira.
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