segunda-feira, 29 de julho de 2013

MTV sinal fechado - Silvana Arantes e Thales de Menezes

folha de são paulo
MTV sinal fechado
Canal que fez a cabeça dos jovens nos anos 1990 ressuscitará na TV paga tentando atrair 'geração milênio' com música, mas sem videoclipe
SILVANA ARANTESDE SÃO PAULOA MTV Brasil será transferida para a TV paga no próximo mês de outubro. O anúncio da migração será feito hoje pelo conglomerado americano Viacom, detentor da marca, que estreou no Brasil em 1990, em sinal aberto.
A música, que está no nome do canal, vai seguir "no DNA da programação", disse àFolha Sofia Ioannou, diretora geral da Viacom International Media Networks Américas. Mas não na forma do velho videoclipe.
Com foco nos jovens da chamada "geração milênio", a nova MTV planeja produzir 350 horas de programação brasileira por ano. Serão reality shows e sitcoms nacionais. As principais atrações internacionais vão ser dubladas em português.
O canal aposta em sua habilidade de se comunicar com os jovens para não sucumbir à concorrência da internet.
"O jovem é um público com o qual não se pode falar como professor --porque ele não te escuta-- nem como pai e mãe --porque não te dá credibilidade. A MTV aprendeu a falar com os jovens com credibilidade", afirma Ioannou.
A transmissão da MTV Brasil em sinal aberto era viável graças a um acordo de licenciamento entre o Grupo Abril, que detém uma concessão de TV aberta, e a Viacom.
O fim do contrato foi o desfecho de um longo deficit operacional no braço televisivo da Abril. O sinal deve deixar de ir ao ar em agosto.
A Viacom quer relançar o canal na TV fechada logo em seguida e fixou a data de 1º de outubro para a estreia.
A meta é distribuí-lo a uma grande parcela dos seus 16,9 milhões de assinantes.
Sem revelar valores, Ioannou diz que o investimento da Viacom "é o maior feito num canal MTV em um ano nas Américas". A seguir, a entrevista que a diretora concedeu àFolha por telefone, de seu escritório em Miami.
Folha - Por que é que a Viacom decidiu levar a MTV para o cabo?
Sofia Ioannou - A estratégia é assumir o controle da nossa marca, particularmente em mercados com grande potencial de crescimento.
O crescimento de mais de 200% nos últimos cinco anos da TV paga no Brasil, o sucesso de nossos outros canais e o da MTV em nível global no modelo de TV paga nos deram a confiança de que levar o canal para a TV a cabo é sua evolução natural no Brasil.
Como será a programação?
O plano inclui "daily shows", realities de celebridades, sitcoms. Teremos o melhor da MTV mundial dublado para o português, casado com mais de 350 horas por ano de conteúdo produzido originalmente no Brasil para a geração milênio brasileira, que é a nossa audiência.
Nós nos apoiamos muito em pesquisas. Na última, o Brasil foi um dos mercados em que fizemos um investimento grande.
O que a pesquisa revelou sobre o público brasileiro?
A geração milênio brasileira é uma audiência muito feliz, que lida com um montante alto de dinheiro. Eles gostam muito de música, passam quase 50% do seu tempo vendo TV, 64% do seu tempo ouvindo música e 40% do seu tempo jogando videogame. A família é muito importante para eles, e quase 70% veem o melhor amigo como parte da família; 85% se sentem honrados de ser brasileiros e mais de 70% acessam a internet.
Como a MTV pretende recuperar a atenção do público jovem, hoje voltada à internet?
A geração milênio é um dos segmentos mais complicados para se tentar entender. Não se trata de um público que abandonou a TV para usar unicamente plataformas digitais. É um público que interage com plataformas digitais e TV.
Qual será o papel da música na programação?
Discutimos muito se a MTV Brasil deveria ter muita música ou não. Foi uma decisão que nos tomou um bom tempo. Quase 65% da geração milênio brasileira alivia o estresse ouvindo música. Com base nisso e no fato de a música ter formado grande parte da marca MTV, decidimos que ela tem de estar no DNA da programação. A música vai surgir em distintas facetas, mais diretamente ou como um dos elementos. O que me deixa feliz é que a participação da música no canal pode ser 100% local.
É quase um consenso que a linguagem do videoclipe envelheceu. Na nova MTV, a presença da música vai tomar formas que não a do clipe?
Sim. A geração milênio tem muitas plataformas para ver videoclipes. Não é preciso sintonizar um canal de TV. [A presença da música no canal] Será algo maior, como o World Stage, evento de música para o qual se voltam os olhos da MTV no mundo inteiro. Seria um show produzido no Brasil com um nome importante internacional e localmente. Estudamos fazer isso no Brasil em 2014.
A premiação anual VMB será mantida?
A decisão não está tomada, mas creio que seria algo diferente do VMB.
Os programas feitos no Brasil irão ao ar somente aqui ou em outros países também?
Meu plano é que o conteúdo seja tão forte que valerá a pena tirá-lo do Brasil e transmiti-lo, no mínimo, para outros países da América Latina e também Portugal e Espanha. Espero que seja o tipo de programa com força suficiente para cruzar fronteiras.
Qual é a sua opinião sobre a Lei da TV Paga brasileira?
Qualquer regulação [de mercado] que ponha barreiras complica a habilidade de um programador internacional, de prosseguir com o que nos parece mais importante, que é oferecer conteúdo bom para o público brasileiro.
Navegar dentro disso é um pouco mais complexo. Mas, ao fim e ao cabo, eles [a agência reguladora Ancine] têm suas razões positivas e não nos resta outra saída a não ser trabalhar ao lado deles.
As projeções de expansão da economia brasileira estão sendo revistas para baixo. A Viacom contempla um cenário de contração no Brasil?
Embora a gente entenda que a situação econômica possa afetar o nível de crescimento da TV paga no Brasil, ela seguirá crescendo em patamar importante, por nossas projeções. Além disso, marcas fortes como a MTV ajudam o mercado de cabo a se expandir ainda mais.

OPINIÃO
Busca pela garotada gera crise de identidade na emissora
THALES DE MENEZESEDITOR-ASSISTENTE DA "ILUSTRADA"Aos 23 anos, a MTV passará por uma grande mudança. Não será novidade para o canal de música que parece sempre adolescente, porque muda a toda hora.
Começou mais música do que TV. Depois, a música virou só um ingrediente de uma receita de entretenimento. Recentemente, programas brincalhões de auditório com bandas buscavam o meio termo.
Seus primeiros rostos, de gente que entende de rock e pop (Fabio Massari, Gastão Moreira, Zeca Camargo), foram sucedidos pela geração bonita e descolada, mas só esforçada no jornalismo musical (Didi Wagner, Leo Madeira, Carla Lamarca). Nos últimos anos, chegaram os engraçados (Marcelo Adnet, Dani Calabresa, Tatá Werneck).
As dificuldades em falar ao público jovem vieram da entrada da internet na vida da moçada. E vieram em duas ondas pesadas.
O primeiro golpe foi a possibilidade de ver videoclipes a qualquer hora na rede, principalmente na carona do YouTube. Por que esperar o clipe da banda favorita no horário que a programação da MTV determinar? Sem chance. O clipe se mudou de vez para outro lugar.
Mas o ataque maior, inserido numa discussão bem ampla, veio por causa da comunicação mais parruda, intensa e ágil que o conteúdo on-line permite. Os programas (musicais, humorísticos ou informativos) tentaram de todas as formas colar na internet. Dá-lhe insistentes pedidos de "entre agora no site e faça isso, faça aquilo" e apresentador lendo mensagens de telespectadores/internautas. Tudo sofrível --nada de culpá-los, não têm salário de roteirista.
O processo pode ter estreitado bastante a faixa etária da audiência. Nos últimos anos, no VMB, o "Oscar" da emissora, a escolha de clipe do ano por votação popular premiou bandas de apelo pré-adolescente como Restart.
O que virá agora, de casa nova? Prosseguir na infrutífera emulação da internet? Ou apostar em projetos radicais como a série "A Menina sem Qualidades", para públicos especiais?
Algo a se verificar na MTV renascida. Mais uma vez.

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