sábado, 31 de maio de 2014

João Paulo - Intolerantes são sempre os outros‏

Intolerantes são sempre os outros

João Paulo
Estado de Minas: 31/05/2014

Rachel Daniel mostra o retrato da filha sequestrada por militantes do Boko Haram, na Nigéria (Joe Penney/Reuters)
Rachel Daniel mostra o retrato da filha sequestrada por militantes do Boko Haram, na Nigéria

Freud definiu a religião como uma ilusão. Não se tratava de um juízo negativo. Para o pensador, em determinados assuntos não cabia a exatidão da ciência, mas a busca de realização de desejos. No mundo real, podemos estar certos ou errados. A ciência se tornou nossa medida por excelência nesse campo. No universo das grandes causas, o que vale é a crença.

Quem navega no mundo da religião sabe que as crenças, no seu limite, se equivalem, que elas traduzem nossa sede de ligação com o absoluto, com os antepassados e com os grandes valores. As religiões se avizinham da ética, se preocupam com a moral, são atentas à convivência como forma de garantir a continuidade dos povos e civilizações.

Certa vez perguntaram ao dalai-lama qual era a melhor religião. Ele respondeu rapidamente: a que torna a pessoa mais compassiva. A boa religião é a que nos faz melhores, mais tolerantes, mais amorosos e justos. Assim, cada crença teria algo que se somaria numa possível religião universal, uma espécie de grande acordo da sabedoria de todas as formas de fé.

Essa tentativa eclética de somar sabedorias ganhou na Renascença o nome de “filosofia perene”. Seria algo como o substrato que garantiria o solo moral de todas as formas religiosas. Em outras palavras, um núcleo comum, um mar de bondade que se comunicaria com todos os deuses e revelações. Para quem não tem fé, a filosofia perene poderia ser um tipo de grande acordo ético sobre o sentido da vida.

Essas reflexões vêm à tona quando o mundo parece conviver com um oceano de barbárie, que faz questão de ser filiar ao pensamento e às práticas religiosas. São ações de desumanidade aterradora, que ao mesmo tempo que conquistam a solidariedade de alguns países, se escondem no sentido inquestionável do dogma e da covardia dos povos. Nesses casos, quase sempre o intolerante é o outro. Os exemplos são hediondos.

A Justiça do Sudão, por exemplo, condenou à morte por enforcamento Meriam Yehya Ibrahim Ishag, grávida de oito meses, pelo fato de ela ter-se convertido do islamismo ao cristianismo para se casar com um cristão. A sentença é ainda mais cruel. Até que seja executada, foi destinada a receber 100 chibatadas pelo delito de adultério, já que seu casamento não é considerado legítimo pela lei islâmica. Morte anunciada, a ser acompanhada com leniência por uma comunidade internacional estática, a repetir com um esgar de nojo: o horror, o horror. E não passa disso.

Quem acha que se trata de um comportamento incivilizado, é só comparar com a forma como os grupos ultraortodoxos judeus se manifestaram durante a recente visita do papa à chamada Terra Santa. Para eles, o governo israelense estaria disposto a assinar um acordo que entregaria ao Vaticano o controle do prédio onde Jesus teria feito a última ceia com os apóstolos. Em outros termos, trata-se da negação do Estado em nome das crenças, sem qualquer justificação humana. Mais uma ação separatista numa terra que edifica muros em vez de propor diálogo.

Recentemente, o grupo Boko Haram, militantes por um Estado islâmico no Norte da Nigéria, se tornou célebre pelo sequestro de 200 garotas em uma escola. Mesmo com a condenação internacional, o grupo segue sua trajetória de horrores, atacando bases militares e matando civis, numa guerra que parece não ter fim. Há questões econômicas e morais na base desses grupos. A violência contra as mulheres e os homossexuais é uma das faces mais cruéis.

Curiosamente, os mesmos Estados Unidos que se manifestaram contra o Boko Haram parecem não se importar com a exportação da homofobia para países da África, por meio da ação de seus evangélicos. São milhões de dólares em doações para diversos países, num trabalho que mescla ação humanitária com ideologia que propaga discriminação contra gays, lésbicas e transgêneros. Sem lugar no reino de Deus, eles são apresentados como ameaça à sociedade.

No Brasil, com sua pretensa liberdade de religião, presenciamos recentemente a sentença de um juiz que manteve a veiculação de mensagens discriminatórias contra crenças de origem africana na internet, sob o argumento que não se tratavam propriamente de religiões. Para o juiz-teólogo, uma religião digna do nome só pode ter um Deus e precisa ter um livro sagrado (mesmo que ele contenha, como a Bíblia, milhares de erros crassos em ciência e moral).

Para muita gente, a religião – e especialmente os monoteísmos revelados – seria portadora de uma verdade moral que escapa a outras formas de conhecimento. Quem não crê, por esse raciocínio, seria menos humano, menos capaz de amar ao próximo, menos sensível à justiça e ao bem. Foi a ideologia que sustentou por muitos séculos as religiões próximas aos negócios do Estado.

A conquista da laicidade, nesse sentido, foi um avanço de civilização. Com ela, caiu por terra o exclusivismo moral das religiões e o bem se tornou uma responsabilidade dos homens e mulheres. A equação se inverteu: quanto menos religioso, mais humano. Quem não crê em Deus tem, por isso, muito mais condições de ser uma boa pessoa.

As religiões, todas elas, podem concorrer no campo do conforto da alma ou das lendas apaziguadoras do nosso medo da morte, mas devem ser banidas do Estado e da ciência, onde só contribuem com o atraso. Se Deus ama seus filhos, o melhor é matar o pai e tentar construir a grande família humana, onde todos sejam irmãos. Se a religião é futuro de uma ilusão, a política é nosso destino real e presente, mesmo que pequeno e comezinho. Somos gente, não filhotes de deuses. Caso contrário, só nos restará ficar esperando a morte de inocentes.

Inez Lemos - Seleção de ressentidos‏

Os atuais episódios de violência e a corrupção no Brasil têm raízes históricas e psíquicas que devem ser analisadas. A Copa do Mundo precisa apontar para a recuperação da cidadania e do pacto de civilidade


Inez Lemos

Estado de Minas: 31/05/2014


Grafite de Paulo Ito, num muro de São Paulo, imagem que ganhou as redes sociais e traduz o sentimento de parte dos brasileiros frente ao torneio (Nelson Almeida/AFP)



Como explicar a gênese da violência que assola o país? Depredação de ônibus, bancos, linchamentos aos supostos bandidos, execuções a pedradas, vasos sanitários e pauladas. Crueldade, vingança, ira e ressentimento. O caldo da maldade é engrossado dia a dia. Ao analisar os sinais de descontentamento e vandalismo, esbarramos em questões políticas e psíquicas. O inconsciente, ao ser contaminado pela realidade social, sofre os efeitos da vida política.

O descobrimento do Brasil fez parte de um projeto de modernidade, em sua corrida pela acumulação de riquezas. Somos filhos da pirataria, da contravenção e da corrupção. Filhos de uma relação de interesses – o português que engravidou a índia como forma de obter informação de quem aqui vivia. Estratégias de dominação. A arte de manipular para melhor reinar. Alienar, impedir que o outro participe, interaja. Quanto mais alienado, mais fácil de controlar. Contudo, o brasileiro, cansado de desrespeito e descaso, resolve se rebelar contra o poder público e privado. Não sobrou ninguém. A espada está no pescoço de todos nós.

O que move o mundo é o desejo insatisfeito. O capitalismo manipula, os políticos fingem que não escutam, mas a verdade é que não se controla um país oferecendo apenas pão e circo, celulares, tablets, lipoaspiração. O trabalhador, além de cartão de crédito, exige transporte, saúde e educação de qualidade. Anseia por dignidade, direitos, justiça. A desigualdade provoca revolta e ressentimento. O sonho agora é por igualdade de oportunidades. Punição aos ladrões de baixo e de cima. Quando o crime é uma prática da classe política, rebelar é a palavra de ordem entre os que sofrem as consequências.

O Brasil é terra de ninguém, onde as leis dificilmente são cumpridas, onde viceja o racismo, a homofobia e a intolerância. A onda fascista é um efeito da anomia, da farra e desfaçatez dos poderosos. Como circular ideias de ética, honestidade e honradez, se grande parte dos governadores, prefeitos e deputados direciona o olhar para suas contas bancárias? Educar e governar são tarefas intermináveis. Aprendemos a amar, respeitar e governar com os pais. Pai é aquele que, ao exercer a função paterna, simboliza a lei: interdita o desejo descabido. Cobrar doçura de um povo injustiçado é despautério. Sem o bom exemplo, os filhos continuarão no vandalismo. Seria o Brasil um convite ao banditismo?

Por que somos tão condescendentes com os políticos corruptos? Se a corrupção sempre foi um direito dos que dela se beneficiam, privilégios e injustiças sempre fizeram parte dos que detêm o poder econômico e político. Educar é barrar os filhos em seus impulsos destrutivos, inserindo-os nos limites da lei. Sem interditar, frustrar, a chance da criança tornar-se perversa é grande. A política é o palco privilegiado dos perversos, é onde eles são amparados em seus atos ilícitos e soltam as garras da ambição.

O passado coronelista e patrimonialista nos ensinou a utilizar o espaço público como se fosse privado. Ao mesmo tempo que o criticamos, repetimos posturas que condenamos. Como ultrapassar o atavismo moral que parece nos definir? Mudar uma cultura, fundar outra ideia de nação, quão difícil! É trabalho profundo, há de se tocar entranhas e rever o lixo recalcado. Todo sintoma aponta para uma tentativa de cura. Ao mesmo tempo que denuncia o que não vai bem, revela um gozo – prazer e desprazer na compulsão à repetição. Reclamamos dos corruptos, mas somos tolerantes quando eles defendem nossos privilégios.

Ao analisar a violência, penso na palavra ressentimento. Res-sentir – sentir duas vezes, não perdoar, guardar mágoas, alimentar vingança, não se implicar nos conflitos. Ressentimento é sentimento que fixa o sujeito na neurose. A neurose paralisa o sujeito no sintoma, impedindo-o de avançar nos bons sentimentos. O ressentido é um infeliz, pois se cristaliza na amargura. O brasileiro, que sempre gozou da condição de ressentido e trapaceado, agora quer, nas ruas, exigir políticas públicas de qualidade. Melhor que reclamar em mesa de bar ou descontar no erário, engrossando o caldo dos corruptos.

Desejo de desforra

A exposição de um cotidiano promíscuo provoca no brasileiro o desejo de desforra, de botar para quebrar. Se para o político a demanda da população é o que menos conta, se poucos se ocupam com suas necessidades, é de se esperar que o muro se rompa. No filme Getúlio, quando não havia mais o que esconder, o presidente Vargas confessa: “Nunca me pediram nada para o país (ou para povo), sempre me pediram algo para alguém”. A violência das ruas metaforiza o filho lesado contra o pai perverso. Passa-se ao ato de forma impulsiva, impensável. É sangue fervendo na veia.

Nossa história ressalta a ausência de interdição capaz de regulamentar o apetite pelo gozo e organizar um quadro social que outorgue a cidadania. O romance familiar brasileiro, nossa mitologia, produziu a fantasia do privilégio e da violação de direitos. Revisitando as determinações histórico-sociais dos processos de subjetivação, identificamos o descaso pela res-pública (coisa pública). O ethos que nos funda é o do prazer e não o da felicidade. A imagem que vendemos é do paraíso sexual. Mulheres gostosas e de fácil acesso.

País idílico, frívolo, que não soube se fazer respeitar. A Copa promete jogos e orgia. Goleada no campo e na cama. A volúpia e o fascínio que exercermos no imaginário dos estrangeiros condena nossa filiação. Submetidos ao imperativo do gozo, deixamos de cobrar o ouro que o mundo nos deve. Filhos de um amor pérfido. Sedução e traição.

A filha pobre e de pouca escolaridade, diante do dinheiro, se corrompe e se prostitui. Promiscuidade que lhe atravessa a alma e a lança na sarjeta das perdidas. Menina de um futuro morto. O que não nos faltam são motivos para subverter a ordem, romper com a imagem do negativo social. Chega de manipulação. Mídias e governantes nos alienam e dominam. Submissos aos interesses do mercado, nos fixamos no gozo.

A herança escravocrata explica a sujeição ao grande outro e a vocação à dependência. Consumista, imediatista e permissivo. Reserva libidinal do mundo. Aos olhos dos estrangeiros, a imagem será de eterno prostíbulo? Como explicar a tendência da mulher brasileira à nudez? Nossa condescendência com os sedutores revela o fracasso da função paterna. Adoramos nos exibir. Do carnaval ao Facebook, não perdoamos os flashes. Repetiremos na Copa o destino colonial? Permitiremos que o estrangeiro entre e explore o melhor, seja açaí ou adolescentes?

Sem Marx e Freud, sem pudor e ética, vencerá a violência. O niilismo quer acabar com a consciência social – utopia por maior distribuição de renda e oportunidades. O fantasma fundamentalista, aliado ao obscurantismo que se esconde nas religiões de esquina, prega a ignorância e a insanidade. Viver é enfrentar contradições. Saber lidar com os paradoxos humanos.

A anomia revela a desorganização social, a ausência de leis. Para que o tecido social se articule, é necessário mais que renúncia pulsional. Não se constrói uma nação apenas com repressão. O respeito aos pais se deve ao amor – o temor apenas é insuficiente para que a criança internalize a lei. Para que o brasileiro se anime e torça pelo Brasil, é preciso haver paixão. É preciso motivo para que o filho torça pelo pai. Contudo, a questão da violência no Brasil, antes de ser política, é psíquica.

Se a Copa servir para deflagrar a consciência de cidadania, que indica que a responsabilidade na construção de um país é de todos, valeram os investimentos. Se servir para estancar o masoquismo e investigar a condição de vítima, melhor ainda. Toda neurose, todo lugar de gozo, responde por uma filiação. A violência tanto pode ser efeito de uma metáfora paterna inconsistente, como do desamor do pai pelo filho. Como respeitar a casa se nela somos violentados, desprezados? Por tudo isso é difícil para o brasileiro sair às ruas com bandeiras e apitos. No lugar da torcida, prepara-se a revolta. Como sustentar um outro lugar, uma outra filiação?

O significante que operou como referência simbólica foi o da permissividade – riqueza e sexo em terras tropicais: praias, borracha e minério. Quando a filiação fracassa, a maledicência ganha espaço e se instaura como arremedo da função paterna. Colonização e exploração, corrupção e impunidade, permissividade e leviandade. A história e os significantes nos condenam. A onda de ações predatórias revela a condição de rebotalho, ela está no inconsciente do sujeito e não em sua condição econômica. Traço de filho rejeitado, com mãe omissa e pai ambicioso. Filho do português com a índia, do coronel com a escrava. Como reparar as perdas? Não estariam os black blocs denunciando o fracasso da função paterna?

. Inez Lemos é psicanalista.
E-mail: inezlemoss@gmail.com

ENTREVISTA/JOSÉ LUIZ PASSOS » O delírio e o cotidiano‏

Romancista pernambucano fala sobre as tendências e os desafios da ficção brasileira contemporânea


Nahima Maciel
Estado de Minas: 31/05/2014


 (Alfaguara/divulgação)


O diálogo e a descrição são instrumentos importantes para o escritor pernambucano José Luiz Passos. Ao contrário do que pensam muitos críticos, ele não encara a dupla mais antiga da literatura como antiquada ou ultrapassada. São as descrições e os diálogos que fazem de O sonâmbulo amador, ganhador do Prêmio Portugal Telecom 2013 e do II Prêmio Brasília de Literatura, um livro diferente. A narrativa se destacou em meio a uma leva de romances muito marcados por histórias pessoais e universos urbanos e colocou os holofotes sobre Passos, que estreou na ficção com Nosso grão mais fino, em 2009. O sonâmbulo do título é Jurandir, funcionário de uma fábrica de tecidos que se recusa a encarar certos traumas. A narrativa repartida em blocos nos quais o personagem transita entre o delírio dos próprios sonhos, um suposto hospital psiquiátrico e o cotidiano real e cru conduz o leitor para um mundo psicológico que Passos descreve como “do autoengano”.

Professor de literatura e cultura brasileira na Universidade da Califórnia (UCLA) em Los Angeles e radicado nos Estados Unidos há 19 anos, o pernambucano acaba de lançar Romance com pessoas — A imaginação em Machado de Assis, no qual traça um paralelo entre a obra do bruxo do Cosme Velho e a produção de William Shakespeare. A conexão está explícita no fascínio de Machado por Otelo e na ideia do engano associado à traição, fundamental na trama de Dom Casmurro.

Nascido em Catende, no interior de Pernambuco, em 1971, Passos estudou sociologia antes de se embrenhar academicamente pelas letras. Em 1998, depois de concluir o doutorado em Berkeley, uma das unidades da UCLA, a universidade o contratou como professor temporário de literatura brasileira. Em 2007, Passos foi convidado para integrar o corpo docente e, depois de um concurso, passou a ocupar a cadeira permanentemente, dessa vez na unidade de Los Angeles.

Tem-se falado muito que o Brasil vem passando por uma onda de autoficção na literatura contemporânea. Você concorda? O que acha?

Houve algumas obras interessantes e importantes nesse campo nos últimos anos e gerou-se esse debate. Luciana Hidalgo tem escrito sobre isso, Ricardo Lísias também. Tudo depende de como se define autoficção, porque autoficção começa muito antes desse boom brasileiro, ela é muito presente na literatura francesa e argentina, menos na anglo-saxã, mas muito presente na europeia. Acho que a relação da autoficção com a ficção propriamente dita é a de um jogo numa aposta de continuidade entre a matéria representada e a suposta matéria vivida pelo seu autor. O grande risco é você fazer o seu leitor a pensar que autoficção é autobiográfica, porque não é o caso. Os romances de autoficção não são autobiográficos, são sobre os outros, sobre dramas com os quais você simpatiza ou não, pelos quais você sente fascinação. Você se coloca como observador participante, é como aquela metodologia da observação participante de antropologia, em que você entra num sistema cultural, observa um sistema cultural, se acusa em um sistema cultural. Esse estranhamento produz significação, mas você não escreve sobre você. O problema da autoficção é que as pessoas não têm discernimento, não escrevem obras fortes o suficiente e acham que, comentando experiências pontuais meramente autobiográficas, estão fazendo muita evolução no campo da ficção. Não é o caso.

O sonâmbulo amador é um dos poucos livros que trata de uma temática diferente da que vem sendo explorada por boa parte dos jovens autores contemporâneos brasileiros, muito centrados em um drama de classe média com o qual estão familiarizados. Pode contar um pouco sobre o livro?

Acho O sonâmbulo um livro diferente da tendência mais corrente na literatura brasileira, que me parece ser mais urbana, mais voltada para a experiência contemporânea enfatizando questões de identidade, de movimentos sociais, de violência. E O sonâmbulo amador volta para certas estratégias literárias e até semióticas de romances clássicos do nosso cânone, da formação e da deformação do conceito que o indivíduo tem de si mesmo. É o sujeito que está em risco, mas não consegue aceitar esse risco. O livro surge de uma costela de meu primeiro romance, Nosso grão mais fino, que é a história de um químico, e tem um repasse de 40 anos da vida dele e da relação que estabelece com a amante. O capítulo cresceu muito, eu guardei e tive essa vontade de escrever um livro sobre alguém prestes a se aposentar que é forçado a reavaliar sua própria vida.

A descrição também é importante no livro. Alguns textos críticos dizem que o romance contemporâneo não pode se prender a descrições. O que você acha disso? E qual o risco do diálogo? A verossimilhança é importante no romance contemporâneo?

Estava me referindo ao debate sobre a falta de lugar ou a sem razão de narradores oniscientes ou em terceira pessoa na ficção contemporânea. Como se essas técnicas tivessem sido enterradas com o século 19, como se tivessem ficado para trás. Meu argumento é que, na verdade, a ficção contemporânea pode lançar mão de todas essas técnicas desde que a descrição esteja integrada ao movimento da trama, a uma revelação importante sobre a personagem, a um ponto de vista associado ao narrador que não existiria (sem ele). A descrição é parte da ação, não é uma descrição morta, como são alguns dos romances mais clássicos da primeira metade do século 19. É como dizer: “a gente não pode mais usar o verde na pintura contemporânea porque verde significa esperança e não existe mais esperança no mundo contemporâneo”. Não é por aí.

E como isso pode ser interpretado na ficção?

Acho que você pode lançar mão de narradores em terceira pessoa e descrições. E o diálogo, eu acho difícil de dominar. Extremamente difícil, porque na língua portuguesa há esse divórcio tão grande entre o que é oral e o que é escrito, entre a norma culta e a norma falada, entre o coloquial e o erudito. Toda vez que você faz alguém falar, você sofre uma marcação sociolinguística muito forte. É uma opção que o escritor tem que tomar desde o início, e ela é enganosa. Muitas vezes as pessoas acham que os romances têm que falar com a voz contemporânea, coloquial, quando na verdade acho falso supor que uma obra escrita possa ou deva acompanhar a norma falada só porque a norma falada parece mais aderente à realidade. A aderência à realidade é uma convenção da ação literária, então uso uma mescla das duas sem exagero.

Ainda há pouca literatura que trata de questões centrais para uma maioria da população?

A literatura no Brasil sempre foi feita por poucos e para poucos, e isso se explica demograficamente e estatisticamente de modo muito simples: é um país sem hábito de leitura e com índices de analfabetismo muito altos quando comparados a países com a mesma força econômica. E os índices de leitura na nossa elite, particularmente entre os jovens, não são tão representativos assim. O consumo sempre foi mais especializado, um consumo de nichos: você tem o nicho da alta ficção, o nicho dos consumidores e produtores de poesia, o nicho do romance de ação ou aventura, ou do romance rosa. O importante é que, levando-se em conta que a literatura é um direito de todos, que a expressão individual na língua é um direito de todos, que a imaginação é um direito de todos, devemos fazer todo o possível para que essas formas de representação estejam disponíveis para mais e mais pessoas. Por outro lado, os índices atualmente são muito maiores do que há 20, 40 anos, e isso é um sinal de grande progresso e inclusão.

A classe média baixa não está representada na literatura brasileira?

Você pode usar o mesmo argumento: se o romance não representa certas experiências, a pintura cubista também não representa certas experiências. Nem todas as formas de expressão podem representar tudo, porque aí teríamos uma pasteurização de tudo. Seria a mesma coisa que vender produtos que precisam ter a cara do consumidor. A literatura da qual eu gosto é a literatura que me desloca, me desarma, me provoca, é mais difícil, mais densa, tomo mais tempo para passar por esses livros, volto a esses livros. E há outros tipos de literatura. O bom da literatura é que é como a culinária: você não come foie gras e bebe champanhe todos os dias. Eu consumo romances policiais e vejo seriados de televisão, mas também leio Guimarães Rosa e Joyce. Não vejo necessidade de afirmação de uma regra única. A outra questão é mais social, que é o acesso da grande população a esses bens simbólicos como consumidores e como produtores. E, para isso, é preciso tanto uma política de cultura quanto de educação.

Morar fora do Brasil e viver cotidianamente uma outra língua tem influência na sua literatura?

Sou casado com uma pernambucana, tenho dois filhos que falam português em casa, mas minha atuação profissional é muito mediada pela língua inglesa, assim como meu consumo de ficção contemporânea, cinema, tudo. Escrevo ensaios críticos em inglês, poema, ficção, tenho uma peça em inglês. Acho que há uma influência grande, sim, e acho particularmente notável nos dois romances. No primeiro, vários resenhistas destacaram a relação com Faulkner, o romance do Sul dos Estados Unidos, que leio muito. E a ficção do romance inglês está muito presente em O sonâmbulo amador. Romancistas como Henry James, que era americano e se naturalizou inglês, e Kazuo Ishiguro, me influenciaram muito a alcançar esse tom para a voz de Jurandir.

Romance com pessoas

. De José Luiz Passos
. Alfaguara, 400 páginas. R$ 46,90

O sonâmbulo amador
. De José Luiz Passos
. Alfaguara, 270 páginas. R$ 39,90

Histórias dentro da história - Carolina Braga

Estado de Minas: 31/05/2014 



Hoje é dia de Maria chegou à televisão com visual deslumbrante e texto cheio de referências literárias (Renato Rocha Miranda/Divulgação)
Hoje é dia de Maria chegou à televisão com visual deslumbrante e texto cheio de referências literárias

Quando fala sobre o livro Hoje é dia de Maria Borralheira – Intertextualidades do roteiro da minissérie televisiva, a professora Myriam Pessoa Nogueira pensa logo em um banquete. Para muita gente é assim: quanto mais pesquisa, quanto mais conhece, mais saboreia os detalhes de cada menu. É de se imaginar o quanto se “lambuzou” ao se debruçar no trabalho de desvendar as intertextualidades contidas no roteiro da minissérie Hoje é dia de Maria. O livro será lançado hoje, a partir das 14h, na Livraria Mineiriana (Rua Paraíba, 1419, Savassi).

Exibida em duas temporadas entre 2005 e 2006, a microssérie marcou a história da teledramaturgia brasileira pela ousadia na experimentação de linguagens, característica do diretor Luiz Fernando Carvalho. O roteiro, baseado na dramaturgia de Carlos Alberto Soffredini, foi elaborado pelo próprio Carvalho em parceria com Luís Alberto de Abreu. Em 2006, o que foi para a televisão virou livro e nele Myriam Pessoa Nogueira se baseou para desenvolver a dissertação de mestrado no Departamento de Letras da PUC Minas. O trabalho foi defendido em 2009.

Como a autora salienta, apesar de se tratar de uma obra audiovisual, concentrou-se em rastrear as relações intertextuais contidas no livro. “O roteiro de Hoje é dia de Maria não foi construído a partir de uma adaptação de uma obra apenas, mas de um processo de reciclagem cultural, presente na estilização feita pelos autores da microssérie, adaptando à realidade e à cultura nacionais elementos da cultura universal e, ao mesmo tempo, resgatando da oralidade popular outros elementos, tidos como folclóricos, e consagrando-os num padrão considerado elitista dentro da televisão brasileira, determinado já pelo horário de exibição, pelo público a que se destina e pelos profissionais envolvidos”, afirma na introdução.

Hoje é dia de Maria Borralheira – Intertextualidades do roteiro da minissérie televisiva  é dividido em quatro capítulos e cada um deles com uma referência aos episódios televisivos. No primeiro, Myriam Pessoa Nogueira se debruça no conceito de intertextualidade a partir da perspectiva do francês Gerard Genette. Ele entende o termo como “uma efetiva copresença de dois textos”. No capítulo seguinte, a professora se dedica a caracterizar gêneros literários, contos tradicionais e também o que define a narrativa dos contos maravilhosos, ou seja, daqueles ligados “ao extraordinário, ao insólito”.

O que é próprio da linguagem televisiva – ou mesmo cinematográfica – é detalhado no capítulo 3. À medida em que comenta a estrutura do roteiro, a autora identifica, de fato, as intertextualidades. “Hoje é dia de Maria é um verdadeiro mosaico de citações, uma ‘colcha de retalhos’”, salienta. As matrizes da trama podem ser encontradas em contos populares orais compilados por Sílvio Romero e Câmara Cascudo. Há, ainda, referências a outros clássicos da literatura brasileira e universal. O trabalho de identificação feito por Myriam é minuscioso.

“A adaptação acontece de forma predominantemente parafrástica, havendo citações diretas, como a do poema ‘O lutador’, de Drummond, entremeado de um estribilho novo”, afirma. Foram encontradas também referências a obras de Monteiro Lobato e especificamente a Macunaíma, de Mário de Andrade. O teatro não é excluído da análise de Myriam Pessoa Nogueira, já que esta também é uma característica de linguagem que ficou muito marcada na microssérie. Dessa seara, foram identificadas intertextualidades com Ésquilo, Shakespeare e Brecht.

Ao alcançar as “franjas do mar”, como diria Maria, Myriam conclui que o roteiro dessa obra-prima da teledramaturgia brasileira se constitui “a partir de um conjunto de obras literárias e de todo um universo oral, em que o movimento de estilização realizou a tessitura entre os textos”.

HOJE É DIA DE MARIA BORRALHEIRA
• De Myriam Pessoa Nogueira.
• Editora Mineiriana, 125 páginas, R$ 39,90
• Lançamento hoje, às 14h, na Livraria Mineiriana, Rua Paraíba, 1.419, Savassi, (31) 3223-8092

Na terra dos Máicons‏ - Ana Clara Brant

Na terra dos Máicons 
 
Coletânea de perfis escritos por Ruy Castro, Os garotos do Brasil recupera a história de antigos craques e homenageia a memória dos grandes cronistas 
 
Ana Clara Brant
Estado de Minas: 31/05/2014


Biógrafo de Garrincha e Nelson Rodrigues, Ruy Castro mostra que tem gente de verdade por trás da bola (Fábio Motta/AE)
Biógrafo de Garrincha e Nelson Rodrigues, Ruy Castro mostra que tem gente de verdade por trás da bola

Outro lançamento do ramo é Os garotos do Brasil – Um passeio pela alma dos craques, de Ruy Castro, que reúne textos publicados em alguns jornais e revistas nos últimos anos. Com seu estilo leve e saboroso, Ruy vai revelando o caráter, os sonhos e as motivações de alguns dos nossos maiores ídolos. Autor de uma obra-prima sobre o tema, a biografia de Garrincha, A estrela solitária, o jornalista lembra jogadores de ontem e de hoje, mas não esconde sua predileção pelos craques do passado, como Pelé – cujo primeiro apelido foi Gasolina, como conta no capítulo “Ele, Pelé – disse Edson”–, Zico, Sócrates e Heleno de Freitas, entre outros.

Uma das crônicas de destaque recorda o saudoso Bellini, o eterno capitão da Copa de 1958, que imortalizou o gesto de levantar a taça e que morreu no começo deste ano. Sua trajetória nos gramados, a fama de galã e o episódio com Mauro, que se autoescalou no grito. Sem falar na história de sua estátua, localizada na porta do Maracanã. Enquanto o corpo é do jogador, a cabeça é do cantor Francisco Alves. Isso porque o responsável pela iniciativa, o empresário Abraão Medina, teria ordenado ao escultor Matheus Fernandes que fosse assim. Uma dupla homenagem.

Em outro texto, Genealogia dos Máicons, o jornalista conta que estava assistindo a um jogo do lateral da seleção, Máicon, atualmente no Roma, e ficou refletindo como teria começado essa onda. “Fico imaginando o primeiro pai que entrou num cartório para registrar o filho como Michael e cantou o nome para o escrivão. Ou o pai o pronunciou errado e o escrivão o seguiu no erro, ou o pronunciou certo, mas o escrivão escorregou ao escrever. Enfim, ali nasceu o primeiro Máicon. Mas como terá nascido o segundo? E o terceiro, o quarto e os milhares de outros? Como não existe nenhum Máicon maior de 30 anos, imagino que o processo se deu quando o jovem Michael Jackson começava a empolgar futuras jovens mães e a fazer com que elas dessem o seu nome aos filhos”, reflete Ruy Castro.

Além dos jogadores, Ruy fala de outros craques, que usavam as palavras como quem dá um drible no adversário. Entram em cena Nelson Rodrigues – sobre quem escreveu a excelente biografia O anjo pornográfico –, com suas expressões quase míticas; e seu irmão Mario Filho, um marco na imprensa esportiva brasileira. Como lembra Ruy, “durante todos os anos 30 e pelo menos metade dos 40, Mario Filho já era uma instituição, enquanto Nelson era um virtual desconhecido. Mesmo com o estardalhaço da estreia de Vestido de noiva, em dezembro de 1943, ainda havia quem se referisse a ele como ‘irmão do Mario Filho’. Hoje, Mario é o ‘irmão do Nelson’”.

Os garotos do Brasil – Um passeio pela alma dos craques

• De Ruy Castro
• Foz Editora
• 140 páginas, R$ 36,90

Histórias do país da bola - Ana Clara Brant

Safra de livros aproveita a onda da Copa do Mundo e traz um interessante relato sobre a histórica rivalidade entre brasileiros e argentinos nos campos de futebol


Ana Clara Brant
Estado de Minas: 31/05/2014 0



Os baixinhos Romário e Maradona são exemplos de jogadores que representam a paixão de cada país pelo futebol (Paulo Whitaker/Reuters)
Os baixinhos Romário e Maradona são exemplos de jogadores que representam a paixão de cada país pelo futebol

A Copa do Mundo já está batendo à porta e não só as seleções começam a chegar ao Brasil. Dezenas de publicações sobre o tema pipocam nas livrarias. Uma das mais interessantes é Os hermanos e nós, dos jornalistas Ariel Palacios e Guga Chacra, que faz uma curiosa análise do futebol argentino.

Ariel, que muita gente pensa que é argentino pelo característico sotaque, nasceu em Londrina, no Paraná e vive em Buenos Aires desde a década de 1990. Guga Chacra, que também morou na capital argentina, atualmente é comentarista de política internacional. Os dois são comentaristas em programas da Globo News, na TV paga.

E foi a experiência no país vizinho e o amor pelo futebol que os levaram a contar de maneira saborosa histórias sobre vários temas ligados ao esporte na Argentina: a origem dos clubes, a comparação com os times brasileiros, as principais rivalidades, os torcedores ilustres, os grandes craques, a relação com a ditadura, o fanatismo das torcidas. Os autores falam ainda da culinária futebolística e do grande sucesso da seleção gay argentina (três vezes campeã mundial, superando até mesmo o bicampeonato da seleção convencional).

O livro elucida muitas dúvidas. Por exemplo: é verdade que os hermanos nos chamam de macaquitos? De acordo com os jornalistas, isso não passa de mito. Diversos jornalistas argentinos que trabalham no setor esportivo há décadas indicaram que o termo simplesmente não existe. Até porque a palavra indicada para macaco no idioma espanhol seria mono e, no diminutivo, o certo seria monitos.

Um dos capítulos mais curiosos de Os hermanos e nós é o dedicado às superstições. São casos como o de um treinador que utilizava sempre a mesma gravata em todos os jogos; outro que proibiu os atletas de comerem frango na concentração, porque acreditava que dava azar; ou até de um goleiro que urinava no gramado para dar sorte.

Na Copa de 2010, muitos torcedores teimaram que a Argentina só conquistaria a taça se Lionel Messi aderisse a um formato capilar parecido com o encaracolado de Diego Maradona em 1986, a última conquista de um mundial pelos argentinos. Houve até campanha na internet para convencer o craque do Barcelona. No entanto, Messi continuou com os cabelos lisos.

Por falar na Copa do México, foi durante esse torneio que surgiram as principais crendices. Quando a seleção azul e branco ainda disputava a primeira fase, o ônibus que transportava o escrete quebrou, o que obrigou os jogadores a utilizarem táxis para chegar ao local do jogo. O time venceu a partida, levando o técnico Carlos Bilardo a acreditar que os táxis haviam ajudado a equipe a ganhar. Por causa disso, durante todo o torneio, a delegação utilizou esse meio de transporte e acabou se sagrando campeã. Se foi efeito da superstição do técnico, isso ninguém tem como provar…

Maldição e rivalidade Foi logo depois dessa conquista que surgiu a chamada “maldição” da Virgem de Tilcara. Quando a seleção argentina preparava-se para ir para a Copa do México, Bilardo levou 14 jogadores (entre eles o jovem Maradona) para treinar em um lugar de elevada altitude, com o objetivo de adaptar-se às condições mexicanas. A escolhida foi Tilcara. Após dias de treino, o técnico e os atletas foram até a pequena igreja local – Senhora do Rosário, construída em 1865 – para prometer à Virgem que, se a Argentina ganhasse o Mundial, voltariam a Tilcara em peregrinação. Ajoelhados na frente do altar, Bilardo e os jogadores juraram que levariam o troféu da Fifa para a Virgem.

Poucos meses depois, parcialmente graças à “mão de Deus”, a Argentina venceu a Copa. No entanto, a Seleção jamais retornou para pagar a promessa. Desde então, coincidência ou não, os argentinos nunca mais venceram uma Copa do Mundo.

É claro, que a rivalidade entre brasileiros e argentinos não ia ficar de fora do livro. Mas será mesmo que o Brasil é o grande adversário? Ariel e Guga entrevistaram alguns experts no assunto, como o acadêmico Pablo Alabarces, da Universidade de Buenos Aires (UBA), que junto do brasileiro Ronaldo Helal (da Uerj) realizou um debate interessante sobre a relação futebolística entre os dois lados da fronteira. E cunharam uma frase lapidar: “Os brasileiros amam odiar a Argentina, enquanto os argentinos odeiam amar o Brasil”.

Os jornalistas revelam que é comum ver um argentino com a camisa da Seleção Brasileira nas ruas, fora do período de Copa, e que o Brasil já foi de fato o principal rival – da mesma forma como o Uruguai foi o principal adversário argentino de 1910 a 1960. Depois da Guerra das Malvinas, em 1982, muita coisa mudou. Hoje, o Brasil não é mais o maior rival da Argentina, mas a Inglaterra. O grande sonho dos nossos vizinhos seria derrotar a seleção canarinho nas semifinais e, na sequência, estraçalhar os ingleses na final de uma Copa do Mundo.

Os hermanos e nós
• De Ariel Palacios e Guga Chacra
• Editora Contexto
• 256 páginas, R$ 39,90

Orelha

Estado de Minas: 31/05/2014 



Manifestações contra a Copa: herança de junho de 2013 em debate (Nelson Almeida/AFP)
Manifestações contra a Copa: herança de junho de 2013 em debate

A voz das ruas


Perto de completar um ano, as jornadas de junho de 2013 ainda desafiam o entendimento de cientistas políticos, sociólogos, jornalistas e estudiosos da nova forma de comunicação que atravessou os protestos no Brasil e no mundo. Ruas e redes: dinâmicas dos protestosBR, organizado por Regina Helena Alves da Silva, enfrenta o tema com textos dos pesquisadores do Centro de Convergências de Novas Mídias (CCNM), da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). A coletânea mostra que não é mais possível ignorar, silenciar e tornar invisíveis as novas dinâmicas, os novos instrumentos e atores, como também os renovados lugares de fazer política. “Não é um livro sobre esses movimentos, suas identidades e reivindicações, é um livro sobre a dinâmica, o tempo e as temporalidades que explodiram em um acontecimento aparentemente único na história brasileira”, explicam Regina Helena Alves da Silva e Paula Ziviani na apresentação da obra.

 (Louisa Gouliamaki/AFP)


Esfera pública

A Editora Unesp lança esta semana mais um clássico do filósofo alemão Jürgen Habermas (foto), Mudança estrutural na esfera pública. Na obra, o pensador toma como ponto de partida o desenvolvimento da esfera pública na Inglaterra, França e Alemanha do século 17 ao século 20. Habermas examina as condições sociais que levaram à criação de tais espaços nas sociedades modernas, em que pessoas privadas promovem a discussão crítica e racional de questões comuns e se dispõem a assumir que o melhor argumento é a única fonte legítima de validar juízos. Como se vê, uma discussão que se mantém atual. Do mesmo autor, a editora já publicou as obras Sobre a Constituição da Europa, Fé e saber e Teoria e práxis.


Utopia de Darcy

Mais duas obras de Darcy Ribeiro voltam às livrarias em edição da Global. Em Utopia selvagem, o antropólogo e romancista lança mão da liberdade da fábula para desconstruir estereótipos nacionais para reinventar o Brasil centrado na figura do branco, do índio e do negro. Ele defende que nossa maior riqueza é o universo repleto de diferenças: um povo novo, miscigenado, híbrido, aprimorado, pronto para ser a mais bela nação da Terra. O outro livro, Tempos de turbilhão – Relatos do golpe de 64, traz, em seus 19 capítulos, acontecimentos vividos por Darcy Ribeiro, com textos sobre os instantes que antecederam o golpe e escritos que abordam momentos marcantes do desabrochar da ditadura militar no Brasil, além de reflexões sobre a heranças nefasta do período para a sociedade brasileira.

 (Nemo/Reprodução)


HQ erótico

A coleção de quadrinhos eróticos Safadas, do selo Nemo, está com álbum novo na praça, Encontros. Desta vez são 10 histórias, de diferentes autores e desenhistas, que têm em comum a sensualidade. “Um cruzeiro tão lindo”, de Loustral e Patrick Cauvin, inova ao trabalhar com apenas uma ilustração. Já “O último palanquim”, de Parras e Galliano, mistura erotismo, fantasia e morte. Indicado para adultos.


Museu e literatura

O Museu de Artes e Ofícios é o tema do livro ABC do Museu, de Soraia Vasconcelos, que está sendo lançado pela Miguelim. Os textos fazem referência às peças em exposição no MAO. Para a autora, “museu e literatura são parceiros no processo de educação e construção da cidadania”. As ilustrações foram selecionadas entre os trabalhos feitos por estudantes que participaram do projeto educacional no museu.


Novo português

A Cosac Naify anuncia para o mês que vem o lançamento de A Paixão, de Almeida Faria. Publicado em 1965 e considerado um marco na literatura portuguesa contemporânea, o romance faz parte da Trilogia lusitana e influenciou, entre outros, Raduan Nassar. Dividido em três partes (“Manhã”, “Tarde” e “Noite”), A Paixão se passa numa propriedade rural do Alentejo, Sul de Portugal, numa sexta-feira da Paixão. O livro está em pré-venda no site da editora.


Memória da resistência

A Fundação Maurício Grabois e a Editora Anita Garibaldi estão lançando uma publicação que se destaca entre as obras ligadas aos 50 anos do golpe militar. O Livro negro da ditadura militar é o único volume de denúncia sobre o período que foi escrito, impresso e distribuído na clandestinidade, em 1972, por iniciativa do grupo revolucionário Ação Popular (AP). A obra também vem acompanhada de um livreto com depoimentos daqueles que foram responsáveis pelo trabalho de publicação: Bernardo Joffily, Carlos Azevedo, Divo e Raquel Guisoni, Duarte Pereira, Elifas Andreato, Jô Moraes e Márcio Bueno Ferreira. A edição é em fac-símile, com capa de Elifas Andreato.

Um pouco cedo demais

Um pouco cedo demais
Estado de Minas: 31/05/2014


Fruto de uma era de celebridades, Neymar tem apenas 22 anos e já é personagem de biografias (Wanderley Almeida/AFP)
Fruto de uma era de celebridades, Neymar tem apenas 22 anos e já é personagem de biografias

O que se sabe sobre Neymar Jr.? Que ele é um dos grandes craques do futebol brasileiro; que deve ser uma das esperanças do Brasil na Copa de 2014; que é um menino que saiu do Santos para encantar o mundo no time do Barcelona; e que é namorado da atriz Bruna Marquezine.

O jogador tem apenas 22 anos e sua vida já foi exposta em alguns livros. Dois novos volumes acabam de chegar ao mercado brasileiro. Um é do jornalista esportivo e comentarista da ESPN Brasil, Paulo Vinícius Coelho, o PVC. Um perfil do jogador que fez renascer o espírito do futebol arte, como faz questão de frisar o autor.

O que mais impressiona PVC, e o que o levou a escrever o livro, é o fato de o então menino Neymar, de 13 anos, ter ousado ficar no Brasil, recusando a oportunidade de crescer na Espanha, como fez o seu atual colega de equipe, o argentino Lionel Messi. Em edição bilíngue, O planeta Neymar analisa a carreira do atacante do Barcelona desde o tempo em que o garoto jogava futsal em São Vicente, no litoral paulista, passando pela vitoriosa carreira, culminando com a espetacular atuação pelo Brasil na Copa das Confederações. A obra também traz a ficha técnica completa dos jogos de Neymar pela Seleção Brasileira.

 O outro lançamento é do jornalista dinamarquês Peter Banke, que desde o ano 2000 vem com frequência ao Brasil como correspondente de vários jornais e se impressionou com o craque. Neymar – O sonho brasileiro narra a trajetória do atleta, chamado de gênio, artista, cai-cai e até de o novo Pelé. O autor traz relatos de pessoas fundamentais para a vida e a carreira do atleta, como Betinho, considerado seu mentor; Ermenegildo Pinheiro Gil, diretor da escola que lhe deu uma bolsa em troca de um troféu; e Newton Lobato, pastor de sua igreja, além de seus amigos de infância e adolescência. (ACB)


 (Paralela/Reprodução)

Neymar – o sonho brasileiro
• De Peter Banke
• Editora Planeta
• 224 páginas, R$ 29,90


O planeta Neymar
• De Paulo Vinícius Coelho (PVC)
• Editora Paralela,
• 248 páginas, R$ 24,90

Tomar os céus de assalto [ Waly Salomão ] - João Paulo

Tomar os céus de assalto 
 
Livro que reúne a poesia completa e as letras de canções de Waly Salomão destaca a obra de um escritor que foi além de todas as escolas estéticas para inquirir a arte e a política de seu tempo 

João Paulo
Estado de Minas: 31/05/2014


Sempre heterodoxo e excessivo, Waly Salomão foi reconhecido por seus pares como um criador que aliava alta erudição e criatividade     (Marco Antônio Teixeira/AG)
Sempre heterodoxo e excessivo, Waly Salomão foi reconhecido por seus pares como um criador que aliava alta erudição e criatividade


Há poetas que fazem versos, e outros que vivem poeticamente. Muito poucos são capazes de juntar as duas artes numa vida só. E o que chama ainda mais atenção é que esses poetas totais costumam partir cedo, como se tanta força criativa sugasse com rapidez sua energia vital. Foi assim com Paulo Leminski (1944-1989), com Ana Cristina César (1952-1983) e com Waly Salomão (1943-2003).

Surgidos a partir dos anos 1960, os três estão com suas obras poéticas completas em novas edições, todas pela Companhia das Letras. Depois de Leminski, com Toda poesia, e Ana Cristina, com o volume Poética, agora é a vez de Waly Salomão, que ganha sua Poesia total. Os três livros seguem padrões semelhantes: reunião de todos os volumes de poemas publicados em vida, estudos que agrupam textos de recepção de primeira hora com ensaios mais abrangentes. Alto nível, como os poetas mereciam.

Ana, Paulo e Waly têm algumas semelhanças, mais externas que propriamente literárias, que talvez até expliquem o sucesso que os livros vêm alcançando com os leitores, chegando a figurar entre os mais vendidos (feito que não realizaram em vida): são poetas que se aproximam da dicção pop, são muito cultos, sem exibir pose, têm comportamento libertário e, cada um a seu jeito, chamam atenção pela personalidade peculiar, meio hippie, meio santa, meio bandida. O que, de certa forma, parece fazer emergir uma saudade do que não temos mais no mundo intelectual. São poetas.

Poesia total, de Waly Salomão, tem tudo para trazer de volta, agora com julgamento mais detido, a importância da lírica do escritor. Homem dado a exageros, com fala dionisíaca e presença cativante, espalhando ideias ao vento como um aedo meio ensandecido, Waly corria o risco de ficar submetido à tirania de sua presença política e cultural. O resgate de seus livros é de certa maneira uma reconfiguração do poeta. Que, de tão intenso, precisou ser dois, criando a persona de Waly Sailormoon.

Baiano de Jequié, ele gostava de se apresentar como herdeiro de duas culturas, a da mãe, sertaneja, e a do pai, sírio. Hiperbólico e brilhante, seu talento escorreu da poesia para a música popular, em parcerias com Macalé, Caetano, Adriana Calcanhotto e João Bosco, entre outros, e para a atuação na arena sempre disputada e polêmica da política cultural. Foi ainda artista visual e diretor de espetáculos (como o emblemático Fa-tal, de Gal Costa).

No campo da atuação pública, foi diretor da Fundação Gregório de Matos, em Salvador, coordenador do carnaval da Bahia (se é que Waly pudesse coordenar algo ou que o carnaval de verdade fosse coordenável), chegando a secretário nacional do livro na gestão do parceiro Gilberto Gil no Ministério da Cultura. O que se destaca, na vida e obra de Waly, é a comunicação entre os dois lados – do ativista e do criador – como expressão do mesmo gesto poético.

O retorno aos livros permite, neste momento, recuperar o que vinha ficando sob outros sedimentos de sentido. Embora libertária e experimental, sua poesia não ficou datada. Há um permanente diálogo com a tradição da poesia brasileira, sobretudo a modernista, mas sem perder em momento algum o empenho pela renovação. Waly, além disso, está sempre em ação para derrubar fronteiras e extrair o máximo da linguagem. É uma poesia que mobiliza a inteligência, na sua aparente improvisação gozosa e por vezes delirante. Nada mais distante de Waly que o desbunde ou a escrita automática dos surrealistas. É um tipo de louco que perdeu tudo, menos a razão, embora recuse todo tipo de cartesianismo.

Poesia total reúne os livros Me segura qu’eu vou dar um troço (1972), Gigolô de bibelôs (1983), Poemas de Armarinho de miudezas (1993), Hélio Oiticica: qual é o parangolé (1996), Algaravias: câmara de ecos (1996), Lábia (1998), Tarifa de embarque (2000) e Pescados vivos (2004). O volume traz ainda uma seção com letras de canções, entre elas uma das mais belas da MPB, Memória da pele, que ganhou melodia de João Bosco em 1989 (“Eu já me esqueci de você, tento crer/ Seu nome, sua cara, seu jeito, seu odor/ Sua casa, sua cama, sua carne, seu suor/ Eu pertenço à raça da pedra dura”).

Completa a edição um importante apêndice com artigos, críticas e ensaios sobre a obra de Waly Salomão. São textos de Francisco Alvim, Paulo Leminski, Armando Freitas Filho, Antonio Cícero, Antonio Risério, Davi Arrigucci Jr., Silviano Santiago, Antonio Media Rodrigues, Alexei Bueno, Walnice Nogueira Galvão, José Miguel Wisnik, Heloísa Buarque de Hollanda e Roberto Zular. A nata da crítica literária brasileira sempre esteve atenta a Waly, como mostram a data dos textos recolhidos: todos seus livros ganharam resenhas críticas importantes e reverentes no calor da hora.

O que chama a atenção na leitura da avaliação crítica ao trabalho de Waly Salomão é a aparente contradição entre uma poesia que surge quase espontânea e a reflexão cuidadosa dos analistas. Para quem pensa que o poeta, tão dado a declamações exuberantes de suas ideias, escrevia aos jorros, os críticos respondem com estudos que buscam sempre apresentar, de forma detalhada, os recursos expressivos e o arsenal de ideias do criador. A boa poesia é aquela que diz sem exibir seus instrumentos; a boa crítica é a que expõe o repertório de méritos do poeta sem lhe tirar o encanto.

Para Francisco Alvim, em resenha sobre o primeiro livro de Waly, Me segura qu’eu vou dar um troço, de 1972, há um empenho retrospectivo (que se refere à Semana de Arte Moderna de 22) e um exercício assumidamente prospectivo na obra de Waly. Ele destaca o trato do poeta com a paródia: “A paródia em Waly tem uma voltagem extradordinária. Talvez por que não seja puramente imitativa, mimética. Distancia-se incrivelmente do objeto imitado. No fundo, no fundo ela não imita nada, ou talvez imite apenas os estilos do próprio Waly”.

Paulo Leminski, ao escrever sobre Gigolô de bibelôs, reconhece, com prazer, que se trata de um dos poucos livros brasileiros do período a assumir o exagero como forma de expressão. “Na ‘Rua Real Grandeza’, por onde Waly transita, a grande figura é a hipérbole. A modalidade do exagero e do excesso.” O mesmo gesto extremo captado por Armando Freitas Filho ao escrever sobre o livro: “Ele jamais foi parcimonioso, salomônico, equitativo. Com ele é tudo ou nada”.

Rigor e liberdade

Cada livro de Waly é um livro novo, diferente. Da prosa experimental de Me segura... ao exercício dos metros difusos e formas híbridas dos livros que se seguem, ele afirma agora para desafiar amanhã. Não é possível também uma leitura evolutiva, como se o poeta fosse cumprindo um destino, degrau a degrau, em direção a qualquer forma de luz redentora. A luz explode em todas as direções, ao mesmo tempo. O rigor, que existe, não é da fixidez, mas da busca.

Ao tentar definir a poesia de Waly Salomão, na orelha-ensaio do livro Algaravias: câmara de ecos, Davi Arrigucci Jr. propõe uma genealogia possível. “Nas entrelinhas do primeiro livro, Me segura qu’eu vou dar um troço, e nos seguintes, se insinuava respostas para essas questões mais fundas, sempre percutidas em palavras. O poeta retornava à raiz da modernidade e a Poe, evocando a poesia sobre o signo de Proteu: da mudança ou da metamorfose, que ora assume e reafirma com força plena. Agora Sailormoon aporta ao lugar do simulacro, o poeta feito máscara, persona em que o oco dobra e multiplica a voz do outro em timbre próprio e impróprio, espaço impreenchível em que escrever é vingar-se da perda”.

A poesia de Waly Salomão chega ao século 21 com a mesma força e outra tarefa. A força está na junção de várias trilhas, que partem do modernismo, atravessam o tropicalismo, a contracultura e os experimentalismos para se afirmar como crítica permanente, inclusive política. Foco libertário do corpo e da palavra, a poesia de Waly está viva em seu projeto literário. No entanto, a tarefa parece ter mudado: não se trata tanto de gigolar bibelôs ou fazer chover meteoros. A situação está ainda mais grave, regressiva, careta e pobre de inteligência.

Talvez tenha chegado a hora de retomar os excessos. Só Waly nos salva.

POESIA TOTAL

. De Waly Salomão
. Editora Companhia das Letras, 552 páginas, R$ 49

TeVê

TV paga

Estado de Minas: 31/05/2014


 (HBO/Divulgação)

Drama real


A HBO estreia hoje, às 22h, sua produção original The normal heart, drama baseado na peça autobiográfica de Larry Kramer, que venceu três prêmios Tony, o Oscar do teatro, em 1985. A história parte do descobrimento da epidemia do vírus HIV e da Aids no começo da década de 1980. Nos papéis principais estão Mark Ruffalo e Matt Bomer (foto), em um elenco que conta ainda com a estrela Julia Roberts.

Telecine exibe o inédito
Meu malvado favorito 2


Com muito menos drama e mais diversão, Meu malvado favorito 2 é a novidade do Telecine Premium, também às 22h. No Megapix, Angelina Jolie emenda A troca (17h15), Salt (20h) e O procurado (22h). Na faixa das 22h, o assinante tem mais oito opções: Os filhos da meia-noite, no Max; O albergue, no A&E; E se fosse verdade?, na MGM; Embriagados de amor, no Comedy Central; O labirinto do fauno, na Warner; Gangues de Nova York, no TCM; Menina de ouro, no Telecine Touch; e Os pássaros, no Telecine Cult. Outras atrações da programação: Éden, às 20h, no Arte 1; Veias e vinhos – Uma vida brasileira, às 21h, no AXN; Diamante de sangue, às 21h30, na TNT; Os normais, às 22h10, no Canal Brasil; O show de Truman – O show da vida, às 22h30, no TBS; O assassinato de Jesse James pelo covarde Robert Ford, às 22h30, no FX; e O cangaceiro, às 23h, na Cultura.

Fernanda Young está
na série (Des)Encontros


A série (Des)Encontros chega ao segundo episódio, hoje, às 19h30, no canal Sony. A produção vai contar a história de André e Júlia, baseada no conto “Para comer”, de Lusa Silvestre, um dos responsáveis pelos sucessos dos filmes E aí, comeu? e Muita calma nessa hora 2. Fernanda Young participa do episódio, dirigido por Rodrigo Bernardo.

Maestro Forró dialoga
com o Leste europeu


Estreia hoje, às 18h30, no Canal Brasil, a série Andante, comandada por Francisco Amâncio da Silva, o conhecido Maestro Forró. Conhecido pelos arranjos da Orquestra Popular da Bomba do Hemetério, o artista pernambucano faz a ponte entre a cultura brasileira e a do Leste Europeu. Dirigido por Alessandro Guedes, o programa vai levar o assinante a Istambul (Turquia), Sófia e Gabrovo (Bulgária), Bucareste e Draguseni (Romênia).

Quer ouvir boa música?
Sintonize a TV Cultura


Na Cultura, às 16h, o programa Mosaicos promove um encontro de gerações, com a música de Egberto Gismonti, Severino Araújo & Orquestra Tabajara, Raul de Souza e Raphael Rabello sendo recriada por Yamandu Costa, Mauro Senise, André Mehmari, Proveta, Arismar do Espírito Santo e Caraí Guedes. Já às 18h, no Cultura livre, Roberta Martinelli recebe a banda Zulumbi, formada por Lúcio Maia (Nação Zumbi), DJ PG (Elo da Corrente) e MC Rodrigo Brandão (Gorila Urbano).


CARAS & BOCAS » Resgate milionário
Simone Castro

Jean Paulo Campos, uma das estrelas de Patrulha salvadora, conquistou chefão do SBT (Lourival Ribeiro/SBT)
Jean Paulo Campos, uma das estrelas de Patrulha salvadora, conquistou chefão do SBT


Sílvio Santos, dono do SBT, reclamou que não sabia da saída de Jean Paulo Campos do elenco da emissora. O ator mirim, uma das estrelas da série infanto-juvenil Patrulha salvadora, atração dos sábados do SBT/Alterosa, havia se transferido para outro canal, embora participasse do programa de Íris Abravanel. Driblando diretores e assessores, Sílvio entrou em cena e trouxe o garoto de volta. Na edição deste ano do Troféu Imprensa, em abril, ele comentou assim que Jean Paulo entrou no palco para buscar o seu prêmio, que não sabia da transação. Em seu programa, amanhã, o apresentador volta a tocar no assunto. Jean Paulo Campos é convidado do quadro “Não erre a letra”, ao lado de Danilo Gentili, Eliana, Patrícia Abravanel, Celso Portiolli e Isabella Fiorentino. Diante do ator, que fez grande sucesso como o doce Cirilo de Carrossel, Sílvio brincou ao disparar que ele estava “sequestrado”. “Tive que pagar um resgate de R$ 2,5 milhões”, afirmou para delírio da plateia e de um sorridente Jean Paulo Campos.

TURMA DO PAGODE GANHA
HOMENAGEM DE RAUL GIL


Vários artistas, amigos e familiares revelam histórias emocionantes sobre a carreira e vida pessoal dos integrantes do grupo Turma do Pagode. Os músicos ganham homenagem no Programa Raul Gil deste sábado, no SBT/Alterosa. Reinaldo, Netinho, Leo Santana, Mumuzinho, Anita, Sorriso Maroto, Mc Gimê, entre outros, não poupam elogios à banda. Ao final do quadro, o Turma do Pagode canta seus sucessos, como Melhor amigo e Horário de verão.

CLIPE DE PAUL MCCARTNEY
NA TELA DO ALTO-FALANTE


O novo clipe tecnológico de Paul McCartney, Appreciate, parte do álbum New, o mais recente lançamento do cantor, é destaque no Alto-falante deste sábado, às 17h, na Rede Minas. A atração ainda fala de outro gigante do rock, Pink Floyd, prometendo surpresa imperdível sobre a banda. Na crista da onda do psicodélico, quem não conhece não pode perder tempo para ouvir o Boogarins, grupo de Goiânia que já está ganhando os Estados Unidos com um rock de qualidade com um pé nos anos 1970. Também no quesito música boa feita em casa, confira no “Garimpo” o Slama!, inspirado no som setentista.

COPA DO MUNDO INSPIRA
MARATONA DO DISNEY XD


A bola entra em campo no canal Disney XD (TV paga), a partir de quarta-feira, às 13h, com a maratona Futebol, futebol, futebol, com episódios selecionados especialmente para curtir o clima de Copa do Mundo. Serão inicialmente dois episódios de Phineas e Ferb cheios de aventuras de Phineas Flynn e seu meio irmão Ferb Fletcher. Em seguida, tem muita ação com o inacreditável herói Randy Cunningham em Randy Cunnhingham ninja total. A maratona continua com o cineasta iniciante Spencer Wright e seu melhor amigo, o fantasma Billy Joe Cobra, em Cara, esse fantasma é meu!; a batalha continua entre um gato malvado e Coop Burtonburger, um garoto de 10 anos, que, inexplicavelmente, não conseguem se acertar, em Kid vs. Kat; a maratona termina com Super Strikas, que apresenta para os jovens fanáticos por futebol tudo o que acontece nos bastidores do esporte e as situações que eles só veriam de longe.

HISTÓRIAS DO FUTEBOL

Às vésperas da Copa do Mundo, o Jornal Futura resgata histórias do futebol brasileiro nos tempos da ditadura. A partir de segunda e até quinta-feira, às 17h, no canal Futura (TV paga), as reportagens da série Jogo duro mostram depoimentos de ex-jogadores, jornalistas esportivos e historiadores, como Juca Kfouri, Lúcio de Castro e Walter Casagrande, para tratar da relação entre política e futebol nos “anos de chumbo”. As matérias dão conta de como o governo militar interferiu na organização do futebol brasileiro e de que forma a participação da seleção brasileira em copas do mundo foi vista como uma oportunidade de propaganda oficial do governo. Entre os casos relembrados, a perseguição sofrida pelo ex-jogador de futebol Fernando Antunes Coimbra, irmão de Zico, devido à participação no Programa Nacional de Alfabetização, considerado subversivo pelos militares. Na estreia, as consequências dos primeiros anos de ditadura, que teve início com o golpe civil militar de 31 de março de 1964, e a expectativa da conquista do tricampeonato mundial na Copa do Mundo da Inglaterra, em 1966, depois das vitórias em 1958 e 1962. E que não veio. A esperança passa a ser a Copa, em 1970, no México.

VIVA

Avós têm sempre um lugar cativo nas tramas de Manoel Carlos. Dona Iolanda (Magdale Alves), avó de Bia (Bruna Faria), na trama de Em família (Globo), não foge à regra e
dá o que falar.

VAIA
Depois de apanhar pra valer em capítulo de Em família e ficar com o rosto cheio de hematomas, Laerte (Gabriel Braga Nunes) aparece sem uma marca sequer no capítulo seguinte. Falha grotesca!

CINEOP » Rico acervo

Nona edição da mostra que começou ontem em Ouro Preto confirma: a história do cinema se confunde com a da luta pela preservação e conservação de filmes no país


Walter Sebastião
Estado de Minas: 31/05/2014



Homenageado do CineOP, o cineasta Luiz Rosemberg ao lado da atriz Helena Ignez e do cineasta Geraldo Veloso   (Leo Lara/Universo Produção)
Homenageado do CineOP, o cineasta Luiz Rosemberg ao lado da atriz Helena Ignez e do cineasta Geraldo Veloso


Ouro Preto – A paixão pelo cinema deu o tom da abertura da 9ª CineOP, que começou ontem na cidade histórica com a exibição de Tudo por amor ao cinema, de Aurélio Michiles. O documentário apresenta retrato de um herói da produção cinematográfica brasileira, desconhecido fora do meio: o amazonense Cosme Alves Netto (1937-1996), curador por mais de duas décadas da Cinemateca do Museu de Arte Moderna (RJ). Homem cuja história pessoal se confunde com a da preservação e conservação de filmes no Brasil. A singular história de personagem preso e torturado durante a ditadura por ativismo político-cultural foi vista com respeito pelo público.

Tudo por amor ao cinema apresenta a trajetória de um filho esquerdista de um rico empresário que se entrega à paixão pela exibição de filmes antigos. Atividade que se estende em outras de apoio ao cineclubismo e aos cineastas. Estão no filme vários depoimentos que reconhecem não só o pioneirismo da ação dele, mas também a ousadia e a coragem de Cosme Alves Netto, que inclusive escondeu, na Cinemateca, filmes que corriam o risco de serem destruídos pela censura da ditadura militar. Luiz Rosembeg, homenageado do CineOP, recordou que, em tempos de censura agressiva aos filmes dele, ouviu do curador: “Aqui na Cinemateca seu filme passa”.

O clima do CineOP, como em todos os anos, é de encontro entre artistas e pesquisadores. O lema em 2014 é um conceito: cinema patrimônio. “Acervo – explica Raquel Hallak, coordenadora-geral – que é produto do sonho, da ousadia e do apuro artístico.” Ela cita Martin Scorcese, para falar de filmes que tocam o coração, abrem portas e mentes, mudam as formas de ver as coisas, motivo pelo qual o cinema deve se manter vivo. Este ano, holofotes foram postos especialmente sobre a geração dos anos 1970, que criou o cinema experimental, defendendo pesquisa estética como caminho.

Integrante ilustre da geração homenageada é a atriz Helena Ignez. Ela está em três filmes no CineOP: O poder dos afetos, que tem direção dela; Copacabana mon amour, de Rogério Sganzerla; Paixão e virtude, de Ricardo Miranda. “Bom cinema é atemporal. E é esse o cinema que estamos celebrando aqui”, afirma Ignez. Com relação à importância de festival dedicado à memória, ela é didática: “Como aprender cinema sem conhecer o que foi feito antes?”. A atriz trabalhou com praticamente todos os diretores do cinema experimental brasileiro. Está às voltas com projeto a ser realizado com Luiz Rosemberg Filho, com quem ainda não tinha filmado. “Mas é segredo”, brinca.

Clarissa Ramalho, viúva de Ricardo Miranda, homenageado do CineOP que morreu em março, agradeceu a reverência ao cineasta, montador e professor. “É um momento forte para mim, está sendo emocionante”, afirmou. Ela considera que a mostra, ao exercitar o rever e o recordar, e cuidar do realizado, coloca questão essencial para o cinema e para a sensibilização: “É memória. E memória é a ficção da nossa realidade”, observou.

O repórter viajou a convite da realização do evento.

Senhores da imagem‏ - Mariana Peixoto

Projecionistas com muitos anos de profissão se adaptam aos novos formatos de exibição digital. Mesmo atualizados, eles não escondem a predileção pela película


Mariana Peixoto
Estado de Minas: 31/05/2014



Rufino Gomes de Araújo e Mercídio Scarpelli na sala de projeções do Cine Humberto Mauro: 50 anos comandando as máquinas (Túlio Santos/EM/D.A Press)
Rufino Gomes de Araújo e Mercídio Scarpelli na sala de projeções do Cine Humberto Mauro: 50 anos comandando as máquinas


A pequena Coluna, no Vale do Rio Doce, nunca tinha presenciado aquilo. Muito menos Valdir Inácio Guimarães, então com 8 anos naquele 1957. Mas enquanto os meninos – e também muitos adultos – se aglomeravam em frente à tela de cinema montada na praça central, ele olhou de esguelha. Interessou-se mais pelo caminhão e pelos homens que mexiam no maquinário, a fonte daquelas imagens que eram projetadas para toda a cidade. Aquela imagem – e a sensação por ela provocada – ficou marcada em Valdir quando ele, já em Belo Horizonte e casado, pensava em aumentar a família. Mas o que conseguia como alfaiate, em meados da década de 1970, não bastava. Tinha que ter carteira assinada. O amigo de um amigo sugeriu: “Vá no Cine Brasil, estão precisando de um operador”. Lá foi Valdir ao grande cinema da Praça Sete e, ao dar de cara com o maquinário, voltaram à mente as sensações do menino de Coluna.

Valdir e também Mercídio Scarpelli e Rufino Gomes de Araújo já foram chamados operadores cinematográficos, depois projecionistas. Com a transição digital, em que a projeção de cinema vem migrando do formato 35 milímetros para o digital, sua atuação também vem mudando rapidamente. “Hoje, qualquer menininho roda um filme, pois tudo é no computador, em HD (disco rígido). Você coloca na pasta, dá um play e pronto, acabou”, afirma Rufino, projecionista há 49 anos e, desde 2008, funcionário do Cine Humberto Mauro, função que divide com Mercídio, este com 54 anos atrás de um projetor de cinema.

As mudanças na tecnologia já eram esperadas, e eles buscam se aprimorar como podem. “Quando comecei a trabalhar, o projetor era a carvão, não tinha filme estéreo, era tudo mono. Ainda peguei muito filme em preto e branco. O dolby (stereo) foi uma revolução, com a lâmpada, o carvão foi deixado de lado. Mas sempre trabalhei um ponto à frente, sempre fazendo reciclagem. Agora mesmo estou fazendo uma, pois meu computador ainda é Windows 7, e já não se usa mais”, afirma Valdir, que completou em 1º de maio 38 anos como projecionista – trabalha atualmente no Cine Cidade.

E a experiência ensina: a projeção em película 35mm faz diferença. “Parece mais viva, original. Quando você chega perto da tela (com exibição digital), vê que não é igual”, comenta Mercídio. Rufino vai na mesma linha: “Daqui a uns cinco anos acho que o digital vai superar o 35, mas este não vai acabar. A película tem corpo, profundidade, acho que vão criar nos shoppings salas especiais para a projeção. O digital é que vai ser o comum”.

A vida em uma cabine de projeção de cinema é para os fortes. Não há fim de semana, Natal, ano-novo. Valdir, que passou por várias grandes salas importantes do cinema de rua de BH (somente no Cine Brasil foram 19 anos como funcionário), já ensinou 28 pessoas a se tornarem projecionistas. Somente dois, e os mais jovens, continuam na profissão. Mas o que guarda dali ninguém tira dele. São histórias como as vividas por Alfredo, o saudoso projecionista interpretado por Philippe Noiret em Cinema Paradiso (1988).

Durante a ditadura militar, Valdir foi um dos operadores credenciados para exibir filmes para os censores – havia uma cabine especial no próprio Cine Brasil. “Você tinha que ficar de bico fechado, nem na minha casa eu contava”, relembra. “Com uma lanterna, eles (geralmente eram dois censores) mostravam a parte e eu vinha com um papelzinho e marcava o filme. Quando terminava, iam lá para dentro e eu cortava na presença deles. Emendava, pegava o rolo, colocava na lata e davam um documento. Se alguém reclamasse no cinema (de uma cena cortada), o gerente mostrava o documento.” Valdir assistiu, antes de todos e sem cortes, filmes polêmicos como Calígula (1979, que só foi ser exibido em BH 12 anos mais tarde) e Último tango em Paris (1972). “Este nem passou (na época), o exibidor achou melhor não passar. Só muitos anos mais tarde ele entrou no Cine Jacques.”

PULGUEIROS
Com Mercídio o problema não foi com a censura. Como sempre trabalhou em cinemas de bairro, que exibiam os filmes tempos depois de eles terem estreado no circuito do Centro, trabalhava com cópias já gastas, muitas faltando pedaços. Foi chamado mais de uma vez de ladrão, mas foi na Humberto Mauro, onde é funcionário desde 1986, que passou o maior aperto. “Foi com o filme Caçador de androides (Blade runner, de 1982). Na hora que iam matar um androide tive que trocar de uma máquina para outra (já que um longa-metragem tinha vários rolos de filme) e, quando fiz isso, pulou uma cena e ele apareceu quando já tinha morrido. O cara que estava no cinema disse que ia me pegar, que eu estava roubando. Quando fui embora, com medo de apanhar, o guarda (do Palácio das Artes) me levou até o ponto de ônibus.”

Já Rufino lembra que isso sempre acontecia com os cinemas de bairro. Quando começaram a nascer as salas de shopping, os famigerados multiplex, ele viu a situação mudar. “Eram os chamados pulgueiros que tinham esse problema, os de shopping sempre foram com fita zerada.” Apaixonado por cinema desde o primeiro filme que assistiu – Marcelino pão e vinho (1955), aos 11 anos, no cinema do navio que o trouxe, com toda a família, da Portugal natal para o Brasil –, afirma que independentemente das mudanças, o que importa é a paixão. “Tenho projetor de 35, 16, super-8, e tudo está funcionando. Mas não é para passar filme longo, é para mostrar para os conhecidos como é o cinema. Todo operador gosta de ver a máquina rodando. Isso não morre não”, conclui.

Valdir Inácio Guimarães chegou a exibir filmes para censores durante a ditadura militar:
Valdir Inácio Guimarães chegou a exibir filmes para censores durante a ditadura militar: "Você tinha de ficar de bico fechado"


Festivais acompanham tendência

A digitalização do cinema não chegou somente às salas dos grandes centros. Os festivais, muitos deles realizados em cidades que não têm sala de exibição, também vêm sofrendo modificações. O engenheiro eletrônico José Luís de Almeida é figura conhecida de vários deles. Hoje em dia, monta cinemas (de projetor à tela grande, dependendo da demanda) em 40 eventos cinematográficos. Neste fim de semana, por exemplo, com sua equipe da AllTech, está em Ouro Preto, para o CineOP.

Evento que tem como foco a preservação do cinema, exibe boa parte de sua programação de filmes antigos, muitos deles históricos. Mas somente cinco dos 59 filmes da programação desta edição são em película. Todos os outros são digitais. José Luís conta que em outros eventos do gênero a situação é semelhante. A Mostra de Tiradentes, em janeiro, pela primeira vez não exibiu nenhum filme em película. O Festival de Recife, em abril, tinha somente um longa em 35mm.

“Nem sei se os projecionistas vão continuar a ser chamados assim, a história mudou da água para o vinho. Para manipular os novos equipamentos você tem que saber informática. Hoje, a máquina já corrige defeitos, a gente mexe um pouco para deixar no padrão. Mas o projecionista é quem tem o senso do espetáculo.” No entanto, para ele a exibição em 35mm é insuperável. “Em termos de fotografia, nada melhor do que a película. É um engodo dizer que captou em digital, fez o transfer em 35mm e é a mesma coisa. A resolução na tela é digital. No cinema, você capta em película, revela o filme, faz a montagem. Aí sim é cinema em 35mm.”

LITERATURA » Cronista de ofício Carlos Herculano Lopes

LITERATURA » Cronista de ofício


Carlos Herculano Lopes
Estado de Minas: 31/05/2014


O escritor mineiro Humberto Werneck lança livro hoje em Belo Horizonte       (Eugênio Gurgel/Esp para o EM/D.A. Press-10/9/11)
O escritor mineiro Humberto Werneck lança livro hoje em Belo Horizonte


 De uma turma de escritores mineiros que faz parte da famosa “Geração Suplemento”, que a partir de meados dos anos 1960 passou a gravitar em torno de Murilo Rubião, criador do Suplemento literário de Minas Gerais, publicação que marcou época na literatura brasileira, Humberto Werneck foi há muitos anos para São Paulo, onde começou a trabalhar no Jornal da tarde, pelo qual passaram também os mineiros Ivan Ângelo, Luiz Vilela e Jaime Prado Gouvea. Desde então, vive na capital paulista.

Autor de vários livros, entre eles o clássico O desatino da rapazida – Jornalistas e escritores em Minas Gerais (1992), A vida de Jayme Ovalle (2008) e Dicionário de lugares-comuns e frases feitas (2009), entre outros, Humberto Werneck lança hoje em Belo Horizonte o livro de crônicas Sonhos rebobinados,(Editora Arquipélago Editorial, 231 páginas). Com um sensível olhar para as coisas do cotidiano, ou voltado para si próprio, o autor oferece ao leitores 54 histórias, todas publicadas no jornal O Estado de S. Paulo nos últimos tempos. “Menos uma ‘O nhenhenhém dos funhanhados’, que saiu no Brasil econômico, em 2010”, diz Werneck, que é natural de Belo Horizonte, onde nasceu em 1945.

Sonhos rebobinados

Lançamento do livro de Humberto Werneck, hoje, às 11h, na Quixote Livraria (Rua Fernandes Tourinho, 274, Savassi). Informações: (31) 3227-3077.

Há genes que dizem: "Deixe para amanhã"‏

Há genes que dizem: "Deixe para amanhã" 

Estudo feito com gêmeos sugere que a procrastinação tem base genética e está relacionada com traços de impulsividade 
 
Isabela de Oliveira
Estado de Minas: 31/05/2014


Brasília –  Procrastinação: atraso voluntário, porém irracional, de uma atividade; marcar para outro dia; adiar ou, vulgarmente dizendo, enrolar. Os dicionários têm muitas definições para o costume de “empurrar com a barriga”, mas só quem sofre com a mania de deixar para daqui a pouco sabe os prejuízos que o hábito pode causar. As razões que levam uma pessoa a agir dessa maneira ainda são desconhecidas, e muitas teorias tentam explicar o comportamento. Um estudo recente encontrou evidências de que ele pode estar marcado no DNA das pessoas, além de estar ligado à impulsividade.

Para investigar o tema, Daniel Gustavson, da Universidade de Colorado Boulder (EUA), aplicou questionários em 181 pares de gêmeos monozigóticos, ou idênticos, e 166 dizigóticos, ou fraternais. Os quase 700 participantes responderam a perguntas relacionadas às influências da impulsividade e da procrastinação em suas vidas, além da capacidade de planejar suas ações. Os resultados mostraram uma coincidência muito maior entre os gêmeos idênticos, que compartilham 100% do material genético, do que no outro grupo, no qual o compartilhamento do genoma é de 50%.

Em outras palavras, nos irmãos monozigóticos, quando um deles costuma procrastinar, a chance de o outro também ter um traço semelhante é muito maior do que entre os dizigóticos. Isso, segundo, o pesquisador, indica um importante papel genético nessa característica, já que fatores ambientais parecem pesar sobre os dois grupos de maneira muito parecida, uma vez que gêmeos, sendo idênticos ou não, recebem uma educação muito semelhante desde o início da vida.

Gustavson partiu de estudos conduzidos desde o início da década de 1990 que encontraram uma correlação positiva entre o adiamento de tarefas e traços impulsivos. Apesar de, para o senso comum, as duas características parecerem opostas, o autor conta que 20 anos de análises produziram evidências substanciais de que elas costumam ocorrer juntas.

Além disso, outro dado chamou a atenção de Gustavson: nos questionários, também ficou clara a associação entre procrastinação e impulsividade. “Nossos resultados sugerem a hipótese de que há uma sobreposição das influências genéticas compartilhadas entre procrastinação e impulsividade com a habilidade de manter objetivos. Encontramos influências ambientais, sim, mas elas não foram compartilhadas com esses três traços”, diz o autor.

O geneticista brasileiro Gustavo Guida concorda que características tão subjetivas como a procrastinação possam ser passadas de geração em geração. “Comportamentos que prejudicam a pessoa de alguma maneira, como problemas psiquiátricos, têm um grande componente genético. Então, faz um certo sentido existir essa herança para alguns comportamentos também”, considera Guida, que não participou do estudo.

Evolução Daniel Gustavson acredita que uma maneira de explicar os resultados é olhar para a evolução humana. Segundo ele, a impulsividade é uma característica evolutiva presente nos caçadores-coletores, povos antigos que não podiam se dar ao luxo de planejar o futuro, porque a sobrevivência dependia de decisões tomadas no presente. Pensar demais, no caso deles, significava perder o foco das necessidades urgentes, como a próxima refeição.

O mundo moderno, entretanto, é estruturado em uma base diferente, que exige o cumprimento de metas de longo prazo. No entanto, as tendências impulsivas que foram firmemente enraizadas durante a evolução continuaram alimentando o instinto de agir apenas no momento crucial, e não com antecedência, elabora o pesquisador. Daí a convergência entre impulsividade e procrastinação. Esta, na verdade, seria um subproduto daquela.

Felizmente, isso não quer dizer que quem tem a tendência está condenado a procrastinar eternamente. “Vale lembrar que os genes se expressam ou não de acordo com o ambiente em que estão. Então, não necessariamente uma pessoa que tem essa característica vai desenvolvê-la ou carregá-la para o resto da vida. Além disso, não foi realizado um trabalho que identificasse genes determinantes, e a pesquisa se restringiu a uma observação epidemiológica”, ressalta Gustavo Guida.

É preciso também separar comportamentos realmente prejudiciais dos adiamentos a que todos estão sujeitos em determinados momentos. Não é raro, por exemplo, que a procrastinação se manifeste mais na adolescência, quando o comportamento parece cumprir algumas necessidades dessa fase do desenvolvimento humano. Grande parte dos estudantes, em especial os universitários, são conhecidos por hábitos procrastinatórios clássicos, como atravessar madrugadas fazendo o trabalho que deve ser entregue na manhã seguinte.

Ainda que boa parcela das pessoas tenha passado por essa fase seguindo o mesmo ritmo, a maioria desenvolve, na vida adulta, um senso maior de responsabilidade. Gustavson considera que o ponto alto do estudo é enxergar as pistas de porque isso ocorre. “Essa nova descoberta não só ajuda a desenvolver modelos mais mecanicistas da procrastinação, mas também aponta novas maneiras de reduzi-la, por exemplo, aumentando a quantidade de atividade e mantendo objetivos na presença de potenciais tentações”, diz o autor.

Eduardo Almeida Reis - Genialidade‏

Ampliar significa aumentar; melhorar significa tornar melhor. Como aumentar e melhorar algo que não existe?



Eduardo Almeida Reis
Estado de Minas: 31/05/2014





Na obsessão de veicular principalmente as notícias ruins, a imprensa brasileira vive repetindo que a ALMG ou ALEMG, Assembleia Legislativa do Estado de Minas Gerais, é a mais cara do Brasil e neste ano superou a marca de R$ 1,01 bilhão do orçamento, como leio no provedor Terra. Sozinho, o parlamento mineiro terá nos cofres um orçamento que quase equivale aos de seis estados da Região Norte do país, incluindo o gigantesco Pará, que juntos somam R$ 1,11 bilhão em verbas neste ano da Copa das Copas.

O orçamento legislativo mineiro supera até mesmo o do Parlamento Nacional de Portugal, que tem 230 parlamentares com um orçamento previsto de 99,98 milhões de euros, algo em torno de 325 milhões de reais. Os deputados estaduais mineiros têm o segundo maior custo por parlamentar por ano do Brasil. Cada um custa R$ 13,1 milhões e perde apenas para a Câmara Legislativa do Distrito Federal, em que o custo por cadeira é de R$ 16,8 milhões.

Criticar é fácil, mas é preciso divulgar o lado bom das instituições. A ALMG, por seus ilustres deputados, tem instantes de genialidade impagável, adjetivo de dois gêneros que tanto pode ser interpretado como “que não tem preço, precioso, inestimável”, como também “ridículo ou cômico, que faz rir por ser muito engraçado”.

Li na coluna do Fontana, edição de 28 de abril, que a Assembleia Legislativa teve naquele dia uma reunião da Comissão de Assuntos Municipais para tratar de projetos de ampliação e melhoria das linhas de metrô de Belo Horizonte. O respeitado jornalista fez diversas considerações sobre os transportes públicos na capital, terminando com um detalhe: o metrô de Buenos Aires foi inaugurado em 1924.

Para falar da genialidade de nossa ALMG, seja-me peramitido acrescentar o seguinte: a reunião do dia 28 de abril foi para tratar de projetos de ampliação e melhoria das linhas do metrô de BH. Ampliar significa aumentar; melhorar significa tornar melhor. Como aumentar e melhorar algo que não existe? É providência que contraria a lógica, a física, a mecânica quântica, vai de encontro a tudo quanto se possa imaginar. O metrô de Belo Horizonte é um devaneio: sonho, quimera, produto de fantasia. Aumentar e melhorar algo que não existe é delírio, falta de tino, crença vã – daí a genialidade da reunião.


Emigrantes

As emigrações, saídas espontâneas de um país, definitivas ou não, têm sido cíclicas. Houve períodos em que muitos brasileiros de determinadas camadas sociais sonharam emigrar para a Europa ou para os Estados Unidos, assim como milhões de brasileiros de certos estados migraram para o Rio e São Paulo.

Nos últimos dois anos, o sonho haitiano tem sido emigrar para o Brasil. Em 2008, a República do Haiti somava pouco mais de 8 milhões de habitantes. No terremoto de 2010 devem ter morrido 200 mil, mas nasceram outros. Admitamos que a população continue na faixa dos 8 milhões. Emigrando de seu país, que ocupa o terço ocidental da Ilha Hispaniola, ou Ilha de São Domingos, chegam ao Brasil pelo Acre, estado superiormente governado pelo médico Sebastião Afonso Viana Macedo Neves, mais conhecido como Tião Viana (PT-AC), que os encaminha de ônibus para São Paulo.

Dez ônibus transportam em média 400 haitianos; mil ônibus cerca de 40 mil. Compete ao leitor, bom em aritmética, descobrir quantas viagens de ônibus serão necessárias para trazer 8 milhões de pessoas, fluentes em francês e crioulo haitiano, do Acre para São Paulo. O resto se ajeita com o Bolsa Família.


Pavor!

Cá entre nós, que ninguém nos ouça: a Taça é um pavor! Pode ter seis quilos de ouro de 18 quilates, 36,8 cm de altura, mas é horrível, como vimos na bela matéria de Bruno Freitas, capa do caderno Superesportes do EM, edição de 29 de abril, quando faltava mais de um mês para a Copa das Copas e ainda não havia índios flechando policiais nas vizinhanças.

Pode ser o ângulo em que a foto foi batida, mas o resultado é um misto do ET do filme famoso com o visual do famoso engenheiro Nestor Cerveró, dos mais ilustres e conhecidos ex-diretores do que resta da Petrobras. Derretida, a Taça vale seis quilos de ouro de 18 quilates. Naquele ângulo, serve apenas para assustar gregos, troianos, mineiros e tocantinenses.
Em duas semanas começa a Copa’ 2014. Daqui a dois anos teremos as Olimpíadas 2016, outro delicioso espetáculo de atrasos e malversação de dinheiros públicos. O país é pouco sério, além de grande e bobo.


O mundo é uma bola

31 de maio de 1223: na Batalha do Rio Kalka, um exército mongol liderado pelos generais Subedei e Jebe Noyon vence os exércitos de vários principados russos. “E nós com isso?” deve estar perguntando o assustadíssimo leitor. Efetivamente, o assunto só interessava aos moradores na região do Rio Kalka, em 1223.

Muito mais importante para a história da mineiridade é a notícia da fundação, no dia 31 de maio de 1850, da cidade de Juiz de Fora. Deve ser feriado por aqui, mas felizmente é sábado. Detesto feriados. Hoje é o Dia da Juventude Luterana e do Comissário de Bordo.


Ruminanças

“Os homens se dividem em duas espécies: os que têm medo de avião e os que fingem que não têm” (Fernando Sabino, 1923-2004).