Em seu primeiro romance, o thriller Os corruptores, o jornalista mexicano Jorge Zepeda Patterson mergulha nos bastidores da política de seu país
Mariana Peixoto
Estado de Minas: 07/06/2014
Suspense de Jorge Zepeda Patterson, pela atmosfera tensa e relação com a imprensa, lembra a trilogia Millenium |
No poder desde 1929, o Partido Revolucionário Institucional (PRI) perdeu sua hegemonia no México no ano de 2000, quando Vicente Quesada, do Partido da Ação Nacional (PAN), venceu as eleições presidenciais. O PRI retomou a presidência há dois anos, com a eleição de Enrique Peña Nieto. Durante sua campanha presidencial, vieram à tona uma série de escândalos de corrupção, fraude eleitoral e narcotráfico. Sua vida também enfrentou períodos turbulentos. Ele teve dois filhos fora do casamento, e sua primeira mulher, Mônica Pretelini, morreu em 2007 em circunstâncias mal esclarecidas – depressiva, houve insinuações da responsabilidade de Peña Nieto na morte. Hoje o presidente-galã está casado com Angélica Rivera, atriz da Televisa. A principal rede de TV do país esteve diretamente ligada à campanha presidencial de Peña Nieto.
Isso é vida real, qualquer busca rápida na internet pode provar. O que Os corruptores, primeiro romance do jornalista mexicano Jorge Zepeda Patterson faz, é ficção. Mas pautada pelo real, fruto dos anos de redação do autor, fundador de dois jornais, Siglo 21 e Público, além de responsável por vários livros de análise política. Há 20 anos, Zepeda tem uma coluna semanal que se dedica a lançar luzes sobre os desmandos da política mexicana. Com o romance, ele leva sua experiência no jornalismo investigativo para uma narrativa de fôlego que mistura relato policial, thriller e até mesmo uma história de amor.
A narrativa de Zepeda tem início em novembro de 2013, ou seja, ao final do primeiro ano do retorno do PRI ao poder. É o assassinato bárbaro de Pamela Dosantos, atriz que sempre esteve envolvida com as altas rodas do poder mexicano, que desencadeia a ação. Tomás Arizmendi, um jornalista que já teve seus dias de glória e hoje se resume a assinar uma coluna semanal sem muito impacto, é o primeiro que relaciona o crime com as altas esferas do poder, através de uma informação, aparentemente sem importância, que lhe é repassada por um conhecido. Pois o fato liga o crime diretamente com o PRI, na figura de seu ministro do Interior, Augusto Salazar, o homem mais importante do novo governo, depois do presidente Alonso Prida.
De volta à linha de frente do jornalismo, Tomás começa a ir atrás do assassino ao mesmo tempo que é perseguido por saber demais. Mas ele é somente a ponta de um iceberg de trocas de favores de todos os lados. Para a empreitada, reúne os Azuis, seus três melhores amigos de infância: Amélia, hoje a presidente do Partido da Revolução Democrática (PRD), principal oposicionista ao governo do PRI; Jaime, um chefão da inteligência mexicana que tem franca relação com os Estados Unidos; e Mario, um professor universitário que leva uma vida tranquila ao lado da família. Cada um, a sua maneira (e de acordo com seus próprios interesses), vai contribuir para que o que parecia um crime passional influencie a vida mexicana definitivamente.
Há um quê da trilogia Millenium em Os corruptores, não somente por Zepeda, a exemplo do sueco Stieg Larsson, vir do jornalismo. A história cruza fatos reais da política daquele país com a narrativa ficcional, coloca seu protagonista como um Quixote na briga contra o poder, mostra a crise dos meios de comunicação tradicionais, que se recusam a reconhecer o seu declínio sob a pressão de novas tecnologias, aqui muito presentes na figura de hackers. Só que a narrativa de Zepeda tem várias vozes. Ainda que Tomás seja o principal, cada capítulo (todos sempre curtos) explora a passagem de um determinado personagem, nas quase três semanas em que dura a ação. A partir de um fato (o crime), Zepeda constrói um retrato aterrador de seu país nos dias atuais, mostrando como a política do México, a despeito da passagem dos anos, continua atrelada ao narcotráfico. Para mostrar que o México não é nenhuma exceção, Zepeda prepara um segundo livro sobre os quatro Azuis. Além do país natal, a narrativa também terá passagens na Espanha.
Trecho
“Pamela começou a tomar consciência de que o sujeito não estava nem aí para sua pose sugestiva. Não ia violentá-la. Uma boa notícia estava se transformando, de maneira acelerada, em outra terrível. A dor no plexo anunciou o pânico que pouco a pouco inundou seu corpo. Perguntou a si mesmo se o sujeito teria sido enviado para lhe arrancar informações. Desesperada, repassou o muito que sabia, os segredos de Estado que havia guardado ao longo de seu agitado passado. Seu carrasco, quem quer que fosse, poderia não se interessar por seu corpo, mas não podia ser indiferente a seus segredos, pensou Pamela. Inventariou as informações que tinha para oferecer: o avião, os vídeos, o acordo.”
OS CORRUPTORES. De Jorge Zepeda Patterson
. Editora Planeta, 342 páginas, R$ 45,90
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