sexta-feira, 14 de dezembro de 2012

PLANOS DE SAúDE » Clientes sem motivo para comemoração - Pedro Rocha Franco‏

Pesquisa feita com dados das operadoras coloca 60% delas como bem avaliadas, mas reclamações dos usuários aumentam até 226% e mostram ineficiência dos serviços 

Pedro Rocha Franco
Estado de Minas: 14/12/2012 
De um cenário caótico ao retrato do “país das maravilhas”. Em 2012 o mercado de saúde privada teve um baque com a proibição do comércio de planos de saúde, reflexo principalmente da ineficiência do atendimento e do aumento de reclamações, que, de dezembro de 2010 até novembro deste ano, cresceram até 226%, segundo dados da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS). Mas na avaliação das próprias operadoras o caos passa bem longe do sistema. Segundo pesquisa divulgada ontem, com dados elaborados pelas empresa, 566 das 913 operadoras de planos médico-hospitalares têm nota azul no boletim de avaliação. Enquanto isso, somente 4,1% das empresas recebem as piores notas. O estudo faz o usuário questionar: mas e as filas? E a demora na marcação de consultas? A partir do ano que vem, a agência reguladora vai fazer pesquisas diretas com os beneficiários dos planos de saúde para avaliar a satisfação com o serviço. É esperar para ver se o resultado se mantém.

Na avaliação de usuários, a qualidade tem descido a ladeira em ritmo acelerado. A extensão da rede assistencial tem se mostrado insuficiente para comportar o número de usuários cada vez maior. De tantos problemas, o engenheiro Hebert Lopes de Souza adotou como estratégia ir aos hospitais com a filha de quatro anos apenas de madrugada. Com exceção de casos de urgência, ele consegue filas bem menores e atendimento mais rápido. “Considero a infraestrutura boa; o atendimento chega a ser excelente, mas a parte administrativa deixa a desejar. A rede é sobrecarregada; os profissionais recebem pouco e, por isso, têm que dobrar o expediente. Tudo isso penaliza”, afirma. O engenheiro Jacky Roberto Deligne tornou habitual a procura por médicos particulares, usando o serviço dos conveniados somente no atendimento hospitalar. O motivo: busca por qualidade. Em atendimento ontem em um oftamologista, ele ficou uma hora e vinte minutos no consultório do especialista. Apesar de ter pago R$ 390 (parte do valor é reembolsado), ele não abre mão da segurança que diz ter com profissionais conhecidos. “Os planos estão muito massificados. Vemos toda hora outras pessoas falando que preferem ser atendidas pelo SUS (Sistema Único de Saúde)”, afirma.

Hoje, o indicador é medido de forma indireta, com base em quatro quesitos apresentados pelas operadoras: atenção à saúde (tem peso de 40%); a econômico-financeira (20%); estrutura e operação (20%); e satisfação dos beneficiários (20%). A partir do ano que vem, um questionário elaborado pela agência reguladora será enviado para as operadoras que o repassarão aos usuários e, por último, os resultados serão encaminhado para a ANS. Os dados serão divulgados em maio. “A agência está caminhando no sentido de avaliar melhor a impressão do consumidor", afirma o diretor-presidente interino da ANS, André Longo.

Em 2011, obtiveram melhores avaliações 735 operadoras médico-hospitalares e odontológicas, com quase 46 milhões de beneficiários. Na avaliação anterior eram apenas 482 empresas com 33,7 milhões de beneficiários. A faixa de notas vermelhas, que responde aos mais mal avaliados, caiu de 383 operadoras em 2010 para 54 no ano passado e atendem 474 mil beneficiários. Em contrapartida, segundo dados da ANS, em dezembro de 2010 o indicador de reclamações referente a empresas de grande porte era de 0,33, passando para 0,49 em novembro do ano seguinte e 0,86 (o indicador varia de 0 a 1) no mês passado. Cenário semelhante se repete entre as empresas de médio e pequeno porte (veja arte). O número de operadoras também caiu de 1.517 em 2010 para 1.239 no ano passado, segundo a ANS, devido às movimentações do mercado, com fusões e incorporações, e também ao não cumprimento de normas da agência, o que resultou no cancelamento do registro de operadoras. 

A coordenadora da Qualidade e do Conhecimento da ANS, Andrea Lozer, afirma que a discrepância entre os dados é reflexo de dois retratos distintos do setor. “O indicador de desempenho é uma foto; o índice de reclamações é outra. É preciso avaliar o conjunto dos números”, afirma, ressaltando que a agência atua num formato parecido ao da Receita Federal com o Imposto de Renda para evitar fraudes nos dados e garante que as informações repassadas pelas operadoras são objetivas e de “difícil manipulação”.

Qualidade
questionada

A Associação de Consumidores Proteste considera que a rede assistencial ainda é um problema com longo caminho a ser percorrido para atender o cliente da forma adequada, com grande dificuldade para agendar consultas e procedimentos nos prazos definidos pela agência reguladora. Os usuários ainda sofrem com problemas de saturação da rede de atendimento. O sistema privado de saúde está sobrecarregado e o usuário não consegue o acesso de que necessita, com a urgência de que precisa, apesar de pagar pelo serviço”, afirma a presidente da Proteste, Maria Inês Dolci, que, em nome da entidade, encaminhou uma lista com sugestões de melhorias para a ANS. Entre outros, é sugerido que sejam criados instrumentos capazes de penalizar as operadoras reincidentes na cobertura insuficiente; a criação de planos acessíveis às classes C, D e E e a adequação de serviços voltados à saúde dos idosos diante da atual realidade demográfica.

Em nota, a Federação Nacional de Saúde Suplementar (FenaSaúde), que representa 15 grupos empresariais, afirma que os dados “refletem o empenho das operadoras de saúde em qualificar continuamente suas operações. A saída de algumas operadoras de saúde do mercado não significa concentração da atividade. Esse movimento demonstra aumento de qualificação e também evidencia que as demais empresas estão procurando se adaptar às normas e exigências requeridas do setor”.

Consultas feitas pela internet

Antes de contratar um plano de saúde, o consumidor poderá consultar informações e indicadores de qualidade referentes aos operadores de saúde suplementar. Num modelo semelhante ao adotado pela Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) lançou ontem o espaço da qualidade, permitindo ao usuário consultar índice de reclamações; a lista de planos que tiveram a comercialização suspensa; o Índice de Desempenho da Saúde Suplementar e outros indicadores para dar apoio aos clientes na hora da contratação.

No site da agência reguladora, o usuário precisa informar o nome da empresa ou seu registro na ANS para ter detalhamento completo da operadora. É possível inclusive comparar operadoras. “Com o Espaço da Qualidade estamos dando ao cidadão mais uma ferramenta de transparência, facilitando o acesso à informação na hora de escolher ou trocar o plano”, destaca o ministro da Saúde, Alexandre Padilha.

Neste ano, como forma de tentar forçar melhorias na qualidade do serviço dos planos de saúde, a agência reguladora deu início à proibição de comercialização de planos que estivessem descumprindo prazos para atendimento do cliente. Em julho, 268 planos de 37 operadoras foram vetados por três meses, enquanto, em outubro, nova lista foi divulgada com veto a 301 planos de 38 empresas. O processo deve ser repetido a cada três meses e caso não haja melhora no atendimento no período seguinte a operadora é mantida na lista negra. (PRF)

Nenhum comentário:

Postar um comentário