MAM-SP traz clássicos do Pompidou e Oi Futuro, no Rio, exibe brasileiros
Obras de pioneiros como Nam June Paik e Bruce Nauman influenciam produção nacional de arte feita com vídeo
Seu painel eletrônico, obra de 1965, era uma espécie de aviso de que a imagem viria a suplantar a natureza.
"Ele tinha essa atitude visceral, a ideia de abrir o vídeo e a televisão", diz Tadeu Jungle sobre Paik, o pai da videoarte. "Ele mergulhou lá dentro e manipulou esses suportes de todas as maneiras."
Dos primeiros experimentos de Paik nos anos 1960 à obra contemporânea de Jungle, o vídeo ganhou corpo como linguagem cada vez mais elástica nas artes visuais. Duas mostras, uma em São Paulo e outra no Rio, agora destrincham toda essa evolução.
Enquanto o Museu de Arte Moderna paulistano recebe na semana que vem clássicos da videoarte da coleção do Centre Georges Pompidou, em Paris, o Oi Futuro, no Rio, exibe retrospectiva de peças-chave na produção nacional em vídeo na última década.
No MAM, além da peça lunar de Paik, estarão também videoinstalações de Bruce Nauman, Vito Acconci, Peter Campus e Dan Graham, todos pioneiros da arte em vídeo.
"São sempre obras que lidam com o corpo", diz Paula Alzugaray, curadora da mostra em São Paulo. "Nelas, o corpo se duplica em jogos de espelhos e projeções. Os trabalhos investigam a presença do espectador e processam a imagem dessa presença."
No caso de Nauman, câmeras instaladas em dois corredores mostram a imagem de quem transita por eles sempre ao contrário -ou seja, o espectador se vê andando na direção oposta à que caminha, num conjunto de fugas orquestradas e repetidas.
"Nauman é um artista que eu admiro desde a primeira obra que vi", diz Lenora de Barros, que expõe no MAM e no Oi. "Essa questão de trabalhar sempre com o corpo está nos meus vídeos, em que eu também me coloco como a personagem de uma ação."
CORPO ELETRÔNICO
Mas nem tudo é imagem. Vito Acconci criou uma caixa preta que emite um discurso, frases em inglês repetidas na sequência por vozes em francês, um clássico sobre o que Alzugaray define como "encontro forçado de culturas".
"Esse cubo preto é uma referência ao cavalo de Troia, uma peça enigmática", diz a curadora. "Há uma tensão permanente nessa obra, uma espécie de ameaça velada."
É também uma fusão entre linguagens. Tanto na obra de Acconci quanto na de artistas brasileiros como Barros, elementos de performance, vídeo e poesia se entrelaçam.
"Esses artistas conseguiram fazer do vídeo um dos meios mais eficazes", resume Alberto Saraiva, curador da mostra no Oi Futuro. "Ele se tornou uma mídia integral."
Tão integral que ganhou independência das projeções convencionais. Nos anos 1970, artistas como Peter Campus e Dan Graham já contrastavam imagens reais refletidas em espelhos com versões duplicadas projetadas ou exibidas em monitores.
Décadas depois, Albano Afonso, que expõe agora no Oi Futuro, transformou as três cores primárias da luz -verde, azul e vermelho- numa animação vibrante de fotogramas coloridos nas bordas e brancos no centro.
São todas extensões da ideia de Paik da paisagem que se torna eletrônica. Mas, nesse caso, é o corpo físico ou a imagem em si que se desmaterializa em pontos de luz.
"Esse corpo se torna eletrônico", observa Alzugaray. "E a paisagem também se transforma. É toda construída."
CIRCUITOS CRUZADOS
QUANDO a partir do dia 22/1, às 20h; de ter. a dom., das 10h às 17h30; até 31/3
ONDE MAM (pq. Ibirapuera, portão 3, tel. 0/xx/11/5085-1300)
QUANTO R$ 5,50
VIDEOARTE 2013
QUANDO de ter. a dom., das 13h às 21h; até 31/3
ONDE Oi Futuro (r. Visconde de Pirajá, 54, Rio, tel. 0/xx/21/3131-9333)
QUANTO grátis
ARTES PLÁSTICAS
Artista que fez clipe de Bowie expõe no MAM
DE SÃO PAULODepois de realizar o clipe de "Where Are We Now?", novo single de David Bowie após dez anos de hiato, o videoartista americano Tony Oursler vem a São Paulo na semana que vem para projetar na copa das árvores do parque Ibirapuera quatro enormes rostos humanos.Desde os anos 1970, Oursler trabalha com vídeo e se firmou no meio com ousadas experimentações, em que projeta imagens sobre superfícies nada convencionais, dos bonequinhos do vídeo de Bowie às árvores paulistanas.
Antes de vir ao Brasil para a mostra do Museu de Arte Moderna, Oursler falou à Folha.
Leia a seguir trechos da entrevista. (SM)
Folha - Como você começou a trabalhar com projeções de suas imagens em vídeo?
Tony Oursler - Trabalho com vídeo desde que peguei a primeira filmadora nas mãos ainda na escola. Desde então, eu brinco com meios eletrônicos e a produção de imagens. Por muitos anos, eu tentei libertar a imagem da tela da televisão e tratar essas imagens como esculturas.
Quando projeto uma imagem sobre superfícies tridimensionais, estou na verdade questionando o ato de ver alguma coisa. Como sabemos, o que vemos é a luz rebatida da superfície de cada objeto.
Embora isso seja inovador, você costuma ressaltar a textura e os pixels do vídeo digital, expondo as falhas do suporte. Por que?
[Bertolt] Brecht sempre falou em quebrar ilusões do espectador, enriquecendo o diálogo entre artista e obra. Por isso, essa experiência não pode ser escapista ou seguir só os códigos da cultura pop.
Há interrupções intencionais no processo de ver que, eu espero, possam elevar o diálogo a outro patamar. É aí que está a arte.
Esses elementos estão no vídeo que fez para a música de Bowie. Como é sua relação com o ele?
Conheço o David há muito tempo e já fizemos muitos projetos juntos. Em "Switch", um vídeo meu que está no Pompidou, ele faz uma figura divina, um cineasta onisciente.
Há um mês, ele me chamou para fazer o clipe e pediu sigilo absoluto. Bowie é um dos meus artistas favoritos. Tem uma personalidade múltipla e multimídia, com influência e ressonância incríveis.
CRÍTICA EXPOSIÇÃO
Mostra reforça importância de Maiolino e Nazareth no país
FABIO CYPRIANOCRÍTICO DA FOLHAAs mostras de Anna Maria Maiolino e Paulo Nazareth, vencedores do Prêmio Masp Mercedes-Benz, em cartaz no Museu de Arte de São Paulo (Masp), não só justificam muito bem a decisão do júri como apontam a importância de ambos no atual cenário das artes visuais.Maiolino e Nazareth possuem, aliás, muitas convergências em suas poéticas: ambos se autorrepresentam em suas obras, apostando no caráter subjetivo do fazer artístico.
Ambos se apropriam de elementos da cultura brasileira, reforçando a importância do contexto para a produção, e usam do humor como estratégia de comunicação.
O vídeo "Quaquaraquaqua" (1999-2004), de Maiolino, por exemplo, é hilário. Com a canção "Vou Deitar e Rolar", cantada por Elis Regina ao fundo, a artista se mostra fazendo tarefas domésticas, como limpar a casa e cozinhar.
Discutindo questões de gênero, Maiolino debocha de certo universo feminino, sem cair numa militância histérica. Por meio de ironia, a artista realiza uma apurada crítica de costumes.
Essa sutileza, aliás, está presente em muitos trabalhos expostos. A exposição reúne um conjunto significativo de obras de Maiolino desde os anos 1970.
"Monumento à Fome" (1978/2012) segue no mesmo raciocínio. Composto por dois sacos, um de arroz e outro de feijão, amarrados por uma fita negra, o trabalho lembra a miséria no país, sem se utilizar de imagens apelativas.
Ao final, em sua retrospectiva, Maiolino pode ser vista como umas das artistas centrais a pensar a condição brasileira, desde os tempos da ditadura (1964-1985).
Já Nazareth, que venceu o prêmio como jovem artista, comparece com um conjunto de obras também marcado pela ironia.
"Vendo Mi Imagem de Mombre Exótico" (vendo minha imagem de homem exótico), frase que se lê numa placa segurada pelo artista, aponta para a condição que latino-americanos são vistos nos Estados Unidos. A obra faz parte da série "Notícias da América".
Muitas vezes, prêmios são mais uma estratégia de marketing para quem os patrocina do que algo de valor para quem os recebe. Não é o caso do Masp Mercedes-Benz.
MASP MERCEDES-BENZ
QUANDO de ter. a dom., das 10h às 18h; qui., até 20h; até 10/3
ONDE Masp (av. Paulista, 1.578, tel 0/xx/11/3251-5644)
QUANTO R$ 15
AVALIAÇÃO ótimo
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