Paulo Lima
Esatado de Minas: 28/02/2013
Controlar a alimentação é tarefa exaustiva para muitas pessoas. Dietas, medicamentos, exercícios físicos e vigilância constante do peso estão na lista de cuidados para manter a saúde e a estética. Mas, quando os cuidados falham apesar de seguidos à risca, o problema pode estar ligado ao aumento constante da vontade de comer. É o que aponta um estudo do Baylor College of Medicine em Houston, no Texas, e da Universidade Shiga de Ciência Médica em Otsu, no Japão. De acordo com relatório publicado na revista Nature Communications, algumas células da medula óssea ligadas a proteínas que regulam a ingestão alimentar podem sofrer alterações e estimular o apetite.
Lawrence Chan, líder da pesquisa, explica que as células surgem da medula óssea ainda no desenvolvimento embrionário e são ligadas a uma proteína chamada Brain Derived Neurotrophic Factor (BDNF). Elas são responsáveis por equilibrar o apetite no hipotálamo, região reguladora do cérebro. Lá, alojam-se e fazem com que haja a sensação de saciedade após a ingestão do alimento. “O que não se sabia era que essas proteínas também podem ser encontradas após a formação do feto, na idade adulta. Elas se encontram com algumas células no sangue e voltam para o hipotálamo, onde se amplificam, sofrem alterações e contribuem para o aumento da fome”, diz Chan, professor de biologia celular e molecular.
O endocrinologista Sérgio Venci esclarece que as células produzidas pela medula óssea podem viajar para diversas áreas do organismo. “São produzidas no que chamamos de tutano do osso e circulam pelo sangue em várias partes do corpo. Cada uma tem preferência por um determinado lugar a fim de formar as funções essenciais para a vida humana.” Para saber como ocorre esse processo, os médicos Hiroshi Urabe e Hideto Kojima, que participaram da pesquisa, usaram ratos de laboratório e constaram que as cobaias que nasceram sem a capacidade de produzir células sanguíneas com quantidade significativa de BDNF se tornaram obesas e desenvolveram resistência à insulina, o que afeta a capacidade de metabolizar a glicose.
Já na idade adulta, as cobaias ficaram cerca de 24 horas sem serem alimentadas e os estudiosos marcaram as proteínas com uma substância radioativa florescente. Para a surpresa, encontraram células produtoras de BDNF em uma parte do hipotálamo chamada núcleo paraventricular. “As proteínas de BDNF migraram via corrente sanguínea e, como tiveram contato com outras células no sangue, em vez de regularem a fome, estimularam a vontade de comer”, afirma Chan.
Para controlar os impulsos de fome gerados nos roedores, os pesquisadores injetaram as proteínas BDNF livres de alterações — as encontradas no processo de formação embrionária em uma parte do cérebro chamada terceiro ventrículo. Com a indução das proteínas normais, foi comprovado que os ratos deixaram de sentir a vontade exagerada por comida e emagreceram. “De uma forma geral, o estudo representa um novo mecanismo pelo qual as células derivadas da medula óssea controlam a alimentação por meio de BDNF e poderia fornecer um novo caminho contra obesidade”, acredita Chan. Segundo ele, o estudo é um importante passo para cruzar as barreiras entre o sangue e o cérebro. “Isso pode acelerar o desenvolvimento de novas terapias contra o sobrepeso, bem como síndromes de desregulação do apetite, como anorexia nervosa e bulimia”, acredita.
Outros fatores Coordenador do Serviço de Neurologia dos hospitais Santa Helena e Prontonorte, em Brasília, Claudio Carneiro explica que a descoberta mostra a capacidade das células de se regenerarem e como elas migram dentro do corpo. O especialista também acredita que a descoberta publicada na Nature Communications pode ser um prenúncio de uma nova alternativa para o controle do peso. “Pode ajudar em medicamentos que simulem a substância no organismo”, diz. Mas Carneiro chama a atenção para outros fatores que também estão envolvidos no aumento do apetite. “Além dos genéticos, há os orgânicos, como alterações de tireoide, que podem desencadear a obesidade.”
Professor da Universidade Federal de São Paulo no Departamento de Fisiologia, Ricardo Mario Arida esclarece que, na última década, estudos têm investigado os efeitos das proteínas BDNF e a atividade física. “Pesquisas nessa área têm demonstrado que o exercício físico aumenta os níveis circulantes de BDNF em humanos saudáveis”. Para ele, essa é uma das explicações que levam a considerar como o exercício contribui para a atividade cerebral.
Arida explica ainda que a prática de exercícios estimula as proteínas que, no cérebro, melhoram as conexões e as comunicações entre os neurônios. “As proteínas têm também a função de diferenciação e de sobrevivência das células nervosas. Elas estão relacionadas à plástica cerebral e facilitam a conectividade entre os neurônios, resultando em melhor aprendizado e bom humor. Pessoas com sintomas de depressão e de ansiedade podem ter os efeitos revertidos quando têm em abundância as proteínas BDNF", conclui.
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