quarta-feira, 13 de fevereiro de 2013

Tendências/Debates

folha de são paulo

LUIZ GUILHERME PIVA
TENDÊNCIAS/DEBATES
Educação também como melhoria social
A aprovação quase compulsória de alunos reduz o risco de escapes mais rápidos e nem sempre legais de sobrevivência e ascensão social
Muita gente critica o que seriam leniências do setor público em relação à educação, enfatizando dois pontos. O primeiro é a aprovação ou promoção quase compulsória dos alunos do ensino fundamental. O segundo é a aceitação de abertura de inúmeros cursos superiores.
No primeiro caso, alega-se que tal política não só forma maus alunos, que fracassarão adiante, como também os deseduca socialmente, uma vez que retira dos professores e diretores o poder de puni-los pela reprovação ou retenção.
No segundo caso, a crítica é à enxurrada de maus profissionais no mercado de trabalho, o que prejudica o recrutamento, a produtividade e a competitividade e, em alguns casos, compromete a segurança (engenharias, saúde etc.).
Não nego totalmente esses aspectos. Têm de ser, na medida razoável, considerados e mitigados. Mas é preciso que esses críticos observem os benefícios dessas políticas -que não são triviais e podem, se forem acompanhados de aperfeiçoamentos, sustentar sua continuidade e sua ampliação.
As crianças que estão em escolas públicas são carentes não só de recursos financeiros, como também de condições de habitação, saneamento e alimentação, entre outros. A estrutura social e familiar que as cerca muitas vezes é precária -no sentido de assegurar proteção, afeto, referência moral e autoestima.
Estudar, nesse caso, é um acidente que, tão logo seja possível, será descartado, com apoio de parentes e amigos, em prol de formas mais rápidas (e nem sempre legais) de sobrevivência e ascensão social.
Em resumo, tudo atua para que essas crianças saiam da escola. A escola precisa, então, disputá-las com seu ambiente, para ganhar sua adesão, sua permanência, sua continuidade. A reprovação, certamente, não ajudará nesse desafio.
Para os que treplicarem que é melhor resolver antes a questão social, apresento dois argumentos: a) isso demora; e b) manter mais crianças na escola por mais tempo diminui o problema social a ser resolvido.
Quanto à crítica à proliferação de escolas superiores -à qual eu poderia adicionar pelo menos uma, que é sua utilização como base de sustentação política-, considere-se que elas põem em contato com livros, fotocópias, computadores, professores, colegas, trabalhos, exercícios, discussões, ambientes, dados, informações, formas de convívio, pesquisas e tudo o mais que existe nas comunidades acadêmicas, uma massa de adultos que dificilmente teriam tais experiências.
Alguns deles serão bem-sucedidos, mesmo oriundos de escolas fracas. O mercado os testará sem comiseração. Outros não vingarão em sua área, por seleção do mercado ou porque o curso não lhe interessava como vocação profissional e, sim, como qualificação salarial (que poderão obter).
Talvez sigam em suas profissões de nível médio -mas muito mais qualificados, educados, instruídos. Talvez empreendam -com muito melhor formação. E muitos outros talvez nem concluam seus cursos, ou os concluam de forma muito negligente. Mas todos eles terão lido, assistido a aulas, convivido com universos que, no mínimo, propiciarão parâmetros novos, diferentes do exclusivismo do ócio, da violência e dos vícios.
Também aqui se pode argumentar que a questão social é mais relevante e precedente. Eu respondo com as seguintes questões: pergunte aos familiares e convivas desses adultos se a relação com eles é indiferente à sua condição de estudante; imagine como esses adultos tratarão seus filhos em relação à educação e a comportamentos, interesses e ambições; e imagine essa massa de adultos que afluiu a tais escolas nos últimos anos se sua demanda não tivesse sido atendida.
É uma forma mais complexa de fazer a discussão. Mas vale a pena.


CELSO GIGLIO
TENDÊNCIAS/DEBATES
O aperfeiçoamento e a destruição
A injustiça machuca. Propalar a inutilidade daquele que é o Poder mais democrático pode até ser o esporte da moda, mas não é bom para a democracia
A Assembleia Legislativa sofreu, nos últimos dias, uma série enorme de críticas. Criticar faz parte da democracia -e infeliz de uma sociedade na qual a imprensa só adula as instituições.
Agora, é muito perigoso transitar da crítica salutar e indispensável para a esculhambação que resvala no desrespeito pelo trabalho alheio e até questiona a vontade soberana dos eleitores. Não é culpa da Assembleia, por exemplo, que "a maioria esmagadora dos deputados se alinha com o governo tucano".
Em editorial publicado no dia 22 de janeiro, esta Folha faz uma análise devastadora. É textual: "A participação [da Assembleia Legislativa] na vida política se caracteriza por uma sensaboria próxima da inexistência".
Vale lembrar que a Assembleia é a responsável pela aprovação das leis em São Paulo, tenham elas as origens que tiverem, e do Orçamento do Estado mais rico, moderno e pujante do país, entre outras tarefas.
A instituição que "nada faz" encerrou o ano com mais de 7.500 proposições apresentadas. Foram 765 projetos de lei, 50 projetos de lei complementar, 20 projetos de resolução, cinco propostas de emendas à Constituição, 1.688 indicações, 2.766 requerimentos diversos e 1.785 pareceres, para citar algumas delas.
A Casa "preguiçosa" realizou 182 sessões ordinárias, 62 sessões extraordinárias e 83 sessões solenes. As comissões permanentes realizaram nada menos do que 354 reuniões: ordinárias, extraordinárias, conjuntas, especiais e audiências públicas.
A Comissão de Finanças, Orçamento e Planejamento promoveu 20 audiências públicas nas diversas regiões do Estado para discutir o projeto de Lei das Diretrizes Orçamentárias, o projeto de Lei do Orçamento Anual referentes ao exercício de 2013 e o projeto relativo ao Plano Plurianual. Isso é trabalho sério, consequente, responsável.
É obrigação do Legislativo aprovar boas leis. E isso tem sido feito em São Paulo. A Assembleia Legislativa reconheceu a carreira de delegado de polícia como jurídica. Aprovou a Lei do Fumo, reconhecidamente um grande sucesso. Aprovou também a importantíssima Lei dos Mananciais.
Aprovou propostas que tratam dos salários e carreiras de servidores, criou cargos para professores em universidades, debateu propostas de reorganização da região metropolitana de São Paulo, promoveu cursos de formação política, discutiu a política de cotas etc., etc., etc.
Onde está o mal? Qual é o efeito deletério dessas decisões? Seria inútil tudo isso?
A crítica pode ser o caminho se a busca do aperfeiçoamento -e não a destruição- for a meta. A injustiça machuca. Propalar a inutilidade daquele que é o Poder mais democrático em sua essência e mais visível em suas ações pode até ser o esporte da moda, mas não é bom para a democracia.
Assim como o Executivo e o Judiciário, o Legislativo tem qualidades e defeitos, mas seu papel é dos mais nobres: votar, democraticamente, as leis que procuram tornar a convivência social mais harmônica, o serviço público, mais eficiente e as pessoas, mais felizes.

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