sexta-feira, 22 de março de 2013

Salvaguarda à pós-graduação [tendências/debates]


VAHAN AGOPYAN
Salvaguarda à pós-graduação
A revalidação automática de diplomas estrangeiros pode prejudicar os interessados ou ser injusta com estudantes das instituições nacionais
Está em tramitação no Senado Federal um projeto de lei que propõe a revalidação ou reconhecimento automático dos diplomas de graduação, mestrado ou doutorado expedidos por instituições estrangeiras, cuja excelência tenha sido reconhecida pelo Poder Executivo (PLS nº 399/2011).
A ideia parece, a princípio, oportuna, e o relator salienta que "não há como justificar que diplomas expedidos por instituições estrangeiras de notória excelência sejam submetidos a morosos procedimentos para serem revalidados".
A pós-graduação no país foi regulamentada em 1965 e está bem estabelecida e organizada. Um curso para emitir um diploma, com validade nacional, deve ser reconhecido pela Capes (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior) e ser periodicamente avaliado por essa agência.
As avaliações são realizadas a cada três anos e os cursos que não atendem às exigências mínimas não são autorizados a receber alunos novos. Normalmente, passam por reestruturação e vários cessam suas atividades, independentemente da instituição de ensino a qual estão alocados.
Em resumo, pode-se afirmar que, na pós-graduação, qualquer aluno que se inscreva em um curso reconhecido pela Capes terá formação adequada, o que, infelizmente, não se pode falar dos outros níveis de ensino em nosso país.
A pós-graduação "sensu stricto" é definida como uma formação de natureza acadêmica e de pesquisa, com objetivo essencialmente científico. Por essa razão, mesmo o mestrado é um título resultante de pesquisa, não somente de aprovação de um conjunto de disciplinas.
Cada país tem sua legislação e cada instituição de ensino tem sua cultura e abordagem para a pós-graduação. Enquanto que para o doutorado as abordagens, apesar de serem diferentes, geralmente são convergentes, para o mestrado, as diferenças são marcantes.
Em vários países, mesmo nas instituições de renome, o título de mestre é obtido por meio de aprovação em disciplinas. No entanto, às vezes, tal mestrado tem embasamento em pesquisa científica, pela aptidão do aluno ou peculiaridade do tema, resultando em trabalho de fim de curso similar às nossas dissertações. Dessa forma, o interessado tem o mérito de o seu título ser reconhecido.
Para complicar ainda mais, várias instituições de renome outorgam o título com o mesmo nome, tanto para o obtido por disciplinas como o oriundo de um trabalho de pesquisa científica, exigindo, assim, uma análise para seu reconhecimento no país.
Há outras variações conforme o país e a instituição. Em algumas excelentes instituições, por exemplo, o título de mestre é uma etapa do doutorado, outorgado após a aprovação no exame de qualificação ou após a apresentação de um texto resultante de uma pesquisa científica, esta última perfeitamente válida para nossas exigências.
Se não for realizada análise para cada caso, incorre-se no erro de recusar títulos compatíveis com os brasileiros, prejudicando os jovens que estudaram no exterior, ou de aceitar títulos que não têm as exigências dos nossos, sendo injustos com aqueles que estudam no Brasil.
A USP (Universidade de São Paulo), que outorga 6.000 títulos de pós-graduação anualmente, analisou 242 títulos obtidos no exterior em 2012, dos quais 76% foram revalidados. As recusas foram, principalmente, para os de mestre.
Deve-se salientar que, para fins de carreira acadêmica ou de progressão nos estudos, o instrumento de equivalência tem validade apenas interna à universidade que analisa, mas que é um processo bem expedito.
Para títulos obtidos no exterior em instituições de renome, as eventuais demoras na análise ocorrem pela dificuldade de se caracterizar o embasamento científico do título avaliado. A boa intenção do PLS pode prejudicar os próprios interessados ou ser injusta para os estudantes das instituições nacionais.
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OSCAR DE MORAES CORDEIRO NETTO
A triste notoriedade das águas
Hoje, a Agência Nacional de Águas tem visibilidade pelos pretensos malfeitos de um de seus dirigentes e não por sua importante missão
A Operação Porto Seguro levou à denúncia, como chefe de quadrilha, de um diretor da até então desconhecida Agência Nacional de Águas (ANA). Trata-se de uma agência federal que, por não exercer um papel regulador direto em relação aos consumidores de água, acaba não tendo visibilidade para a população.
Hoje, a ANA tem notoriedade, pena que tenha sido pelos pretensos malfeitos de um de seus dirigentes e não por sua importante missão.
Falemos de água, esse recurso essencial à vida e ao desenvolvimento cujo dia é comemorado mundialmente hoje. O Brasil é o país mais rico em água da Terra. Em média, 18% da água doce renovável do planeta circula por território brasileiro anualmente. É a água que molda nossos ecossistemas, que abastece a cidade e o campo, que produz energia e alimento.
Mas é um recurso caprichoso: nem sempre está disponível quando e onde se deseja. É um recurso frágil, sujeito a contaminação e poluição. E é um recurso difícil de ser gerenciado: são por vezes antagônicos os interesses e as visões em relação à água.
Desde a promulgação da Constituição de 1988, o Brasil vem construindo um sistema de gestão das águas, envolvendo poder público, setores produtivos e sociedade, atuando no nível nacional, nos Estados e nos espaços das bacias e regiões hidrográficas. Muito se fez nesses últimos 25 anos. Há hoje mais de 160 comitês de bacia instalados no país, colaborando na adoção de práticas de uso e proteção da água.
A ANA é parte desse sistema. É, de um lado, a agência reguladora, que zela para que haja um uso sustentável das águas de nossos rios. É, por outro lado, provedora de meios técnicos, como os dados hidrometeorológicos, necessários a um adequado gerenciamento.
O modelo de gestão do Brasil já é uma referência em todo o mundo. Já foram até criadas outras ANAs na América Latina, inspiradas em nossa experiência.
O cidadão brasileiro pode não saber, mas há muitas decisões tomadas pela ANA que são de seu maior interesse, como a regra de repartição de água do Sistema Cantareira em São Paulo, a forma como se dará a transposição de águas do São Francisco, a definição da operação das grandes barragens e o monitoramento das secas e das inundações.
Para desempenhar essa missão, a ANA conta com uma equipe de servidores concursados e é dirigida por uma diretoria colegiada, com diretores indicados pelo presidente e aprovados pelo Congresso.
Muitas das decisões da ANA são complexas, tratam de interesses os mais variados da sociedade e se revestem de caráter estratégico. Espera-se que o brasileiro que assuma uma diretoria tenha os atributos demandados para exercício do cargo.
Não parecia ser o perfil do diretor denunciado. E não foi por falta de avisos: houve diversas manifestações contrárias à sua indicação e até uma recusa, em uma primeira votação no Senado. Mas, eram obstinados candidato e padrinho político e se aprovou o nome do diretor no Congresso. Deu no que deu.
Oxalá quando a ANA voltar a ter toda essa notoriedade na mídia que seja por alguma questão relevante para as águas do Brasil!
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