Como se fabricam Azevêdos
O modo de formação usado pelo Itamaraty deveria ser o modelo para todo o serviço público
Azevêdo não é um produto típico do Brasil oficial, mas de uma ilha de excelência no mundo do serviço público brasileiro, o Ministério das Relações Exteriores, mais conhecido como Itamaraty.
Sua vitória, em vez de ser festejada como uma exaltação ao Brasil, deveria servir para que uma presidente preocupada com a boa gestão tratasse de ampliar para o conjunto do serviço público brasileiro o modo Itamaraty de ser.
Breve resumo de como um Azevêdo chega até onde chegou o Roberto: começa com a admissão por meio de um rigoroso vestibular, em vez de entrar pela porta da indicação de um amigo, parente ou correligionário político bem colocado.
Normalmente, só 30 de uma batelada de candidatos passam por essa barreira inicial. Os aprovados ficam, então, um ano estudando no Instituto Rio Branco.
Ao final desse ano, passam a ser estagiários ou no próprio Itamaraty ou em embaixadas na América do Sul.
Só após um ano e meio desse percurso um Azevêdo pode ser lotado ou no Brasil ou no exterior.
Progredir na carreira não depende de padrinhos. É claro que, como em qualquer corporação, sempre há "panelinhas" que facilitam (ou dificultam) a vida dos Azevêdos.
Mas a meritocracia é um componente essencial, tanto que, de oito a dez anos após o início da carreira, o diplomata enfrenta um segundo filtro, o Curso de Aperfeiçoamento de Diplomatas.
Fiel à doutrina de que a formação é um processo contínuo e interminável, o Azevêdo de turno é submetido a um mês de provas e trabalhos, o que o habilita a passar de primeiro-secretário a conselheiro.
Ou seja, não se trata de passar no vestibular, iniciar a carreira e pendurar o paletó na cadeira à espera de o tempo passar.
Vencido o segundo obstáculo, vem o mais relevante, o chamado CAE (Curso de Altos Estudos). O diplomata tem que preparar, sem orientador, ao contrário do que é usual em teses de mestrado ou doutorado, um trabalho de entre 160 e 200 páginas.
O Azevêdo de verdade apresentou o seu em 2001, sobre "subsídios à exportação, o caso Embraer-Bombardier", na época rumorosa batalha entre Brasil e Canadá sobre quem subsidiava quem na fabricação de aviões.
A tese é defendida ante um banca composta por seis embaixadores, um relator diplomático e um relator acadêmico (de fora do Itamaraty). Uma banca que procura puxar cada Azevêdo ao limite, para testar não só seus conhecimentos, mas seu poder de iniciativa.
A partir daí, rumo ao posto máximo, o de embaixador, que, como demonstrou o novo diretor-geral da Organização Mundial do Comércio, está longe de ser o mero "fru-fru" diplomático de coquetéis e recepções a que ainda está vinculada a imagem da diplomacia.
É essa formação que explica a vitória de Azevêdo, além, claro, de seu talento pessoal, formidável. Se o serviço público brasileiro em seu conjunto trabalhasse com esse modelo, o país seria outro.
crossi@uol.com.br
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