quinta-feira, 2 de maio de 2013

Mostra de Glauco e livro de Angeli condensam arte da charge política

folha de são paulo

Exposição na Caixa Cultural apresenta esboços e trabalhos do artista morto há três anos
"O Lixo da História" reúne num só volume as principais charges do cartunista da Folha no pós-11 de Setembro
SILAS MARTÍDE SÃO PAULOUma exposição das charges do cartunista Glauco Vilas Boas, assassinado há três anos, e um novo livro de charges de Angeli destacam agora a tarefa de retratar com humor os aspectos às vezes surreais e ridículos da política.
Na mostra que será aberta neste sábado na Caixa Cultural estão esboços e charges de Glauco publicadas na Folha desde a redemocratização do país, passando pelos governos Sarney, Collor, Itamar, FHC e Lula até o ano de 2010.
Haverá ainda objetos pessoais de Glauco, como cadernos com letras que ele fez para cerimônias do Santo Daime e troféus ganhos em salões de humor, entre outros.
"Ele não tinha preferência por nenhum presidente, mas dizia que o chargista tinha de ser do contra", lembra Bia Galvão, viúva de Glauco. "Era de uma simplicidade genial. Ele era crítico, mas queria sempre que dessem risada."
Alvo constante de sua obra, os presidentes do país surgem às vezes frágeis, mas muito humanos, nas charges do cartunista, como o desenho em que ele associa rugas de FHC a crises no governo.
"Ele era conhecido e reconhecido de cabo a rabo por Brasília", diz Nelma Santos, amiga de Glauco que organiza a mostra com Bia Galvão.
Nelma também aponta a evolução do traço do artista, que fica evidente na mostra. Com o passar do tempo, Glauco quase abre mão do texto e sintetiza as situações.
"Eram só duas palavrinhas, mas muito eficientes", observa Angeli. "As charges dele eram simples e fantásticas, fizeram uma leitura muito própria da época."
Angeli lembra a charge em que Glauco retratou o novo corte de cabelo de Fernando Collor, perguntando se o presidente havia mudado o cabelo ou se era seu nariz que havia crescido. "Era uma piada banal", diz Angeli. "Mas que funcionou muito bem."
"Ele sempre me chamava para ver enquanto estava desenhando", conta a viúva de Glauco. "Se eu achasse engraçado, ele sabia que tinha acertado, que todo mundo entenderia. É um humor sutil, mas que pega na veia. Às vezes, ele varava a noite desenhando, mas não era nenhuma tortura. Ele fazia isso com muita leveza e doçura."

    "Tento fazer a caricatura mais cruel da política"
    DE SÃO PAULOEm entrevista à Folha, Angeli comenta os desafios de um chargista.
    (SM)
    -
    Folha - Na sua opinião, como deve ser um chargista?
    Angeli - Ele tem de estar atento a tudo, saber o momento certo de uma piada bem colocada. Eu misturo a indignação com o desprezo por aquele político.
    Em seu livro, muitas charges são sobre George W. Bush. Por que essa fixação?
    Tentei fazer o retrato mais contundente dele por raiva mesmo de ver esse sujeito distanciado de seu tempo criando fatos mentirosos. Tinha prazer em desenhar as rugas e as entranhas do Bush.
    Eu faço charges para ajudar que esse tipo de político não exista mais. Sei que isso é meio quixotesco, mas políticos têm esse dom de serem medíocres.
    O que está por trás de uma boa charge?
    Tento fazer a caricatura mais cruel da política. Não sou econômico no desenho. É gostoso acertar o tiro, mas o que a gente quer é estancar o sangue.

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