O PAPA NO BRASIL
Visita de Francisco alimenta expectativa com ação social mais forte da igreja
Opção pelos pobres vira tema dominante em discursos do papa, que visitará áreas carentes do Rio nesta semana
A visita do papa Francisco ao Brasil poderá contribuir para renovar o fôlego das alas mais progressistas da Igreja Católica no país, que viram sua influência diminuir com o avanço dos grupos católicos carismáticos e dos evangélicos nos últimos tempos.
Desde que foi escolhido como papa em março e adotou seu nome como homenagem a são Francisco de Assis, o argentino Jorge Mario Bergoglio tem dado ênfase à pobreza e à desigualdade social em seus discursos e suas ações.
O pontífice disse que buscaria uma "igreja pobre e para os pobres", lavou os pés de menores infratores na semana da Páscoa e criticou o uso de carros de luxo por padres.
Sua programação na próxima semana inclui visitas a um hospital e uma favela do Rio de Janeiro e um encontro com jovens detentos. O papa chega ao Brasil nesta segunda para participar da Jornada Mundial da Juventude.
Para muitos religiosos, gestos como os que Francisco tem feito podem ajudar a fortalecer correntes que questionam a desigualdade e defendem o uso da igreja como uma espécie de alavanca para promover transformações sociais.
"Francisco quer reforçar que a igreja vá às ruas e esteja próxima dos mais simples", diz o padre e teólogo João Batista Libanio, jesuíta como Francisco. "Os setores mais críticos, com padres com trabalho pastoral junto às camadas populares, vão se sentir mais prestigiados."
Primo de Frei Betto, Libanio é adepto da Teologia da Libertação, corrente bastante difundida no Brasil na ditadura militar e que defende um catolicismo próximo aos pobres e alinhado a movimentos sociais de esquerda.
Combatida pelos dois últimos papas, João Paulo 2º e Bento 16, essa teologia perdeu espaço ao mesmo tempo em que movimentos mais voltados à espiritualidade e considerados mais conservadores, como a Renovação Carismática, cresceram na igreja.
Com o apelo do papa Francisco para que os católicos se voltem para os pobres, há a expectativa de que algumas bandeiras da Teologia da Libertação sejam recuperadas, mas não mais com o viés ideológico das décadas passadas, ao qual, inclusive, o papa se opõe com clareza.
Em abril, a CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil) deu um sinal nessa direção ao propor o fortalecimento das comunidades eclesiais de base (CEBs), grupos que no passado cresceram muito influenciados pela Teologia da Libertação.
Para a CNBB, as comunidades de base poderiam ajudar a igreja a recuperar o espaço perdido para os evangélicos na periferia das grandes cidades nos últimos anos.
Invocando Bento 16, o cardeal dom Raymundo Damasceno, arcebispo de Aparecida (SP), afirma que a ênfase do papa Francisco nos pobres deve ser entendida mais como uma orientação espiritual do que como um posicionamento de natureza política.
"Ele é motivado, inspirado pelo evangelho nas atitudes", diz. "Não é nenhuma motivação política, ideológica."
O conceito é compartilhado por dom Angélico Bernardino, bispo emérito de Blumenau (SC) e militante da Teologia da Libertação. "A opção evangélica pelos pobres é de Jesus. Não há nada de novo nos gestos do papa."
Nada disso significa que a igreja pretende relegar a segundo plano os carismáticos, atualmente os principais responsáveis por atrair os jovens para a igreja e trazer de volta os católicos não praticantes.
Em 2007, quando Bento 16 visitou o Brasil, o mais famoso dos padres cantores, Marcelo Rossi, foi impedido de se apresentar para o papa. No próximo domingo, ele e o padre Fábio de Melo estarão ao lado de Francisco no palco armado em Guaratiba (RJ).
"O papa vai dar espaço para todos, na simplicidade, na humildade e no espírito alegre", afirma dom Fernando Figueiredo, bispo da diocese de Santo Amaro, na capital, e superior do padre Marcelo.
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