MINHA HISTÓRIA - THERESA FLORES, 48
Banho de dignidade
DEPOIMENTO A...
JOANA CUNHA
DE NOVA YORK
JOANA CUNHA
DE NOVA YORK
Theresa Flores, 48, tinha pouco mais de 15 anos quando foi capturada por traficantes sexuais nos Estados Unidos. Ela foi enganada, chantageada e forçada à prostituição. Atualmente, lidera uma instituição que fundou para combater o problema. Com a ajuda de voluntários, distribui em motéis sabonetes com um número de telefone para denúncias na embalagem. Em 2014, quer trazer a experiência para o Brasil.
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Eu fui uma adolescente de família de classe média alta em Detroit, uma família normal. Era ingênua, como toda menina, e acabei me apaixonando por um garoto um pouco mais velho que frequentava a minha escola.
Por mais de seis meses, ele foi simpático comigo, sempre dizendo que eu estava bonita. Qualquer garota gosta desse tipo de atenção.
E assim ele foi me conquistando, até o dia em que se ofereceu para me levar em casa. No meio do caminho, porém, mudou a rota e foi para a casa dele. Disse que gostava de mim, me convenceu a entrar e me deu uma bebida, que devia conter alguma droga.
Então eu fui estuprada. Foi o início de dois anos em que me tornei uma escrava sexual. Ele não estava sozinho e fotografava a cena.
Dias depois, ele me contou o que tinha acontecido e me mostrou as fotos, dizendo que as levaria para o meu pai, para o chefe do meu pai e que as espalharia pela escola se eu não os obedecesse.
A partir daí, começou a ir me buscar algumas vezes por semana, depois que meus pais iam dormir. Eu tinha de sair escondida e era levada a porões da região, onde ficava até as 4h da manhã sendo estuprada por cerca de dez homens por noite.
Arquivo Pessoal | ||
Theresa Flores |
Às vezes era um por vez, outras vezes apareciam juntos e usavam objetos.
Ele era um menino atuando como recrutador para pessoas mais velhas, que fizeram muito dinheiro com isso.
Depois me deixava em casa e eu tinha de acordar cedo para ir à escola. Sem entender por que eu me deprimi, meus pais me mandaram para a terapia, mas eu não consegui contar nada.
Além das chantagens, eles me batiam, me drogavam, diziam que matariam minha família, mataram meu cachorro com um tiro e deixavam pássaros mortos na minha caixa de correio.
Não me sequestrar e permitir que eu continuasse vivendo com os meus pais foi um meio de me manter sob controle.
Na pior noite, depois de me leiloarem para mais de 20 homens e me largarem em um motel imundo, eu consegui sair andando pela rua. Foi quando uma garçonete de um restaurante próximo me percebeu, ofereceu ajuda e chamou a polícia.
Hoje eu tenho um projeto chamado SOAP (Save Our Adolescents from Prostitution [a sigla, que significa sabonete em inglês, é um apelo ao combate à prostituição de crianças e adolescentes]).
O nome do projeto faz referência à única coisa que me dava algum conforto depois de horas de estupro: uma barra de sabão com que eu pudesse me lavar.
Levamos voluntários aos pequenos hotéis e motéis onde essa exploração pode acontecer e fornecemos milhares de sabonetes com um número de telefone para denúncias nas embalagens, na esperança de que uma dessas meninas tenha acesso.
Também divulgamos fotos de crianças desaparecidas e treinamos funcionários dos estabelecimentos para que identifiquem comportamento suspeito entre os hóspedes.
No ano que vem, levarei esse trabalho ao Brasil, na Copa do Mundo. Segundo o FBI [polícia federal americana], que realizou uma grande operação contra a prostituição infantil nesta semana, um dos principais ambientes para esse tipo de crime são os grandes eventos esportivos, que atraem um volume maior de turistas homens.
Durante o Super Bowl [final do torneio de futebol americano], o esforço de 300 voluntários costuma resgatar até oito meninas. Para a Copa, estimamos 14.
Minha recuperação foi difícil até eu descobrir que a minha história não é única. Quando comecei a estudar sobre tráfico humano, aprendi que esse é um dos crimes mais recorrentes nos Estados Unidos e que precisa ser combatido.
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