GLEISI HOFFMANN
TENDÊNCIAS/DEBATES
O Estado de Direito é de todos
Se for certo o direito, por que temer a ajuda de quem pode comprová-lo? Não se pode falhar no cumprimento dos direitos assegurados aos índios
A afirmação feita pela ex-ministra Marina Silva em artigo nesta Folha ("O espantalho", Opinião, 16/8) de que "a ministra da Casa Civil anuncia a suspensão de demarcações e diz que não há índios onde até as pedras sabem que há" está distorcida e ela sabe disso.Espero que a questão indígena não seja usada para um debate sem foco em resultados práticos.
Solicitei a suspensão dos estudos e das demarcações pelos conflitos instaurados e pela necessidade de ouvir todos os envolvidos, inclusive órgãos públicos que conhecem a realidade e podem atestar situações fáticas e históricas.
Se for certo o direito, por que temer as manifestações de outros que podem, inclusive, ajudar a elucidá-lo e comprová-lo?
O Estado não pode e não deve falhar no cumprimento do que a Constituição assegura aos índios.
Temos buscado soluções para os impasses das demarcações e trabalhamos em várias frentes para tornar efetivo o compromisso do governo com a melhoria das condições de vida dos 896.197 índios de 305 etnias que, segundo o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), residem no país.
Hoje, as terras indígenas ocupam cerca de 120 milhões de hectares, o equivalente a 13% do território do Brasil. Nos últimos dez anos, o governo demarcou 91 áreas indígenas.
Em função do avanço expressivo das demarcações, a maior parte dos processos nas áreas encontra-se em litígio judicial. São terras que os índios reclamam, mas que estão ocupadas por outros, principalmente agricultores, em boa medida, pequenos e de boa-fé.
Quando se configura litígio judicial, a decisão não depende do Executivo, mas da Justiça. E a responsabilidade sobre o destino dessas áreas não é do governo, é do Estado brasileiro.
Muitos processos se arrastam há anos, causando dificuldades a todos os envolvidos e, especialmente, aos índios.
Para evitar situações como essas é que o governo federal quer tornar mais transparentes os processos de demarcações.
A Funai (Fundação Nacional do Índio) continua tendo seu papel e responsabilidade, mas outros órgãos deverão ser ouvidos no processo, buscando saídas para situações complexas, evitando conflitos e antecipando negociações e reconhecimento de direitos.
A verdade é que as demarcações nas regiões antropizadas tornaram-se mais complexas, com registros de confrontos, tensões e atos de violência. Precisamos agir com moderação. A violência, seja qual for a maneira como ela se manifesta, é sempre uma derrota.
Somos todos brasileiros: brancos, negros, índios, descendentes de europeus e de orientais. E o Estado de Direito existe para todos. Para os índios e os não índios.
Nessa circunstância, agir com equilíbrio e serenidade para aumentar o ritmo das demarcações é a forma de garantir com respeito e seriedade os direitos previstos na Constituição Federal.
ODED GRAJEW
TENDÊNCIAS/DEBATES
Como baratear rapidamente a tarifa
Por gerar benefícios sociais, econômicos e ambientais, a municipalização da Cide para financiar o transporte público é a medida da vez
O aumento no valor da tarifa prejudica a competitividade do próprio sistema de transporte coletivo.Num círculo vicioso, o rápido aumento da frota de automóveis particulares provoca: a redução dos passageiros do transporte público, o aumento do custo devido aos congestionamentos e o consequente crescimento do valor das passagens.
Nas manifestações recentes ocorridas em todo o país, uma das principais cobranças dos cidadãos e das organizações da sociedade tem como foco o transporte público.
As reivindicações por melhora na qualidade dos serviços e redução do preço da passagem para os usuários motivaram os primeiros atos.
Entretanto, o desafio que se coloca com urgência é o de encontrar novas fontes de financiamento para o setor. Hoje, os usuários diretos dos serviços são os principais atingidos pelo alto custo da tarifa.
Nos últimos anos, a adoção de políticas e investimentos que priorizam o transporte privado em detrimento do transporte público gerou um sistemático encarecimento das tarifas.
Segundo um estudo do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), as famílias brasileiras 10% mais pobres já gastam 10,7% da renda com transporte público. Já as 10% mais ricas aplicam apenas 0,5% para esse fim.
O mesmo trabalho registrou que, entre os brasileiros com menor renda, cerca de 30% não usam o transporte coletivo por falta de dinheiro para pagar a passagem.
O transporte individual motorizado é o principal gerador de acidentes nas cidades.
O uso desmedido do carro gera maior poluição atmosférica dos gases do efeito estufa --o que, além de danos ambientais, afeta diretamente a saúde da população.
Segundo pesquisa da Rede Nossa São Paulo encomendada ao Ibope, o paulistano perde, em média, 2h30 todos os dias nos congestionamentos. Isso gera perdas econômicas da ordem de R$ 50 bilhões anuais, segundo cálculos da Fundação Getulio Vargas (FGV).
A piora nas condições de mobilidade contribui para o quadro de insatisfação com o trânsito. O transporte público coletivo beneficia não apenas os seus usuários diretos, mas toda a população e o ambiente.
A Frente Nacional dos Prefeitos (FNP) apresentou recentemente a proposta de municipalização da Cide (Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico), um imposto sobre a gasolina.
A ideia é que a arrecadação desse tributo seja feita em cada município e integralmente investida para baratear a passagem de ônibus em todas as cidades brasileiras. A aplicação dos recursos seria fiscalizada pela sociedade.
Estudos da FGV mostram que um imposto de 50 centavos sobre cada litro da gasolina baratearia a passagem em R$ 1,20, o que, em São Paulo, passaria de R$ 3 para R$ 1,80.
Outros estudos demonstram que essa medida seria deflacionária, já que o preço da passagem de ônibus tem um peso maior do que a gasolina no calculo da inflação.
Além disso, seria importante instrumento de promoção da justiça social, já que beneficia diretamente a renda das pessoas que ganham até 12 salários mínimos, ou seja, 78% dos brasileiros.
Pelo acima exposto, por gerar enormes benefícios econômicos, sociais e ambientais à população brasileira, a Rede Nossa São Paulo lança nos próximos dias um abaixo-assinado on-line para receber adesões de organizações e cidadãos em apoio à municipalização da Cide para financiar o transporte público.
Baixar o preço das passagens de ônibus em todo o Brasil está nas mãos da presidente e do Congresso Nacional. É só querer!
Nenhum comentário:
Postar um comentário