Russas
Legislação russa esvazia argumento brasileiro de que Brics seriam renovação nas relações internacionais
O tema afeta o Brasil, onde está em pauta um projeto de lei que pretende fazer o oposto, criminalizando a homofobia.
O embate pela futura legislação brasileira não é trivial. Em 2012, notificaram-se 10 mil casos de homofobia no país, um terço dos quais envolveu lesão corporal, maus-tratos ou tentativa de homicídio.
Como essa questão divide a sociedade, as políticas públicas são contraditórias. Enquanto o STF e os seguros de saúde reconhecem a união civil entre pessoas do mesmo sexo, os ministros da Educação e da Saúde suspendem campanhas de conscientização.
Com uma mão, o Planalto recebe as demandas dos movimentos sociais; com a outra, pactua no Parlamento com quem faz da homofobia uma bandeira.
Ciente de que esse é um campo minado, a política externa brasileira tem inserido a orientação sexual e a identidade de gênero nos foros multilaterais.
Nesse quesito, o talho do Itamaraty é progressista. Nos últimos meses, houve vitórias significativas na ONU e na OEA.
Mas a batalha é árdua. Países do norte queixam-se de que Brasília não reforma as suas próprias leis, além de ser leniente com africanos e também com asiáticos.
Países árabes, por sua vez, resistem às pressões brasileiras e já chegaram a condicionar a realização de cúpulas com a América do Sul à retirada, nas Nações Unidas, de propostas do Brasil.
Por isso, as notícias vindas da Rússia não ajudam. Ao acirrar a divisão entre os países, elas dificultam o trabalho da diplomacia brasileira, cujo êxito depende da possibilidade de estabelecer pontes entre gregos e troianos.
Para piorar as coisas, a legislação russa esvazia ainda mais o argumento brasileiro segundo o qual os Brics seriam uma força renovadora nas relações internacionais.
O que fazer?
Algumas vozes no estrangeiro sugerem um boicote à Olimpíada de Inverno de fevereiro próximo, que será sediada pela Rússia.
Fazê-lo, contudo, seria contraproducente. O governo russo empunharia a bandeira nacionalista, ganhando boa dose de apoio popular.
Melhor é o Brasil participar com sua mensagem contundente.
Afinal, a homofobia brasileira tem raízes profundas. Na televisão, bicha é malvada ou espalhafatosa. No Congresso, Feliciano preside. No futebol, torcedor promete "fazer a vida impossível" do jogador que lascou um selinho em outro homem.
E, no entanto, o Brasil não é a Rússia. Pode ser conservador, mas não criminalizará gente que ama gente do mesmo sexo. Porque a tese, aqui, não sobrevive nas tribunas, nos tribunais ou nas urnas.
"Não aceitamos que o homossexualismo seja tratado como doença. E muito menos como assunto de polícia", disse Lula na convenção petista de 1981.
Imagine se Dilma quebrasse o silêncio que tem mantido sobre a homofobia repetindo essas palavras no inverno russo que se aproxima.
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